Cidades

Projeto musical transforma a vida de crianças e adultos de Santa Maria

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postado em 21/05/2009 07:55
A música invadiu uma sala apertada de um posto de saúde. Não, não são médicos tentando um tratamento alternativo com seus pacientes. Nem mantra pra acalmar a dor. Nem doutores da alegria, fantasiados de palhaços, levando humor às criancinhas. Flautas doces, violinos, saxofones, trombones e trompetes entoam canções. Vozes cantam músicas. E aquele lugar, normalmente cheio de angústia e espera, agora é só melodia. Crianças, adolescentes e até adultos juntaram seus instrumentos, formaram uma banda e montaram um coral. Aquela gente de jaleco branco, no começo arredia com a revolução dentro de suas cercanias, hoje entendeu toda a movimentação. E é lá, no condomínio Sítio do Gama (região de Santa Maria), onde o posto está localizado, que a vida se transformou. Que história é essa, afinal? Era uma vez uma professora de educação artística, com habilitação em música, que há seis anos deixou o Rio Grande do Sul e veio morar no DF. Aqui, foi aprovada em concurso da Secretaria de Educação. Lá, encontrou-se com uma professora de física, criada em Taguatinga. As duas se juntaram num mesmo propósito. E pensaram num projeto que mudaria para sempre a rotina daquelas crianças. Elas só não sabiam que, além das crianças e dos adolescentes, adultos também iriam se engajar naquele sonho. Nasceu o projeto Santa Maria em Pauta. A Diretoria Regional de Ensino (DRE) da cidade apoiou a iniciativa. Jaira Prestes, 52, a gaúcha, e Priscila Sabino, 28, decidiram ensinar música ; na teoria e prática ; às crianças de todas a comunidade. No início, as aulas eram realizadas no centro cultural do condomínio Sítio do Gama. Mas um dia o espaço teve que ser ocupado. E o administrador do local lhes disse que havia uma outra opção: duas salas pequeninas, no posto de saúde. Ali mesmo elas montariam suas oficinas musicais. Há três meses, naquele lugar onde as pessoas vão se queixar de dor, meninos e meninas de 6 a 14 anos tocam flauta doce e transversal, violino, sax, trombone, trompete, clarinete e bombardino. Formaram uma banda com instrumentos de sopro. Além da banda, fazem parte de um coral. Filhos de funcionários do posto de saúde juntaram-se àquelas crianças. Hoje, são mais de 150. A dor dos pacientes ; diante da alegria daquelas crianças descobrindo sons e da magia que a música provoca ; até diminuiu. Como se não bastassem as crianças do posto, o projeto se estendeu também aos professores do Centro de Ensino Fundamental 416 (séries iniciais) de Santa Maria. Numa salinha de aula, toda terça-feira à tarde, Jaira e Priscila capacitam 32 docentes para que eles disseminem a música entre seus alunos. Energia Quarta-feira, 15h30. As duas salinhas do posto de saúde estão lotadas. Jeferson Lucas, 6, toca flauta doce. A mãe dele, Gelseney de Fátima Santos, 37, de tanto levá-lo às aulas, também vai aprender a tocar. ;A música mudou a vida dele. Antes, o Jeferson ficava vendo televisão e não tinha muita coisa pra fazer.; Gustavo da Silva, 14, começou como Jeferson, na flauta doce. Agora, arrasa no saxofone. ;Tudo mudou pra mim;, reconhece. Leidislaine Moronari, 15, hoje dá show na flauta transversal. ;Eu me desenvolvi mais na escola. Não sabia tocar nada, nem conhecia os instrumentos;. O pequeno Judson Seraine Júnior, 9, é um dos mais empolgados com o projeto. Da flauta doce chegou ao violino. E determinou-se: ;Quero ser um grande músico, até o fim da minha vida;. Com a voz embargada, Priscila entende exatamente o que suas crianças dizem: ;A música tem uma energia incrível. Ela une todo mundo;. Todo dia chegam mais novos alunos ao projeto. A porta do posto de saúde está sempre aberta. Faltam cadeiras, mas nem isso é empecilho. E essa turma, em tão pouco tempo, já se apresentou em três locais diferentes da cidade. Já viajou. Ganhou prêmios, mesmo com tanta dificuldade que enfrentam até para a locomoção. Foram aplaudidos como gente grande. Na última sexta-feira, foi a vez da banda e do coral, juntos, se apresentarem na inauguração do prédio da DRE de Santa Maria. Jaira e Priscila compuseram o hino da entidade. Uma mãe, ao ver e ouvir o que sua filha seria capaz de fazer com o instrumento, não segurou as lágrimas. Down Priscila sabe que emoção é essa. ;Eu também sou fruto de um projeto social como esse. Comecei aos 10 anos, no Sesi de Taguatinga, depois fui pra Ceilândia e por último no EIT (antiga Escola Industrial de Taguatinga). Hoje, virei regente de banda.; Empolgada, Jaira emenda: ;A gente quer música pra todo mundo. E isso pode ser realidade;. Jaira lembra a importância que isso pode produzir na vida das crianças. ;Uma pesquisa feita com alunos da rede pública de São Paulo comprovou que 70% das crianças têm uma desordem do processamento auditivo central. Na rede particular isso cai para 20%. Isso significa que eles escutam, mas não entendem o que escutam. A música ajuda a organizar os sons. Por isso, é preciso trabalhar desde cedo;, explica a professora. Numa daquelas salinhas apertadas do posto de saúde, as crianças tocam, na flauta doce, o tema do filme Titanic. Jaira os acompanha no violão. É uma emoção ímpar. Bem na frente, Pedro Henrique Silva, 21, toca que toca. Sorri com o som que seu instrumento produz. Termina a música. Ele bate palmas, com emoção genuína. ;Eu amo tocar.; Pedro Henrique tem síndrome de Down. Só por este momento, o projeto das duas professoras que acreditam na música como inclusão e superação de limites já teria valido a pena. » POR UMA CAUSA O projeto Santa Maria em Pauta precisa de instrumentos musicais, mesmo usados. Quem puder ajudar pode falar com Jaira ; 9655-0023 ou Priscila ; 9147-0608

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