Cidades

Funcionário do BC que matou mendigos é suspeito de abuso sexual

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postado em 30/04/2009 08:36
Além de colecionar armas, o homem que confessou ter assassinado dois mendigos na Asa Sul também adora andar em trajes militares. Ele ainda gosta de caçar animais e de brigar. Nem esconde o ódio aos homossexuais. Em nome da moral, José Cândido do Amaral Filho, 48 anos, tenta justificar o duplo homicídio. O servidor do Banco Central (BC) diz ter matado os moradores de rua após ter visto dois homens trocando carícias na Praça do Índio (703/704 Sul). Mas não afirma se tratar da dupla executada no dia seguinte com tiros na cabeça. Por outro lado, ele é alvo de uma investigação por suposto estupro ou atentado ao pudor contra uma criança e outra por uso e porte de drogas. As informações sobre tais crimes estão em um diário apreendido na casa de José Filho, na última terça-feira, quando policiais civis foram ao imóvel de dois pavimentos na 704 Sul para cumprir o mandado de busca e apreensão pelo assassinato de Paulo Francisco de Oliveira, 35, e Raulhei Mangabeiro, 26. O analista do BC confessou, à polícia e à imprensa, as mortes de 19 de janeiro. ;Não li todas as páginas do diário. Sei que conta a suposta agressão sexual, ocorrida em 2007. Pode haver outros relatos de crimes, mas não posso antecipar nada, ser leviana. Vamos abrir um inquérito para apurar tudo;, pondera a delegada Martha Vargas, chefe da 1ª Delegacia de Polícia (Asa Sul). No momento, Martha está mais preocupada em manter o acusado atrás das grades. José foi transferido ontem da cela da 1ª DP para a carceragem do Departamento de Polícia Especializada (DPE), no Parque da Cidade. Hoje, a delegada pedirá a prorrogação da prisão temporária de cinco dias, que termina sábado. Ela quer ao menos mais 30 dias de cadeia provisória para o acusado. ;Além de termos que ouvi-lo novamente, ele solto apresenta uma ameaça às testemunhas e a toda sociedade;, argumenta Martha. Além do duplo homicídio, ela justifica os temores com base no material apreendido na casa de José. Junto com o diário, policiais recolheram dois revólveres .38, uma besta (atiradora de flechas), uma espingarda de chumbo, diversas facas para caça e centenas de munições de diferentes calibres. Espingarda Os investigadores descobriram ainda que o acusado fabricava uma espingarda em casa e começou a fazer curso de tiro um mês após a execução dos dois moradores de rua. Ele, que conta ter aprendido a gostar de armas com o falecido pai ; bi-campeão paulista de tiro esportivo ;, tinha aulas com um instrutor na Asa Sul. ;Esse instrutor será intimado;, antecipa Martha Vargas. Ela também quer saber por que, depois do duplo homicídio, José Filho trocou uma pistola .765 do pai por um revólver calibre.38 sem procedência. O servidor do BC não tem porte de arma. Peritos analisarão o arsenal apreendido na casa dele para saber a origem das armas e se foram usadas em outros crimes. José Filho trabalhava havia 10 anos e nove meses como analista da Diretoria de Monitoramento Financeiro e de Segurança da Informação do BC. O banco não divulga o salário dele. Mas, para a função, o ordenado inicial é de R$ 11 mil. Como tem mais tempo de casa, ele ganha mais. Os colegas de trabalho ouvidos ontem pelo Correio descrevem o homem acusado de matar dois mendigos como uma pessoa agressiva. ;Presenciei diversas discussões dele com outros colegas. Inclusive uma agressão durante a última greve dos bancários, ano passado;, comentou um funcionário do BC. Um segurança observou que o homem ia trabalhar frequentemente com roupas camufladas e coturnos, típicos de militares. Vestido dessa maneira, José entrou em área restrita do Parque Nacional de Brasília (PNB), com uma faca de caça em punho e as botas sujas de lama, um mês após as mortes na Praça do Índio. A presença de uma moto Bizz vermelha no estacionamento da reserva ambiental fora do horário da abertura ao público chamou a atenção dos fiscais do Ibama. O funcionário do BC acabou flagrado e multado. Usando uma data diferente, José Filho contou a história à Martha Vargas em 17 de fevereiro, quando prestou depoimento no inquérito que apurava o sumiço da moto NX Falcon alugada por ele. José registrou o roubo do veículo três dias após os assassinatos. Essa atitude chamou a atenção dos investigadores. ;A moto tinha as mesmas características da usada na execução;, explicou a delegada. Quando perguntado onde estava e o que fazia quando os dois homens morreram, o acusado falou que estava no PNB, onde havia chegado caminhando, desde casa ; o trajeto dá mais de 15km. Martha constatou que José realmente esteve lá, só que um mês após o crime e na Bizz de propriedade dele. Discussões e tiros Discussões com a mulher e problemas por excesso de barulho na madrugada ; José costuma montar e desmontar máquinas ; estão entre as queixas dos vizinhos. Certa vez, um deles presenciou José de roupa camuflada, dando tiros com espingarda de pressão no meio da rua da quadra residencial. Vizinhos e colegas de trabalho também falam de atitudes homofóbicas dele. ;Se tivesse uma metralhadora numa parada gay eu fazia a limpa;, disse a um colega do BC, que preferiu não se identificar. Segundo o homem, o acusado pronunciou a frase pouco antes de ser afastado do serviço por razões psiquiátricas, em dezembro de 2008. Segundo um vizinho, ano passado José liderou um abaixo-assinado contra a parada gay de Brasília, que costuma se concentrar próximo à 704 Sul. Desfecho inesperado O que levaria o funcionário de uma das instituições mais respeitadas do país, casado, pai de três filhos e morador de uma das áreas nobres de Brasília a matar dois moradores de rua sem motivo aparente? Ontem, um dia depois do desfecho do crime que chocou a cidade, a pergunta intrigava rodas de conversa nos locais onde José Cândido costumava frequentar. Tanto no Banco Central ; no Setor Bancário Sul ; como na Quadra 704 Sul, onde o servidor morava com a família, o choque com a revelação do atirador da praça onde o índio Galdino foi queimado vivo provocou debates e protestos. Vizinhos de José, que não revelaram os nomes por temer retaliações, não escondiam a perplexidade. ;Ele estava em tratamento. Mas jamais imaginávamos que fosse capaz;, comentou uma mulher. No BC, colegas de trabalho davam como certo que o crime brutal daquele 19 de janeiro era fruto de um acerto de contas por tráfico de drogas. ;Como pode? Não consigo imaginar o que se passava pela cabeça dele;, ressaltou um colega de trabalho. Na casa da família, silêncio. Os filhos dele, de 14, 9 e 3 anos, estão com uma tia. A companheira, abalada, preferiu se manter calada.

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