Cidades

MP investiga 480 casas por suspeita de ocupação irregular de área pública às margens do Paranoá

Mirella D'Elia
postado em 07/07/2009 07:50

Uma visão aérea da orla do Paranoá não deixa dúvidas de que a as áreas públicas têm sido abertamente usurpadas. O Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (MPDFT) investiga cerca de 480 casas nos lagos Sul e Norte por suspeita de ocupação irregular. Algumas das propriedades na mira do MP são conhecidas como pontas de picolé ; trata-se dos terrenos mais próximos às margens do lago e, por isso, mais valorizados.

A partir do total de propriedades na mira do MP, foram abertos 180 inquéritos pela Polícia Civil do DF nos últimos 12 meses ; média de um a cada dois dias. As investigações apuram possíveis danos ao meio ambiente e, em alguns casos os inquéritos já viraram ações penais que correm na Justiça do DF. ;Infelizmente, muitas pessoas ocupam a área pública como se fosse particular. Mas não se pode deixar de cumprir a lei;, avalia Kátia Lemos, da Promotoria de Defesa do Meio Ambiente.

Praticamente todos os proprietários de casas que circundam o Lago Paranoá tiveram a mesma conduta nas últimas décadas. Estenderam a propriedade até a borda do lago, tomando como privado uma fatia de terreno que o MP assegura ser de natureza pública. Na maioria das vezes, os moradores das casas luxuosas constroem píeres e mantêm jardins no espaço entre a casa e a margem. O terreno incorporado tem, em média, uma extensão de 30m ; justamente a medida onde, por lei, nada poderia ser erguido. Isso torna as mansões, já valorizadas pela localização, ainda mais exclusivas e caras, pois é possível ter acesso particular às águas.

O Ministério Público sustenta, no entanto, que as margens do lago são protegidas pelo Código Florestal (Lei Federal n; 4.771/65), já que se trata de uma Área de Proteção Permanente (APP). A legislação prevê que esse tipo de local só pode ser ocupado em caso de utilidade pública ou interesse social. Mas, nessa região, o que determinou a ocupação dos terrenos foram interesses particulares e não coletivos, como manda a lei. ;A ocupação irregular não é uma exceção: é a regra;, afirma Kátia Lemos. A pena prevista para a ocupação ilegal de terrenos de uso público é prisão (veja O que diz a lei).

A promotora acompanha de perto um processo que já chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e trata da casa pertencente a Dalmo Josué do Amaral, pai do ex-senador Valmir Amaral. Segundo a acusação, Amaral esticou seu terreno até o Lago com a construção de três píeres, além de um estacionamento para barcos. A promotora promete reagir caso o STJ dê ganho de causa ao empresário. ;Se o processo for trancado, nada impede que o MP entre com uma ação civil pública. O caso dele é emblemático. Além do dano ambiental, ainda ocupa área pública.;

Retirada determinada
Não é por falta de aviso que os proprietários mantêm uma fatia de terreno público como se fosse área privada. Nos últimos dois anos, o Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do DF (Ibram) ; órgão vinculado à Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente ; autuou as mansões que invadem área à beira do lago e determinou a retirada das construções irregulares. Na maior parte dos casos, no entanto, os moradores acionam a Justiça e conseguem manter as obras no local invadido por meio de liminares.

[SAIBAMAIS]Ao mesmo tempo em que ganham prazo na Justiça, os proprietários tentam conseguir com o governo o direito definitivo de ocupar os terrenos. Segundo a assessoria de imprensa do Ibram, quase todos os donos de lotes que incorporaram parte da orla do lago desejam formalizar a situação e, por isso, entraram com processo no órgão. Mas a Circular n; 18 de 2008 proíbe o instituto de autorizar qualquer ;obra;, ;ocupação; ou ;atividade; nas APPs do Lago Paranoá.

O fato de o poder público nunca ter ocupado a orla do lago é citado pelo secretário de Ordem Pública e corregedor do DF, Roberto Giffoni, como um das brechas que facilitaram a invasão. Segundo o secretário, como a maior parte dos casos corre na Justiça, o poder Executivo não tem muito o que fazer antes da decisão judicial. ;Paralelamente, o governo tem agido para evitar e coibir os abusos;, garante Giffoni. Ele conta que, em maio deste ano, a Secretaria de Ordem Pública determinou a derrubada de um muro recém-construído em uma QL do Lago Norte. ;A pessoa simplesmente chegou e limitou o acesso ao lago à casa dele, sem levar em conta que o terreno é público. Um caso como esse é emergencial e exemplar, não dá para esperar. Fomos lá e mandamos retirar;, diz o secretário.

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