Cidades

Novo visual no Plano

Prédios das superquadras estão cada vez mais diferentes da época em que foram construídos: fachadas ganharam cores mais vibrantes e uma nova textura. Tombamento da cidade permite as mudanças

postado em 27/04/2009 08:13
A menos de um ano do cinquentário, Brasília combina construções originais deixadas pelos candangos com novidades propostas pelos atuais habitantes. Prédios do Plano Piloto construídos nas décadas de 1960 e 1970 conservam a estrutura, mas aos poucos ganham cores e formas novas na fachada e no pilotis. O tombamento da capital dá liberdade aos moradores das asas Sul e Norte para modificarem o espaço onde vivem. Com as mudanças nas cores, texturas e materiais dos prédios, o visual original de alguns deles ficou na memória e começaram a aparecer inovações nos blocos. O tombamento de Brasília não impede mudanças na fachada ou no pilotis, desde que elas não interfiram na volumetria do prédio. Ou seja, não é permitido mexer nas proporções do bloco com o acréscimo de andares ou varandas não previstos no projeto. O tombamento da capital federal não é como o de Ouro Preto (MG), ou de algumas áreas de Recife (PE), por exemplo, onde nada pode ser alterado. ;Brasília é uma cidade moderna, Lucio Costa sempre foi claro a respeito disso. Ele não queria que mudassem as proporções e a área verde tem que permanecer exatamente com o tamanho que tem. Fora isso, ele não quis engessar ninguém;, explicou o superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Alfredo Gastal. O consenso pela reforma do Bloco F da 216 Sul veio com a queda de pedaços dos tijolos aparentes que revestiam a fachada do edifício. Concluído em 1977, o prédio começava a dar problema para os moradores. Depois de reuniões, os condôminos decidiram trocar o piso, as portarias, guarita e toda a fachada do bloco. Eles entraram em acordo pela predominância dos tons de verde no revestimento. Apenas as pilastras de mármore branco foram mantidas, mas ganharam placas de granito preto. ;Fizemos o desenho para dar uma identidade. O resto é tudo novo: rampas, corrimão, elevadores;, detalhou o síndico, Dionísio Neto, 60 anos. Varandas Pisos, pilares e fachadas podem ser alterados sem comprometer o prédio, na avaliação da arquiteta Sandra Ribeiro. ;O que fere o tombamento é colocar cerca, não preservar o pilotis livre para acesso. Ele não impede que você tenha uma boa reforma, modernize o edifício, sem descaracterizá-lo;, opinou. Segundo ela, manter a porcentagem de espaço vazio no pilotis e impedir acréscimos na volumetria, como instalação de varandas, são cuidados necessários para a reforma. A frente do Bloco F da 214 Sul chama a atenção pela combinação de cores pouco comum nas quadras brasilienses: azul, vermelho e amarelo. O edifício foi revestido de cinza na década de 1960, época da construção, e depois disso passou por duas reformas que lhe deram novas cores. Problemas de infiltração e envelhecimento das esquadrias levaram os moradores do prédio a optar pela reforma completa da fachada. As janelas de ferro faziam muito barulho e a água da chuva começava a entrar nos apartamentos. ;Para manter um padrão, preferimos trocar tudo junto. Dá trabalho, mas no final todos iam ficar satisfeitos;, explicou o síndico, Reinaldo dos Santos Mello, 55 anos. Com a troca das esquadrias, o fundo do prédio recebeu cerâmica em amarelo claro. Na frente do edifício, as pastilhas cinzas foram trocadas por cerâmica em azul, vermelho e amarelo, ostentando um colorido que destaca a fachada entre todas as outras da quadra. O Bloco K da 311 Sul está na fase final da reforma do pilotis. O tradicional piso preto, que há pouco tempo ainda podia ser visto em vários edifícios da cidade, ganhou cores claras. O condomínio trocou a fachada em vermelho e concreto por pastilhas azuis e beges. O prédio tem mais de 30 anos e sofria com infiltrações e queda de partes do revestimento da fachada. As obras nos edifícios devem ser acompanhadas por um arquiteto ou um engenheiro e registradas no Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do DF (Crea-DF) (veja quadro). ;Com esse registro, o profissional é tecnicamente responsável por problemas que venham a surgir com o serviço e as questões podem ser discutidas;, explicou o arquiteto e conselheiro do Crea-DF Osvaldo Pontalti. Preservado Mudar a cara do prédio não está nos planos dos moradores do Bloco C da 210 Sul. O edifício chama a atenção pelos azulejos em azul e branco nas portarias e os arcos de mármore claro que formam jardineiras no pilotis. A construção do prédio foi concluída em 1978, mas a manutenção constante não permite que a fachada aparente a idade que tem. ;As pessoas compram apartamentos aqui porque gostaram do que viram. Não pensamos em mudar as características originais;, afirmou o síndico, Wagner Luis Pinto, 63 anos. O ideal de preservação é sustentado pelo estatuto do condomínio, que exige unanimidade em votações relacionadas a mudanças na estrutura do edifício. Manter o visual do prédio exige pintura esporádica das lajotas em relevo, que escurecem com o tempo, além da limpeza dos azulejos. Se alguma peça do revestimento quebra, o condomínio encomenda uma réplica para substituí-la. ;Sem manutenção, o prédio perde as características. Isso tem que ser feito, Brasília precisa manter sua memória;, defendeu Wagner. O economiário Márcio Vantil, 55 anos, vive no Bloco C desde 1984 e não pretende se mudar. ;Sempre gostei do prédio pela preservação que a gente busca. A estrutura dele tem características modernas, como o concreto, que é bem característico de Brasília;, comentou. Segundo ele, esse cuidado se reflete também na valorização dos imóveis do bloco. A preservação do revestimento do prédio pode exigir limpeza, impermeabilização e cuidados com o rejunte, explica a arquiteta Gislaine Garonce. Se ainda assim a opção for pela reforma, é possível manter alguns elementos originais do prédio. ;As pastilhas usadas nos prédios são de porcelana, muito resistentes. É só uma questão de lavar, passar um produto. Você pode mandar polir o mármore, fazer a nova paginação aproveitando ele;, disse. O tombamento específico de prédios residenciais do Plano Piloto, que restringiria reformas na parte externa, pode estar a caminho. O Iphan pretende preservar a unidade vizinhança da 308 Sul, que também compreende as quadras 108, 107 e 307 Sul. Dessa forma, os blocos teriam que manter a formatação original. ;Estamos tentando fazer o tombamento para que fique uma área protegida. Seria a primeira área;, adiantou o superintendente do Iphan. DÚVIDAS Condomínios que se preparam para uma reforma podem consultar o Crea pelo e-mail ouvidoria@creadf.org.br. O que diz a lei A Lei 6.496, de 1977, criou a Anotação de Responsabilidade Técnica, ou ART, na prestação de serviços de engenharia, arquitetura ou agronomia. Ela é obrigatória inclusive nas reformas de prédios supervisionadas por profissionais da área. A ART contém os dados do contrato firmado entre o profissional e o cliente. Com o registro da obra, os condôminos têm mais segurança para cobrar do responsável caso haja algum problema.

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