Cidades

Grileiros aplicam golpe no Lago Sul

Terrenos de parcelamentos não implantados são vendidos irregularmente e a preços irrisórios. Quem comprou terra em área pública e não construiu até janeiro de 2007 vai perder dinheiro: propriedade terá de passar por licitação

Helena Mader
postado em 05/08/2009 08:29
Os condomínios não implantados, que resistiram à grilagem e permaneceram vazios, são alvo constante de especuladores. O cercamento, as guaritas e os carnês de IPTU dão um aspecto de legalidade aos empreendimentos, o que estimula o comércio irregular nessas áreas. Somente no Lago Sul, por exemplo, há quatro áreas de propriedade do GDF que são negociadas livremente. Um lote na região é vendido ilegalmente por cerca de R$ 20 mil ; valor 20 vezes inferior ao preço de mercado. Mas a Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap) alerta: todos os imóveis públicos em parcelamentos vazios serão licitados e quem negociar áreas na região vai jogar dinheiro fora. No Distrito Federal, há 85 condomínios não implementados.

A expectativa de quem compra é a regularização das terras vazias, o que possibilitaria a emissão de alvarás de construção. Em alguns parcelamentos, os compradores chegam a gastar R$ 400 mil para a elaboração dos projetos de legalização. Mas essas regiões nem estão incluídas na lista de áreas de regularização do Plano Diretor de Ordenamento Territorial (Pdot). ;Comprar um lote desses é o mesmo que negociar um terreno na Lua: não tem validade nenhuma. Tudo será licitado pelo governo no futuro;, resume o diretor técnico da Terracap, Luís Antônio Reis.

Mas os alertas do governo não desanimam quem compra ou mantém terrenos em condomínios não implantados localizados em área pública. A aposta na regularização é alta. Taxas mensais de condomínio, boletos de IPTU e honorários de advogados são alguns dos gastos de quem adquiriu um terreno no Privê Morada Sul Etapa C, próximo ao Lago Sul.

Os lotes do parcelamento foram demarcados e cercados irregularmente há mais de 10 anos, mas a área ainda está vazia. Os compradores do Etapa C enfrentam a ameaça de perder os terrenos em uma licitação, já que parte da área é pública. Sem uma definição do governo sobre o destino desses terrenos, o comércio ilegal nos loteamentos continua.

Liminar
No Privê Morada Sul Etapa C, os condôminos investem pesado na perspectiva da regularização. A taxa mensal de manutenção é de R$ 99 e o IPTU deste ano custou R$ 800. Só com esses dois gastos, cada pessoa tem que tirar pelo menos R$ 2 mil do bolso todos os anos na expectativa de ocupar a área. Somam-se a esses custos os investimentos em estudos de regularização. Os projetos urbanísticos e de infraestrutura custaram R$ 400 mil à administração. O parcelamento tem cercas, postes e guaritas, e uma liminar judicial impede que o GDF faça a demolição dessa estrutura.

O síndico do Privê Morada Sul Etapa C, Ivan Zelaia de Carvalho, diz que os condôminos acreditam na possibilidade de uma venda direta aos compradores. ;Respeitamos a lei e a determinação do governo e nunca construímos. Não seria justo que o GDF nos punisse agora, incluindo os lotes em uma licitação;, reclama Ivan. ;Acredito no bom senso. As pessoas aqui investiram alto no processo de regularização. Ninguém pode nem ouvir falar em licitação, estamos aqui há 10 anos;, acrescenta o síndico.

Mas o diretor técnico da Terracap afirma que nenhum argumento será acatado. ;Antiguidade não é garantia de legalidade. E o que eles gastam com estudos de regularização também é dinheiro jogado fora. Em área da Terracap, quem faz os projetos de legalização ou para novos parcelamentos é a própria empresa;, explica Reis.

Pelo Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) 2/2007 (leia quadro), firmado entre o governador José Roberto Arruda e representantes do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT), nenhum terreno vazio ou ocupado para fins comerciais pode ser vendido diretamente aos compradores. Qualquer alienação deve ocorrer mediante licitação pública, sem direito de preferência.

O promotor Libânio Rodrigues, assessor de Políticas Institucionais do MPDFT, é enfático: ;Quem comprou lotes vazios em áreas públicas certamente vai perder o dinheiro;. Ele lembra que a cobrança do IPTU não significa que o comprador terá direito ao lote. ;O TAC é bem claro, a venda direta só é aplicada nos casos em que o lote é usado para fins de moradia. Essas promessas falsas são um engodo;, diz.

No caso de áreas vazias de propriedade particular, os lotes podem ser vendidos. Mas o trâmite não passa pela regularização. É preciso elaborar um projeto de novo parcelamento e apresentá-lo à Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente, responsável por analisar a viabilidade do futuro empreendimento. Se o loteamento for aprovado e estiver registrado em cartório, o proprietário pode negociá-lo.

Desapropriação
No Condomínio Pousada das Andorinhas, no Lago Sul, os gastos com a perspectiva de regularização também são altos. A área onde se pretende construir o parcelamento é nobre. Vendem-se os terrenos como se pertencessem à

QI 31 do Lago Sul. Os compradores pagam taxa mensal de R$ 50. A área é classificada como desapropriada em comum, ou seja, parte dela é pública e parte é particular. Mas não há definições precisas sobre tais limites.

A área já se tornou motivo de disputa judicial porque, há cerca de cinco anos, supostos empreendedores venderam o mesmo lote para mais de uma pessoa. Pelo menos 1,1 mil terrenos na área foram negociados. Mas hoje, o cadastro da administração tem apenas 900 pessoas. ;Recolhemos taxa extra para indenizar quem comprou lote que não existia. Todo nosso empenho é para conseguir construir no condomínio. Seguimos à risca todas as determinações do governo e, até agora, não construímos nada;, destaca o síndico do Pousada das Andorinhas, Herivelto Luiz Corrêa.

Essa é a mesma situação do Estância Quintas da Alvorada, área vazia de propriedade da Terracap, ao lado do Ville de Montagne. Mesmo situado em terras públicas, o parcelamento está cercado e é vendido por terceiros, que contam com a regularização da área para tentar construir legalmente. ;Isso não passa de grilagem. Nada será legalizado, isso é terra pública, tem que passar por licitação;, orienta o diretor da Terracap Luís Antônio Reis.

A presidente da União dos Condomínios Horizontais, Júnia Bittencourt, reclama do fato de o governo cobrar IPTU de áreas que não teriam perspectiva de regularização. Ela pede que a Terracap defina logo o problema das áreas desapropriadas em comum. ;O governo tem que definir essas poligonais para tranquilizar quem comprou em condomínios não implantados;, destaca.

Sem eficácia
O Imposto Predial e Territorial Urbano cobrado em condomínios irregulares não representa garantia de legalização ou de participação na venda direta. Imóveis vazios e comerciais nesses lugares são tributados, mas o carnê não pode ser usado para comprovar a legalidade da área.

O que diz o TAC 2/2007
Os imóveis ocupados irregularmente até 1; de janeiro de 2007 podem ser vendidos diretamente aos ocupantes.

A venda direta só vale para os terrenos usados para fins de moradia.
Lotes comerciais e vazios têm que ser licitados. Os antigos compradores não têm direito de preferência.

Só pode participar da venda direta quem não tem outros imóveis urbanos residenciais no Distrito Federal.
Cada pessoa só pode comprar um único lote na venda direta.

O preço dos lotes para fins de venda direta é calculado com base no valor de mercado, abatido desse preço os investimentos feitos pelos moradores em infraestrutura.

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