postado em 02/07/2009 09:36
Os salários dos servidores públicos do Distrito Federal poderão ser divulgados na internet à população, assim como ocorre, desde o mês passado, na Prefeitura de São Paulo. O Governo do DF estuda o lançamento de um portal, com base no modelo da administração do prefeito Gilberto Kassab (DEM), para garantir a transparência das contas públicas. Embora a ideia seja apenas uma possibilidade, já provoca polêmica. A Central Única dos Trabalhadores no DF (CUT-DF) avisou que recorrerá à Justiça contra o GDF, caso a implantação do portal implique a divulgação nominal dos vencimentos dos servidores.
"Essa forma de divulgação é uma violação do direito individual e expõe os servidores ao risco. Se realmente isso acontecer, compraremos essa briga com o GDF", adiantou a presidente da CUT-DF, Rejane Pitanga, durante uma reunião na manhã de ontem com sindicalistas.
Para Rejane, a quebra do sigilo funcional do servidor é inconstitucional e pode fazer com que o trabalhador fique mais visado por criminosos e exposto a constrangimentos. "Nós, mais do que ninguém, defendemos a transparência nas contas públicas, mas as pessoas têm o direito de querer, ou não, que ninguém saiba quanto elas ganham", defende.
O patrão
Na visão do secretário de Planejamento e Gestão do GDF, Ricardo Penna, o contribuinte tem o direito de saber o quanto ele paga pelo serviços que utiliza. "Mostrar o salário para os patrões dos servidores não me parece agressão alguma. Pode até não ser conveniente, mas não vai prejudicar em nada o servidor", avalia.
Penna, entretanto, reitera que ainda não há decisão se a remuneração bruta dos servidores será publicada. Dentro de 15 dias, ele pretende apresentar ao governador José Roberto Arruda um modelo para que o contribuinte seja informado dos gastos públicos de maneira simples e direta. "Podemos divulgar a lista dos servidores com seus salários e cargos ou em forma de tabelas com os salários mais baixos, médios e mais altos de cada categoria, por exemplo", explica.
Os servidores temem que o caso vire assunto de polícia. "É uma arma na mão do bandido. O servidor será uma presa fácil de sequestro relâmpago", acredita o diretor do Sindicato dos Auxiliares em Educação (SAE/DF), Denivaldo Alves.
Para Rejane Pitanga, a abertura dos rendimentos do servidor para a sociedade representa ainda o congelamento de salários. "É mais uma forma de querer comparar os salários do DF com o de outros estados e depois nivelar pela miséria", acredita.
O cientista político da Universidade de Brasília (UnB), David Fleischer, não encara a publicação como algo ruim, principalmente se ela também ocorrer no alto escalão. "É excelente saber como o dinheiro público é gasto. A Câmara Legislativa tem despesas demais e a transparência é algo fundamental", defende.
Fleischer avalia que a discussão não deve ser em torno de manter a privacidade do servidor. "O servidor público tem que entender que quando ele se torna servidor significa servir o público e a sua privacidade deve ser sacrificada", opina.
Desde 2004, a Controladoria- Geral da União (CGU)mantém um portal para que a população possa consultar quanto o Governo Federal gasta com a administração pública. Entretanto, o contracheque dos servidores federais não são exibidos. Segundo a CGU, a intenção não é expor quanto cada pessoa ganha, mas informar onde está sendo investido o dinheiro do contribuinte.
Memória
Iniciativa paulista
O governo da Prefeitura de São Paulo foi o primeiro no país a disponibilizar, na internet, informações sobre a administração pública. O site Portal da Transparência foi lançado em 16 de junho deste ano com o objetivo de divulgar à população as contas da Prefeitura, como o salário dos funcionários. A polêmica foi tamanha, que em três dias, o site recebeu mais de um milhão de acessos. Os professores resolveram entrar com uma liminar na Justiça e conseguiram que seus nomes e salários fossem retirados do portal.
Palavra de especialista
Informação só por cargo
Eu acho que a divulgação dos salários do servidor atende o interesse público, desde que sejam informados por cargo, sem precisar constar o nome do servidor. Não é que isso fere a intimidade, mas de qualquer maneira deixa a pessoa vulnerável ainda mais em uma realidade social como a nossa, em que os níveis de violência são muito elevados.
A Constituição resguarda o sigilo de dados e a intimidade da vida privada. A remuneração é publica, mas o servidor está recebendo para o seu sustento e de sua família. É uma matéria que não está clarificada nas instâncias judiciais, mas, em princípio, deveria ser evitada a publicação do nome da pessoa e quanto ela ganha porque isso seria exposição demasiada.
Mamede Said é professor de direito constitucional da UnB.