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Crime que revoltou Brasília há duas décadas será julgado sem a presença do acusado

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postado em 30/05/2009 08:46
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) confirmou, na tarde de quinta-feira, o julgamento de Marcelo Bauer no Tribunal do Júri. A decisão unânime da 2ª Vara Criminal sai 22 anos depois da revelação de um dos crimes de maior repercussão da capital. Aos 43 anos, com nacionalidade alemã e novo nome ; Marcelo Nielsen ;, o réu responderá pela morte da estudante Thaís Muniz Mendonça, assassinada com 19 facadas e um tiro na cabeça em julho de 1987. Foragido na Europa, o julgamento ocorrerá mesmo sem a presença do réu. O Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) articula com o Itamaraty e a embaixada alemã para levar o processo para o país estrangeiro. De acordo com a assessoria de comunicação do TJDFT, o julgamento deve ocorrer dentro de um mês. O desembargador Arnoldo Camanho levou em conta os laudos de exame cadavérico e de reconhecimento, além do depoimento de testemunhas, para relatar a decisão. Afirmou ainda que a fuga de Marcelo para a Europa logo depois de ser declarado réu, não tendo retornado nos últimos 20 anos, serve como indício para a autoria do crime. Destacou também cartas escritas pela vítima relatando ameaças de morte feitas pelo então namorado. ;Tudo indica que fugiu com documentos falsos, mesmo sabendo do processo e da expedição do mando de prisão em seu desfavor;, comentou o desembargador. O crime prescreve em 11 de outubro deste ano. Isso significa que, caso Marcelo não seja julgado até a data, passa a ser imputável. ;Com a lei que reformula o Código de Processo Penal, ele poderá ser julgado, mesmo foragido (leia ao lado). Mas, em caso de condenação, só poderá ser preso se voltar ao Brasil;, explicou o professor de processo judicial Cleber Lopes. O especialista ressalta que, a partir da condenação, passa a valer uma nova prescrição. ;O novo prazo tem a duração da pena proferida. Caso ele não volte no período, passa a ficar fora do alcance da lei;, comentou. O réu pode pegar até 30 anos de reclusão pela morte de Thaís. De acordo com o promotor do MPDFT, Maurício Miranda, ligado ao Tribunal do Júri, a última notícia de Marcelo indica que ele está na Alemanha. O acusado, que tem descendência alemã, conseguiu nacionalidade no país. Isso dificulta a sua vinda para o Brasil, mesmo mediante ordem judicial. ;Trazer ele para cá é uma questão complexa. Mas estamos em contato com o Itamaraty (Ministério das Relações Exteriores) e com a Embaixada da Alemanha para que ele seja julgado lá;, afirmou Miranda. Antes de ir para o país europeu, Marcelo chegou a ser preso pela Interpol na Dinamarca. Mas acabou libertado depois de oito meses. Ajuda da família Assim como Thaís Mendonça, Bauer estudava na UnB e vivia com a família, de classe média. Encontrar o acusado de sequestrar e matar a jovem se tornou difícil, segundo investigadores da Polícia Civil, por causa do pai dele. À época do crime, o coronel Rudi Ernesto Bauer trabalhava no Serviço de Inteligência da Polícia Militar do DF. Segundo investigadores, ele planejou a fuga do filho com a ajuda de militares da corporação e do Exército. Em 2000, o caso virou prioridade para o Departamento de Atividades Especiais (Depate) da Polícia Civil do Distrito Federal. Na época, 13 anos depois da morte, dois agentes seguiram para Aarhus, na Dinamarca, onde Marcelo vivia com uma dinamarquesa e cursava comércio exterior em uma faculdade local. Entenda o caso Perto de prescrever O CRIME Thaís Muniz Mendonça foi vista com vida pela última vez por volta do meio-dia, em 10 de julho de 1987. A estudante de 19 anos deixava a Universidade de Brasília (UnB), onde cursava letras. A polícia encontrou Thaís dois dias depois, em um matagal próximo à 415 Norte. Ela foi morta com 19 facadas no pescoço e um tiro na cabeça. A FUGA Marcelo Bauer, ex-namorado de Thaís, acabou apontado como autor do crime. Segundo o inquérito, a jovem foi assassinada dentro do carro dele. O Tribunal do Júri de Brasília acatou a denúncia do Ministério Público e o pronunciou como réu em 11 de outubro de 1989. Bauer fugiu antes que o julgamento fosse marcado. A PRISÃO A Polícia Civil do Distrito Federal encontrou Bauer 13 anos após a fuga. O acusado estava em Aarhus, na Dinamarca, onde morava havia oito anos. Como o foragido estava fora de jurisdição, a polícia recorreu à Interpol, que prendeu Bauer. A LIBERDADE Dias depois, o Ministério da Justiça pediu a extradição do acusado. O governo dinamarquês aceitou. A defesa de Bauer recorreu em março de 2001. Três juízes federais da Dinamarca suspenderam a extradição e libertaram o brasileiro, após oito meses de prisão. NOVA FUGA O governo brasileiro apelou à Suprema Corte da Dinamarca, que autorizou a extradição. Nesse meio tempo, Mareclo Bauer deu entrada no pedido de cidadania alemã. Quando a Justiça dinamarquesa acatou a extradição do brasileiro, a Interpol descobriu que o acusado não estava mais na Dinamarca. OUTRO NOME A Interpol localizou Bauer na Alemanha. Em 2002, o governo alemão negou a extradição pedida pelo Brasil. Em seguida, o acusado conseguiu a cidadania e mudou o sobrenome. Passou a se chamar Marcelo Nielsen. O avô paterno dele é alemão. JULGAMENTO I Em 4 de dezembro de 2007, o Ministério Público do DF entrou com pedido de julgamento à revelia do suposto assassino de Thaís Mendonça. O promotor Andrelino Santos Filho temia a prescrição do crime, que ocorre em 11 de outubro de 2009. Mas, na época, a legislação não permitia julgamentos com o réu ausente. JULGAMENTO II Na última quinta-feira, decisão unânime da 2ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) confirmou o julgamento de Marcelo Bauer pelo Júri Popular, com base na Lei Federal nº 11.689/08. Foragido no exterior, o acusado será julgado à revelia em data ainda não definida. Para saber mais Contra a impunidade A Lei Federal nº 11.698/08, aprovada em agosto do ano passado, permite o julgamento de réus foragidos ou não encontrados pela Justiça brasileira. Na prática, o julgamento ocorre normalmente, com a presença do juiz, promotor e defensor público, mas sem o acusado. Um dos objetivos da norma que reformula o Código de Processo Penal é evitar a prescrição de crimes antigos, em que o réu passa a ser imputável depois de vinte anos da denúncia. De acordo com a lei, no entanto, o acusado deve saber do andamento do processo antes que o julgamento ocorra sem a presença dele. No caso de Marcelo Bauer, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) entende que ele está ciente do andamento das ações, visto que compareceu às primeiras intimações, ainda na década de 1980, antes de fugir para a Europa. Além de garantir o julgamento de réus ausentes, a norma simplifica e torna mais ágil o trabalho do Tribunal do Júri. Também elimina formalidades nas audiências, como a leitura dos processos na íntegra, por exemplo. Desde a entrada em vigor da nova legislação, o TJDF realiza mutirões mensais para julgar todos os casos próximos da prescrição até o fim do ano.

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