postado em 07/06/2009 08:12
O subsolo do Distrito Federal esconde galerias e corredores escavados em rochas há milhões de anos. O DF tem 35 grutas topografadas e registradas no Cadastro Nacional de Cavernas do Brasil. Muitas delas ficam em terrenos particulares, afastadas dos olhos da população. As estruturas subterrâneas são estudadas por grupos locais de espeleologia ; ciência com uma dose de esporte radical dedicada à pesquisa e mapeamento de cavernas. Brazlândia, Sobradinho e Planaltina comportam a maior parte das cavernas do DF. Elas se formaram na região há milhões de anos, a partir de água e rochas solúveis, como calcário. O desenho das galerias e salões subterrâneos foi criado lentamente; a água que entra pelas fendas esculpiu as rochas ao longo dos milênios.
Uma das cavernas mais conhecidas do DF é a Gruta do Sal, em Brazlândia. Ela está localizada dentro de uma fazenda particular e é destino tradicional de espeleólogos. Antes mesmo de entrar na caverna, os capacetes e a iluminação estão a postos. Passa das 10h da manhã, mas parece que a noite está próxima. Os raios de sol clareiam apenas o primeiro compartimento da caverna ; é só andar um pouco e observar o breu tomar conta do espaço. O clima na área interna é estável e pouco varia ao longo do dia.
É difícil entender como tanta pedra foi parar ali dentro, mas o engenheiro florestal Bernardo Menegale Bianchetti, 26 anos, explica. ;Ossos e conchas eram depositados em um fundo de rio ou mar e o acúmulo de sedimentos orgânicos se compactou, virando rocha. Com a movimentação tectônica ou a redução do lençol freático, ela ficou muito distante do nível do mar;, disse. A água corre por dentro da rocha e dissolve parte do calcário, erodindo as paredes. Bernardo é vice-presidente do Espeleo Grupo de Brasília (EGB). Fundado em 1977, o EGB reúne praticantes da espeleologia e faz o mapeamento de grutas do DF, Minas Gerais e Goiás.
Os temidos moradores da gruta logo dão os primeiros sinais. Os morcegos são discretos durante o dia, mas acabaram flagrados voando no topo da estrutura. Restos de fezes indicam que o grupo deve gostar de sangue. Os mamíferos voadores convivem com muitos insetos e quase nenhuma planta. ;A fauna de invertebrados é muito rica. Os troglóbios são seres especializados em viver nas cavernas. Eles se adaptaram à escuridão, alguns não têm pigmentos;, afirmou o analista ambiental do Centro Nacional de Estudo, Proteção e Manejo de Cavernas (Cecav) José Carlos Ribeiro Reino.
A Gruta do Sal está com salões alagados logo no início do percurso, então não é possível ir muito longe. A restrição não prejudica o visitante ; as estalactites e estalagmites formadas pela água carregada de calcita. O material se acumula no teto da caverna e pinga no chão, criando estruturas sólidas nas duas extremidades. Com o passar de milhares de anos, algumas se unem e viram colunas no meio da gruta.
Bernardo e o presidente do EGB, o administrador de empresas Willamy Sabóia, 38 anos, estão sempre em busca de novas grutas. ;Vamos em áreas com muito calcário e conversamos com mateiros, fazendeiros. Alguém joga uma pedra em um buraco e não escuta ela chegar no fundo, aí procura a gente;, comentou Willamy. As cavernas nem sempre são horizontais. Elas podem ser formadas no sentido vertical, só exploradas com cordas e equipamento para a descida.
Restrições
Apesar do interesse que despertam, as cavernas não são lugares para visitas de leigos desacompanhados. Elas apresentam alguns riscos que só podem ser evitados com conhecimento prévio da estrutura. Um dos principais problemas é se perder dentro da gruta. Os raios de luz não vão muito longe e o breu é total logo nos primeiros salões. Algumas cavernas têm formato de labirinto, o que exige muita experiência do explorador.
Há risco de inundação das galerias em época de chuva forte. ;A contribuição de água da chuva é direta, o nível da água sobe rápido. Uma pessoa desavisada pode ser carregada;, comentou o analista José Carlos. Além disso, a fauna local oferece certos perigos ao visitante. Espécies de animais peçonhentos podem habitar a caverna e passar despercebidos na escuridão. Os morcegos, tradicionais habitantes das grutas, transmitem a histoplasmose ; doença que ataca o pulmão e provoca sintomas parecidos aos dá pneumonia, como tosse e febre. O Espeleo Grupo de Brasília oferece cursos de iniciação aos novatos, com dicas de segurança. As reuniões acontecem às terças-feiras no Espaço Renato Russo (508 Sul), às 19h30.
Atualmente, há cerca de 4 mil cavernas registradas no Brasil ; estima-se que isso represente entre 4% e 6% do total de grutas do país. Desde a Constituição de 1988, as cavernas eram consideradas patrimônio da União e não podiam ser destruídas. No entanto, o Decreto nº 6.640, de novembro de 2008, criou classificações para as cavernas e permitiu impactos negativos em algumas delas. O grau de relevância de uma gruta pode ser máximo, alto, médio ou baixo, de acordo com as características do ambiente. As de classificação máxima estão protegidas, mas as dos grupos de alta e média classificação podem ser degradadas mediante ações de compensação. Já as consideradas de baixa importância estão na berlinda ; donos de terra têm autorização de destruí-las sem nenhuma contrapartida.