postado em 19/05/2009 08:22
A criminalidade voltou a crescer no Entorno do Distrito Federal. Casos graves, como homicídios e assaltos à mão armada, assustam a população dos municípios goianos vizinhos à capital federal pelo menos desde o início do ano. O avanço da violência coincide com o fim da atuação da Força Nacional de Segurança (FNS), que desde 31 de agosto de 2008 deixou de cumprir o policiamento ostensivo em uma das regiões mais perigosas do Brasil. A tropa marcou presença por apenas 10 meses, mesmo depois de o governo federal erguer no local a primeira sede fixa da corporação no país.
A concentração dos ataques de bandidos no primeiro quadrimestre do ano se deu em Luziânia e Valparaíso, as duas cidades do Entorno onde a FNS mais atuou. Luziânia, por exemplo, registrou 28 homicídios, 275 roubos a pedestres e 32 assaltos a residências no período, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública de Goiás. Os números dos dois últimos delitos quase dobraram em relação aos primeiros quatro meses do ano passado (veja quadro). Crescimento parecido de cada crime se revelou em relação a Valparaíso, onde os assassinatos ainda aumentaram de 13 para 19 entre janeiro e abril.
A soma dos dados das 10 principais cidades da região ; Alexânia, Cristalina, Formosa, Luziânia, Planaltina de Goiás, Santo Antônio do Descoberto, Cidade Ocidental, Valparaíso, Novo Gama e Águas Lindas ; também aponta a escalada da violência. A quantidade de pessoas roubadas subiu de 997 para 1.148 na comparação dos primeiros quadrimestres de 2008 e 2009. Os assaltos a casas, de 84 para 87. Os números de homicídios tiveram pouca alteração. Diminuíram de 140 para 145 de janeiro a abril de 2009 e do ano passado.
Nem a polícia escapa dos bandidos. Um militar da FSN sofreu duas invasões em casa, no Jardim Ingá, um dos bairros mais violentos de Luziânia. O homem, que preferiu não se identificar, chegou à região há dois anos para reforçar o combate à criminalidade. Hoje, o policial questiona a decisão de manter a mulher e os dois filhos pequenos no local. Há três meses, quando viajava para uma missão em Belém (PA), bandidos invadiram duas vezes a casa. ;Minha mulher ficou assustada e acabamos nos mudando para um apartamento. A situação está crítica;, avaliou.
Entre a população, o medo predomina. Histórias de terror são contadas em cada esquina. Desesperados, moradores negociam imóveis. A faixa amarrada no portão de uma casa do bairro Parque Esplanada III, em Valparaíso, anuncia a venda. O motivo: medo. A dona de casa Suelen Rodrigues, 42 anos, encontrou a residência vazia, há cerca de um mês, logo depois de chegar do trabalho. Três homens levaram a mobília e aparelhos eletrônicos, por volta das 11h. ;Tive que sair do emprego para não deixar a casa sozinha. Temo pela vida dos meus filhos;, afirmou a ex-secretária.
Os dois casos ocorreram após o fim do convênio que retirou as tropas da FNS do Entorno. Entre os moradores e os próprios militares, a constatação de que a violência voltou a assolar a região é unânime. ;Antes, era um inferno. Com a chegada do reforço, vivemos tempos de paz. Agora, voltamos ao terror;, disse Norberto Silva, 28, dono de uma padaria assaltada três vezes na Cidade Ocidental, só neste ano.
Efetivo é pequeno
As primeiras ações da Força Nacional de Segurança (FNS) no Entorno contaram com 130 homens. Após seis meses, o governo de Goiás pediu que o convênio firmado com o Ministério da Justiça fosse renovado por mais três. Em 31 de maio de 2008, porém, o governo federal não recebeu mais nenhum pedido para ampliar o prazo de permanência da tropa. A essa altura, a Secretaria Nacional de Segurança Pública tinha escolhido Luziânia como a primeira sede da tropa no país. Hoje, o Batalhão Especial do Pronto Emprego (Bepe) só atua se for requisitado. Os carros rodam para transporte de equipamentos.
O comando da Polícia Militar na região vizinha ao DF admite a falta de efetivo para garantir a segurança da população. A 5ª Companhia Regional da PM representa 12 unidades da corporação nas cidades do Entorno Sul: Águas Lindas, Padre Bernardo, Alexânia, Novo Gama, Santo Antônio do Descoberto, Valparaíso, Luziânia, Cidade Ocidental e Cristalina.
Esforço
;Nesses locais, posso falar que estamos nos esforçando ao máximo, mas não conseguimos cobrir tudo. Com a saída das viaturas da Força Nacional das ruas, claro, houve uma diminuição do policiamento ostensivo;, reconhece o capitão Paulo Eugênio de Sousa, chefe da Seção Operacional e Estatística da companhia.
A dificuldade não é diferente em relação à Polícia Civil. Um agente do Centro Integrado de Operações de Segurança (Ciops) de Luziânia, que preferiu ficar no anonimato, lembrou que possíveis melhorias na ação da PM não são garantia de cidades mais seguras. ;A Força Nacional veio fazer policiamento ostensivo, mas o trabalho que começa na rua acaba aqui, onde não tem efetivo;, disparou. Segundo o delegado responsável pela unidade, Fabiano Medeiros, de 18h até 8h do dia seguinte, o Ciops conta apenas com um delegado, dois escrivães e quatro agentes para atender sete cidades.
Para saber mais
Área de alto risco
A Força Nacional de Segurança interveio nos municípios do Entorno do Distrito Federal em outubro de 2007. Chegou a uma regiões mais violentas do país um mês depois que o Correio publicou a série Tráfico, Extermínio e Medo. Após a execução das estudantes Natália Oliveira Vieira, 14 anos, e Raiane Maia Moreira, 17, em 13 de agosto de 2007, o repórter Amaury Ribeiro Jr., do Correio Braziliense e do Estado de Minas, começou a investigar a escalada de violência no Entorno. Em 19 de setembro, durante o trabalho, Amaury Ribeiro Jr. foi baleado na Cidade Ocidental (GO). Ele sobreviveu. Mesmo após o crime, o jornal continuou com as reportagens, o que provocou a intervenção da Força Nacional de Segurança. O serviço começou com 130 homens e, em agosto de 2008, o governo federal anunciou que a região vizinha ao DF teria a primeira unidade permanente da tropa no Brasil. Foram investidos R$ 29 milhões na compra de equipamentos e na adequação da sede em Luziânia. Na época, o secretário Nacional de Segurança Pública, Ricardo Balestreri, disse que a ;Força Nacional de Segurança não sai mais do Entorno. A redução nos índices de violência e o apoio da população foram fundamentais para que os agentes permaneçam no local;.