Cidades

Bancas se tornam pontos de encontros para a comunidade

postado em 28/06/2009 08:36
O que seria das quadras residenciais de Brasília sem as bancas? Elas são ponto de encontro, informação e cultura. Há moradores que não compram uma balinha sequer, mas estão sempre ali por costume e tradição. Jornaleiros dão conselhos, viram amigos, conhecem todo mundo e todo mundo os conhece. ;Não vejo interação assim nem em assembleia de condomínio;, observa o oficial da reserva da Marinha Ivan Moraes Rêgo, 80 anos, morador e cliente da banca da 112 Norte há mais de 20. Antes das 7h, já tem gente de plantão na porta das bancas à espera do jornal e de uma boa conversa sobre as notícias do dia ou sobre o jogo da noite anterior. Aos domingos, a prosa é acompanhada de água de coco ou cerveja nas mesas e cadeiras do lado de fora. ;Numa época em que pouca gente se interessa pelo próximo, a gente troca ideias, conta e ouve histórias na banca;, comenta Ivan. A casinha, geralmente de ferro, é o cartão de visitas da quadra: deixa-a mais leve e mais humana. Mas vida de jornaleiro é dura. Até porque banca boa é banca aberta, de segunda a segunda, incluindo feriados e dias santos. ;Cada doido com sua mania. Eu adoro estar aqui;, diz José Roberto Rodrigues, 38 anos, o Beto Banca, do ponto da 207 Sul. Ele cresceu entre jornais e revistas. Começou a trabalhar aos 11 anos e, quando o pai morreu, em 1985, assumiu o negócio da família. ;Sou o que sou porque segui os passos dele. Sei que jornaleiro não tem muito status, mas sou feliz com o que faço;, completa. O vínculo com os moradores fez Beto encarar um curso superior. Incentivado pelos amigos da quadra, formou-se em turismo e, nas últimas eleições, tentou a vida política. Recebeu 537 votos para deputado distrital. ;Fiz campanha só aqui;, garante. A popularidade ajudou a banca a crescer. Com 30 metros quadrados, ela abriga inclusive uma lan house, com três computadores. As entregas de galão d;água, outro serviço oferecido, são feitas até em cidades como Guará e Núcleo Bandeirante. O mercado exigiu das bancas a diversificação de produtos. ;Virou um minishopping, vendemos de tudo;, reconhece Maria de Souza, 36, uma das sete pessoas que trabalham na banca da 103 Sul. Nas prateleiras, CDs e DVDs, canetas, chips para celular... No balcão, o cliente pode tirar xerox e passar fax. E o estabelecimento aceita todos os cartões de crédito. ;Hoje tem jornal e revista no supermercado, no posto de gasolina, na padaria. Então as bancas tiveram que mudar;, analisa a funcionária. Entrega em domicílio Quase todas as bancas entregam produtos no apartamento do cliente. Basta ligar e, em pouco tempo, o jornal, a revista ou seja lá o que for estará em mãos. No ponto da 103 Sul, 72 pessoas estão cadastradas no sistema de débito automático. Pegam o que querem e no fim do mês o valor é descontado na conta. A simpatia de Edina Maria Cintra, 57, dona da banca, é um dos segredos da clientela sempre em alta. A maioria dos visitantes fiéis nem mora mais na quadra. Na 108 Sul, quadra da primeira banca de Brasília, Lourivaldo Marques, 71 anos, é mais que um jornaleiro. Desde que começou a vender periódicos em um tamborete de madeira na comercial, em 13 de fevereiro de 1960, não parou de ter ideias. Passou a trabalhar com lanches, a alugar filmes e, agora, quer fazer do lugar um ponto turístico para os que visitam a capital federal. ;Eu sou o cara! É da minha natureza. Não consigo ficar parado. Termino um projeto e já começo outro;, diz o baiano de Irecê. Na frente da banca, Lourivaldo pintou uma amarelinha no chão. Ao lado, plantou duas árvores que formam o ;arco da amizade;. Quem compra mais que R$ 13,90 em produtos ganha o direito de girar uma roleta e concorrer a brindes. ;É um ponto cultural mesmo. Venho comprar uma revista e levo um filme para o filho, é legal isso;, comenta o servidor público João Holanda, 47, morador da quadra que cresceu frequentando o cantinho de Lourivaldo e agora ver o filho com seis anos fazer o mesmo. São poucas as quadras do Plano Piloto que não possuem uma banca. De acordo com o Sindicato dos Vendedores de Jornais e Revistas (Sindjor), existem cerca de 1,1 mil pontos de venda espalhados pelo Distrito Federal ; 700 instalados em área pública. ;Mesmo assim, Brasília tem uma carência de mais de 500 bancas. Cidades como Águas Claras, Recanto das Emas e São Sebastião não têm nem uma na rua;, pondera o presidente da entidade, José Maria da Cunha, 60. O sindicato estima ainda que cada ponto de venda gera, no mínimo, três empregos diretos. Segundo José Maria, a banca presta um serviço de extrema importância para a comunidade vizinha. ;Só traz mais segurança para o lugar e interação entre as pessoas;, destaca, antes de comentar a evolução do setor. ;Tivemos que criar novos motivos para que as pessoas continuassem tendo vontade de ir à banca. Não dava mais pra vender só jornais e revistas, porque hoje eles estão em todo lugar;, ressalta. Na W3 Sul, para sobreviverem ao marasmo comercial da avenida, as bancas foram obrigadas a se especializar. Muitas optaram por investir na venda de apostilas para concursos públicos. ;As revistarias invadiram os shoppings e um pouco da tradição das bancas foi se perdendo. Aí não tivemos muita opção; o mercado nos forçou a diversificar os produtos;, acredita a dona da banca da quadra 506, Anne Candace, 26 anos. A tradicional Banca da Rodoviária, na plataforma superior do terminal do Plano Piloto, atrai gente de todo o DF e do Entorno. E lá só se vendem jornais e revistas. ;Não pode ser diferente aqui. Tem que ser cada um no seu ramo. Não vendemos refrigerante, mas o bar também não vende jornal;, explica a funcionária Maria das Graças. Na banca, o cliente encontra periódicos de todas as regiões do Brasil. Quase todo mundo que passa por lá não resiste a uma paradinha para ler as manchetes.

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