Lotes em regiões nobres com desconto de 40% e a promessa de legalização em andamento. A propaganda tem atraído investidores e pessoas dispostas a adquirir terrenos em áreas de alta renda e a se beneficiar de um mercado cuja valorização em curto prazo é tida como certa. A proposta quase irresistível, no entanto, esconde mais um caso de grilagem de terras no Distrito Federal. O Correio visitou alguns desses atrativos terrenos anunciados nos últimos meses e constatou: o Setor de Mansões Park Way (SMPW) está sendo invadido por grileiros e - corretores de imóveis - que tentam ganhar dinheiro vendendo áreas públicas ou regiões de preservação ambiental. No Conjunto 4 do SMPW 24, por exemplo, um anúncio oferecia um lote de 2.500 metros quadrados por R$ 185 mil, enquanto os terrenos próximos estão à venda por cerca de R$ 300 mil. Vizinha ao terreno regular de número 1, a área em oferta foi denominada de "Lote " pela simpática corretora que se apresenta como Maíra. De voz calma e com explicações detalhadas para os questionamentos sobre a legalidade do empreendimento, a vendedora prefere a cautela e evita marcar encontros no local. Negou-se a comparecer nas três tentativas de a reportagem visitar o terreno acompanhada pela corretora. Sinal de R$ 30 mil Durante as conversas pelo telefone, a vendedora explicava a localização, ressaltava a procura acirrada pela área, o bom preço e, claro, prometia que os documentos de regularização estão sendo elaborados pela Terracap. "Olha, quase que dá briga por esses lotes de tão bons que são. Melhor correr porque assim que a Terracap conceder a matrícula, não vai sobrar nada", contava ela ao introduzir um pedido de dinheiro antecipado. "Para ajudar você, posso aceitar um sinal de R$ 30 mil e o restante quando a Terracap conceder a matrícula. Isso, claro, se você quiser e estiver mesmo interessada", insistia. O golpe da corretora foi denunciado por moradores à Administração Regional do Park Way. Ao ser descoberta, a vendedora apenas mudou o endereço da venda. Resolveu divulgar um "lindo e bem localizado" Lote 00 no Conjunto 9 da Quadra 17. O terreno está em área de preservação ambiental. Por conta da vista privilegiada e da proximidade com um lago, ela pediu R$ 200 mil pela unidade e garantiu que duas já haviam sido vendidas. "Inclusive a uma juíza." A corretora prometeu fornecer o número de telefone da suposta compradora, mas desconversou quando cobrada. Na Quadra 26 do SMPW, também há um lote constantemente anunciado. No Conjunto 7, denominaram a área de 1-A e chegaram a colocar uma placa no poste indicando o objeto em oferta. Depois que o golpe foi descoberto pela Administração do Park Way, a placa sumiu. As tentativas de venda, no entanto, não cessaram, de acordo com dois vizinhos. Relatos de um "quase comprador" do lote dá conta de que o vendedor dava explicações vagas quando questionado sobre a legalidade do terreno. Chegou a dizer que a numeração 1-A era a "nova tendência" dos endereços do setor. Também garantia que a regularização estava certa. Caso de polícia Nenhum dos terrenos está registrado no Cartório do 4º Ofício de Imóveis " onde constam todas as informações de lotes e residências legais da região", tampouco existem nos documentos oficiais da administração local. "Isso é caso de polícia! Tem de denunciar esse tipo de coisa. A Terracap não tem nada em andamento em relação ao Park Way e quem disser que isso está prestes a acontecer estará mentindo e tentando tirar proveito de áreas públicas, seja comprando para especular ou vendendo irregularmente", afirma o chefe da procuradoria do órgão, Vicente Jungman. De acordo com ele, a Terracap, a empresa estatal responsável pela venda de lotes públicos, não possui processos de regularização no Park Way no momento nem regulamentou ou concedeu matrículas recentemente para a região. "Esses casos são golpes", completa. Para evitar cair em armações imobiliários na luxuosa região, a consultora da associação dos moradores do Park Way, Gilma Rodrigues, diz que é preciso ficar atento aos preços e aos documentos. "Tem muito lote que é protegido por lei ambiental. Nada pode ser construído lá. Não há milagres. O preço de mercado segue uma média e valores muito abaixo dela devem sempre despertar desconfiança", alerta. De acordo com o gerente de Planejamento da Administração Regional do Park Way, Luiz Hogem, não são raras as tentativas de golpes e fraudes em escrituras de lotes no setor. %u201CA especulação imobiliária da área tem sido constante e é preciso ficar atento. A comunidade tem um papel importante nesse processo: precisa denunciar as irregularidades. Hoje (ontem) mesmo estamos analisando um anúncio de terreno de 800 metros quadrados em Vargem Bonita, próximo ao Park Way. É área pública e estão tentando vender%u201D, comenta Hogem. Fuja do problema Alguns cuidados devem ser adotados antes de comprar um terreno. Manoel Quirino, oficial do Cartório do 4º Ofício de Imóveis, lista o que é preciso fazer para não ser vítima de grilagem: # Verifique no cartório de imóveis da região se o lote existe legalmente. Para isso, ele deve ter uma matrícula e constar no mapa oficial que o cartório possui. # Observe se o terreno consta na lista da administração regional da área. Para iniciar qualquer construção, é necessária a autorização do órgão. # Fique atento aos documentos apresentados pelo vendedor. A escritura deve estar no nome do responsável pela venda. # Investigue se o lote de interesse está localizado em áreas públicas ou em regiões preservadas. No Park Way, em especial, terrenos vazios muitas vezes fazem parte de Áreas de Preservação Ambiental, que são protegidas por lei, ou são considerados áreas verdes. # Converse com os vizinhos do lote para saber sobre as demarcações. Terrenos públicos geralmente possuem cercas colocadas pelos próprios moradores da vizinhança para evitar invasões. O número R$ 185 mil é o valor pedido por um dos lotes %u201Cfalsificados%u201D, enquanto o preço de mercado dos terrenos vizinhos %u2014 estes regulares %u2014 chega a R$ 300 mil, aproximadamente