postado em 17/07/2009 08:13
Existem agentes da Polícia Civil que mesmo fora da corporação são muito valiosos. Não pela bravura ou competência, mas pelo prejuízo que podem causar aos cofres públicos. Dois, especificamente, vão custar nada menos que R$ 2 milhões. Depois de serem expulsos devido a denúncias de corrupção, de passarem anos longe de suas funções, foram readmitidos por decisão administrativa (e não judicial) ao serviço público. Isso ao apagar das luzes do governo de Joaquim Roriz (PMDB). E a conta, quem pagará agora será o contribuinte.
Por terem sido readmitidos, depois de várias tentativas de recurso, têm o direito de ganhar todos os salários e benefícios que deixaram de receber, durante o período fora da Polícia Civil. Os nomes dos policiais aparecem em documento interno da corporação a que o Correio teve acesso e não serão divulgados porque o processo correu em sigilo. Constam, surpreendentemente, numa relação de aposentados que teriam recebido pagamento, no final do ano passado, por licenças-prêmio não usufruídas.
Na relação, onde constam também delegados e peritos, aparecem os dois agentes cujos valores correspondentes de ganho saltam aos olhos. Um leva R$ 1,165 milhão e o outro, R$ 938 mil. %u201CEsses policiais foram expulsos, depois readmitidos e agora têm uma bolada para receber. Os nossos colegas que participaram das investigações contra eles, que participaram do processo punitivo, como ficam agora? Com cara de otários?%u201D, lamenta um integrante da Polícia Civil. A lista de pagamentos não foi divulgada no Diário Oficial, o que levou a Câmara Legislativa do DF a requisitar à Polícia Civil o encaminhamento da relação dos beneficiados.
Os dois agentes milionários ficaram por cerca de 10 anos fora da corporação. Foram demitidos depois que processo disciplinar da Corregedoria da Polícia Civil concluiu a participação deles em desvio de equipamentos. Eram aparelhos eletrônicos apreendidos, durante operação na casa de um traficante de drogas. Na época, os agentes trabalhavam em uma delegacia de Ceilândia. Depois de quase uma década, conseguiram o retorno por força de decisão administrativa. Foram readmitidos, por ato assinado pelo então governador Joaquim Roriz (PMDB), no seu último dia de mandato: 31 de dezembro de 2006.
Herança
Procurado pelo Correio, o diretor da Polícia Civil, Cleber Monteiro, explicou que a dívida com os dois agentes é uma herança da gestão passada, que o procedimento existe e não pode ser ignorado. No entanto, afirmou que o pagamento ainda não foi realizado, apesar de constar na lista dos beneficiados a que a reportagem teve acesso. Em valores atualizados, somente um deles já teria crédito de R$ 1,3 milhão. Mas é fato que podem receber o dinheiro. O ex-diretor da Polícia Civil e atual deputado federal, Laerte Bessa (PMDB), foi procurado, mas não foi localizado. Estava fora de Brasília, em viagem.
Uma nova lista com 25 nomes será encaminhada à Secretaria de Fazenda para pagamentos e a direção da Polícia Civil explicou que na segunda-feira os nomes seriam checados. %u201CVou mandar verificar se os nomes desses agentes estão na lista. Temos outras prioridades, como pagar as dívidas menores. Nossa meta é terminar essa gestão sem pendência alguma com nossos servidores%u201D, garantiu Monteiro.
Ele também lamentou o fato de alguns policiais demitidos conseguirem voltar à corporação por pequenos problemas processuais na hora da exoneração. Cerca de R$ 1 milhão serão pagos nos próximos dias a outros quatro, mas estes, por força de decisão judicial. %u201CHouve uma falha de fundamentação, uma coisa técnica, mas que anula o processo. O que não significa que os policiais tenham sido inocentados da denúncia. Mas dá a eles o direito do retorno%u201D, explica.
BENEFÍCIO
O Tribunal de Contas do DF, há cerca de um ano, julgou a favor da conversão em dinheiro do benefício. O GDF então liberou R$ 30 milhões para pagar.
Entenda o caso
Aposentadorias a partir de 2000
Há cerca de um ano, o Tribunal de Contas do Distrito Federal julgou a favor do direito dos aposentados da Polícia Civil a terem convertidas em dinheiro as licenças-prêmio não usufruídas. Em dezembro passado, o GDF então liberou recursos para o pagamento. Cerca de R$ 30 milhões saíram do Fundo Constitucional do DF para pagar 230 servidores. Todos esses se aposentaram em data posterior ao ano de 2000.
No entanto, não foi divulgada no Diário Oficial a lista dos nomes e os valores dos delegados, agentes e peritos beneficiados. O Correio teve acesso ao documento que relaciona os nomes dos beneficiados. Entre eles, há um agente cuja quantia a receber é de R$ 1.165.133,97. Há outro cujo benefício calculado chega a R$ 938 mil. Os valores devidos aos aposentados variam de R$ 2 mil a, no máximo, R$ 158 mil. A maioria recebeu entre R$ 20 mil e R$ 40 mil.
Os dois agentes que aparecem na lista com valores estratosféricos foram expulsos da corporação devido a denúncias de corrupção e ficaram cerca de 10 anos fora. No entanto, uma decisão administrativa, interna da Polícia Civil, após recursos desses policiais, determinou o retorno ao cargo. Não há decisão judicial sobre o caso. Eles foram readmitidos ao serviço público em 31 de dezembro de 2006, por decisão assinada pelo então governador Joaquim Roriz.
Apesar de constar na lista de beneficiados à qual o Correio teve acesso, a direção da Polícia Civil afirmou que o pagamento aos dois agentes não foi realizado, mas que realmente eles constam na lista de pendências de pagamento.
Há ainda um impasse. No caso, o pagamento da licença-prêmio aos que se aposentaram antes de 2000. O Tribunal de Contas do DF afirma que eles devem receber o benefício. Já a Procuradoria do DF sustenta que o direito prescreveu. Por causa disso, a Câmara Legislativa pediu recentemente a relação de todos os beneficiados pelos recentes pagamentos da Polícia Civil do DF.
Impasse com o TCDF
Há um impasse referente ao pagamento das licenças-prêmio não utilizadas aos aposentados da Polícia Civil. O Tribunal de Contas e o Governo do Distrito Federal (GDF) têm entendimentos diferentes sobre o período em que os aposentados poderiam reivindicar o benefício. O GDF decidiu que apenas os servidores que se aposentaram a partir do ano 2000 teriam direito. %u201CÉ equivocado o entendimento de que prescreveu o benefício para os aposentados com data anterior. Todos devem ser pagos%u201D, afirma o presidente do Tribunal de Contas do DF, Paulo César Ávila.
Ele ainda explica que também não pode ser usado o argumento de que o período não utilizado da licença-prêmio poderia ser somado em dobro na conta para tempo de serviço. %u201CMuitos servidores não precisaram fazer isso. Já tinham mais tempo que o necessário para se aposentar. Por isso não têm o direito de receber o pagamento? Têm, sim%u201D, reforça Ávila. O diretor da Polícia Civil, Cleber Monteiro, disse que não depende dele a decisão de pagar. %u201CPor mim, eu pagaria. Mas quem define isso é Corregedoria do Governo do Distrito Federal. Os pagamentos são feitos somente depois que eles autorizam%u201D, esclarece.
Os sindicatos que representam delegados, agentes e peritos reivindicam o pagamento a todos os aposentados. Pressionam para que o governo estenda o benefício. %u201CÉ uma questão de humanidade. Essas pessoas já são idosas, precisam de dinheiro para pagar tratamento de saúde. Deveriam ser as primeiras a receber%u201D, defende Mauro Cezar Lima, presidente do Sindicato dos Delegados da Polícia Civil (Sindepo).