postado em 11/05/2009 08:32
O professor Euclides Chacon estranhou quando um de seus alunos lhe entregou resolvido um capítulo inteiro do livro de química logo na segunda aula do ano. A surpresa foi maior quando, na aula seguinte, esse mesmo estudante apareceu com todos os problemas do livro solucionados. Semanas de proezas como essas ; entre elas a resolução de um livro inteiro de cálculo universitário em dois meses ; bastaram para que o professor e diretor do colégio Galois, na Asa Sul, percebesse que estava diante do melhor aluno que já teve em 25 anos de profissão.
O tímido Rodrigo Vaz, de 17 anos, é tão inteligente que dá aula a dezenas de colegas sobre matérias que os professores ainda nem ensinaram ; e ainda se dispõe a tirar dúvidas sobre qualquer problema a qualquer hora do dia. Tudo isso sem ao menos poder pagar o colégio em que estuda. O estudante do 3º ano do ensino médio mora em Samambaia, uma das regiões administrativas mais carentes do Distrito Federal, e seus pais, que não têm nem o segundo grau completo, vendem marmitas em obras do Lago Sul para sustentar a família.
Rodrigo estuda no Galois desde 2006, quando ficou em primeiro lugar na disputa por uma bolsa de estudos cobiçada pelos 400 melhores alunos da rede pública de ensino do DF. Três anos depois, a fama do garoto se espalhou pela escola, uma das mais bem conceituadas e caras da cidade. ;Só comecei a dar aula para o Rodrigo neste ano, mas tinha ouvido falar muito dele;, conta o professor de matemática Fausto Fernandes da Silva Camelo.
Segundo Fausto, o aluno é conhecido por ser completo. ;Já conheci estudantes com a sua capacidade de raciocínio, mas nenhum era tão estudioso ou caridoso com os colegas;, elogia o professor. Rodrigo está sempre disponível para ajudar. As aulas que ele dá antes de provas chegam a atrair 100 alunos para o auditório do colégio. O estudante dificilmente cruza um corredor sem ter seu auxílio solicitado. ;É melhor tirar dúvidas com ele. O domínio que o Rodrigo tem das matérias é o mesmo dos professores, mas com ele a gente tem mais intimidade;, conta o colega Wellington Fernandes, 16.
Rodrigo não sabe explicar de onde veio a facilidade para lidar com números, mas seu pai diz que o rapaz surpreende a família desde criança. Pouco antes de completar 2 anos, o menino já decorava bandeiras de países e marcas de carros. ;Durante a Copa de 1994, ele falou o nome de todas as bandeiras que enfeitavam os pirulitos de uma mercearia. O dono da loja ficou tão admirado que lhe entregou todas;, lembra Félix Natan, 47. Aos 2 anos, Rodrigo já aprendia a ler sozinho. ;Ele falava umas coisas no meio da rua e, quando a gente via, era a frase de um anúncio ou o letreiro de uma loja;, recorda o pai.
Tietagem
Para manter a bolsa no Galois, Rodrigo precisa sustentar uma nota superior a 8 em todas as matérias desde 2006, o que não foi exatamente uma dificuldade. ;Cheguei a tirar um 8,3 em geografia, que é uma matéria que envolve interpretação, e mais subjetiva;, explica o jovem, que não demonstra um pingo de vaidade, apesar do sucesso que faz no colégio. ;Sem ele, um monte de gente ia se sair mal nas provas. Frequento todas as aulas do Rodrigo;, tieta a estudante Carolina Limeira, 17. A garota se diz fã do colega, e não é a única.
Para o professor Cláudio Bull, que dá aula de artes visuais, o melhor de Rodrigo é sua ;inteligência emocional;. Ele é responsável e centrado. ;Recentemente, o Rodrigo montou um cineclube. Estamos até preparando os cartazes para divulgar. Ele reúne os alunos para assistir a clássicos, como Metropolis;, surpreende-se o professor. Cinéfilo, o aluno-professor do Galois é fã de Stanley Kubrick (cineasta) e tem uma predileção especial por seu Laranja Mecânica.
No início, a família de Rodrigo imaginou que ele pudesse sofrer algum tipo de preconceito numa escola para alunos bem abastados, mas o receio não se confirmou. Não existe ninguém no colégio capaz de dizer algo contra o rapaz. E além de receber livros de cálculo dos professores para adiantar os estudos da faculdade, o aluno ganhou um computador do colégio. ;Fizemos uma vaquinha, porque o pai dele estava precisando;, lembra o professor Euclides Chacon.
Batalha
Todos os dias, o pai de Rodrigo vai ao Galois levar uma marmita para o filho comer. Desde que perdeu o emprego de gerente em uma loja de móveis, em 2003, Félix vende a comida que a mulher prepara em obras do Lago Sul. ;Dá para manter a casa e dispensar o dinheiro que o Rodrigo tem ganhado;, diz o pai. Apesar de oferecer ajuda a quem precisa, Rodrigo tem conseguido dar aulas particulares a colegas. ;Não pretendo usar meu conhecimento para me aproveitar dos outros. Mas, para quem pode pagar, cobro R$ 30 pela hora/aula;, diz o garoto, que está quase se mantendo sozinho, segundo o pai.
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