Rodolfo Borges
postado em 07/08/2009 08:00
Combater o fogo com inteligência. Essa é a meta do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal (CBMDF) ao apostar em pesquisa, tecnologia e aprimoramento de pessoal. Neste mês, os bombeiros do DF completam o primeiro ano de um treinamento pioneiro no Brasil voltado ao controle do fogo em locais fechados. Nesse período, mais de 200 oficiais aprenderam a importância de combater a fumaça durante um incêndio em residência ou escritório. A meta é formar toda a corporação.Em vez de simular incêndios em estruturas de alvenaria, como se costuma fazer Brasil afora, os oficiais adotaram contêineres marítimos, com menos gasto de água, graças a uma tecnologia desenvolvida há 15 anos na Suécia. ;O contribuinte já é lesado quando seus bens pegam fogo. Desperdiçar água tentando apagar o incêndio não faz sentido;, diz o sargento Marcos Lino de Almeida, um dos instrutores do curso.
Os contêineres fazem as vezes de cômodos, como sala, quarto ou escritório. Além de ser mais barato e resistente do que estruturas de alvenaria adaptadas para o treinamento, o contêiner é modular, ou seja, pode ser montado de diversas formas. ;É possível até empilhá-los, simulando andares, e, se uma de suas partes se desgastar, podemos trocá-la por outra;, explica a tenente Karla Marina Gomes Pereira, que foi à Bélgica estudar a tecnologia.
Até agosto do ano passado, os bombeiros realizavam seus treinos em uma casa localizada na academia da corporação. Apesar das adaptações por que tinha passado, o cômodo já estava cheio de rachaduras, provocadas pelo calor do fogo constante a que era exposto. ;Os contêineres são mais resistentes. Os belgas já usaram uma mesma caixa mais de 300 vezes e ela continua como nova. O nosso já passou por 150 queimas e ainda não mostrou desgaste;, conta a capitão Helen Ramalho de Oliveira Landim.
Um contêiner como o utilizado pelos bombeiros do DF tem valor aproximado de R$ 6 mil e nem precisa ser novo, mas os custos do treinamento são altos. Cada queima, como o procedimento é chamado, não sai por menos de R$ 500. ;Só um capacete custa R$ 1,8 mil e ele precisa ser trocado periodicamente;, diz Helen. O CBMDF só conseguiu pleitear a tecnologia graças a um convênio com o Ministério da Ciência e Tecnologia, que lhe reservou R$ 1 milhão para pesquisa e desenvolvimento tecnológico.
Antes de entrar na caixa e combater o fogo que foi ateado pelos instrutores, os bombeiros que passam pelo treinamento exercitam todo o procedimento do lado de fora. São apenas seis em cada treinamento, e acompanhados por três instrutores. Entre outras coisas, eles aprendem a combater a fumaça, que também pega fogo. ;Num incêndio dentro de residência, não adianta combater apenas seu foco. A fumaça que se propaga carrega partículas que só entrarão em combustão em contato com o ar;, explica o capitão George Cajaty Barbosa Braga.
[SAIBAMAIS]Por isso, os bombeiros aprendem a se defender da fumaça, fazendo uma espécie de guarda-chuva com a água da mangueira no caso de se encontrarem encurralados. Eles são instruídos a entrar de joelhos no cômodo onde se propagam as chamas e devem combater a fumaça antes de tudo, com jatos pulverizados. Na hora de exterminar o foco de incêndio, a dica é usar jatos de água espassados. ;Jatos contínuos servem apenas para desperdiçar água;, diz o capitão George.
;É difícil, para eles, esquecer o processo antigo;, reconhece o soldado Admilson Queiroz de Sousa. Mas os aprendizes atestam o valor da novidade. ;É um treinamento difícil, mas muito bom. Vou repassar o conhecimento para meus colegas de batalhão;, garantiu o soldado Helton Pereira de Souza, do 1; Batalhão de Incêndio, depois do treinamento, que começou na manhã da sexta-feira passada, com uma aula teórica, e só terminou às 17h30 daquele dia, com a prática no contêiner.
Câmera térmica
Uma câmera térmica passará a fazer parte das missões mais importantes a partir deste mês. Ela é capaz de apontar a temperatura dos objetos envolvidos em um incêndio. Durante o treinamento da sexta-feira passada, o foco do incêndio, por exemplo, apresentava 900;C de temperatura. A fumaça estava em 600;C e o lado de fora do capacete dos bombeiros chegou a 120;C.
Por acaso
Depois de um acidente que vitimou bombeiros suecos durante o combate a um incêndio, colegas de corporação resolveram simular as mesmas condições da ocorrência para descobrir o que aconteceu de errado. Para tanto, os bombeiros se valeram do material mais barato que tinham à mão, um contêiner marítimo, que acabou se mostrando um dispositivo muito resistente ao fogo.
Adaptações
Os contêineres passam por poucas mudanças antes de começarem a abrigar incêndios. Eles recebem janelas e portas, para simular salas, e o chão do lugar onde acontece a queima de combustível sólido é coberto por tijolos refratários. O resto, inclusive o piso de madeira, é o mesmo utilizado para transporte de cargas em navios.
; Especialistas sem equipamento
No 3; Batalhão de Busca e Salvamento do Corpo de Bombeiros Militar do DF, os oficiais também se especializam para aumentar a eficiência no combate ao fogo, mas em florestas. O pessoal da aviação operacional já está pronto para pilotar aeronaves capazes de combater incêndios na mata, apesar de ainda não ter recebido um avião desse tipo. ;A chegada do Air Tractor 802F ainda depende de questões políticas, mas isso não nos impediu de fazer a preparação;, diz o capitão Wallace Brandão.
Apenas o Rio de Janeiro, segundo Wallace, tem um avião de combate a incêndio no Brasil, mas seus bombeiros utilizam o veículo desde 2003 sem ter se preparado para tanto. O tempo de formação de um piloto é longo, podendo levar até cinco anos, e a corporação carioca não se antecipou à chegada do equipamento. Já o CBMDF tem 12 pilotos, e três deles estão habilitados para voar em qualquer aeronave.
R$ 1,7 milhão
O Air Tractor 802F tem capacidade para 3,1 mil litros de água e é mais rápido do que os dois Cessna 210 Centurion II atualmente usados pelos bombeiros do DF. O Air Tractor custa R$ 1,7 milhão, mas vale cada centavo, segundo os pilotos do Corpo de Bombeiros. ;Brasília passa por seis meses de seca todo ano e uma aeronave como essa aumenta em até 70% nossa efetividade no combate a um incêndio florestal;, garante o capitão Wallace.
Um avião desses pode ser utilizado para diminuir as chamas do incêndio, permitindo a aproximação dos bombeiros em solo. ;Se realizarmos esse procedimento de forma mais rápida, poupamos vidas de animais silvestres e vegetação e ainda prevenimos o sequestro de carbono;, defende o capitão Helon Florindo.
Atualmente, os dois aviões do CBMDF são utilizados apenas para monitoramento ambiental. Quase todo dia, as aeronaves deixam o solo para um sobrevoo de uma hora por todo o DF. Quando um foco de incêndio é identificado, os pilotos avisam o pessoal de terra.
As áreas mais propensas a sofrer com incêndios florestais no Distrito Federal estão localizadas no Parque Nacional de Águas Emendadas e no Parque Nacional de Brasília, que engloba a Água Mineral. Toda área rural, contudo, está sujeita a queimadas, principalmente durante os meses de estiagem, que costuma se intensificar em julho e agosto.