Cidades

Mortalidades materna e infantil aumentam no DF

Rodolfo Borges
postado em 17/08/2009 08:10
O número de gestantes e crianças que morreram durante ou pouco depois da gravidez subiu no último ano, segundo dados da Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF). O coeficiente de mortalidade materna(1) subiu de 39, em 2007, para 52,2 em cada grupo de 100 mil nascidos em 2008, enquanto o de mortalidade infantil(2), que decrescia desde 2005, subiu de 11,1 para 11,8 por mil nascidos vivos no mesmo período. Entre os motivos da piora no quadro estão falhas no acompanhamento pré-natal, mas a SES atribui o aumento nos índices ao crescimento da demanda de moradores do Entorno nos centros de saúde do DF. Ainda assim, a média local é menor do que a nacional.

[SAIBAMAIS]No ano passado, morreram 23 gestantes durante, antes ou pouco após o parto, seis a mais do que em 2007, segundo os dados da SES consolidados no fim do mês passado. A quantidade de partos realizados pela rede pública, contudo, diminuiu de 40.983 para 40.554. Desde 2002 ; ano do cadastro mais antigo da SES ;, esse é o número mais alto de óbitos em um único ano. A região com a maior quantidade de registros é Ceilândia ; a cidades mais populosa do DF. Lá, morreram oito gestantes em decorrência de complicações da gravidez em 2008 ; três a mais do que no ano anterior.

De acordo com o último relatório do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) sobre os gastos do governo, aprovado no início do mês, foram desembolsados R$ 670 mil pelo Programa de Assistência Integral Materno-infantil no ano passado ; apenas 36% da dotação final autorizada para o período. O valor é 55,8% inferior ao investido ao longo de 2007, segundo o documento do TCDF.

Déa Carvalho, que responde pela Subsecretaria de Planejamento, Regulação, Avaliação e Controle (Suprac) da SES, explica que a maior parte dos gastos reservados para atenção materno-intantil não entra na rubrica do programa mencionado pelo relatório do TCDF. Além disso, segundo ela, houve alterações nas competências do programa de 2007 para 2008. ;O item de complementação nutricional, responsável pela compra de leite, passou para outra rubrica, o que diminui o gasto do programa. Mas o leite continuou a ser fornecido;, garante Déa.

O gasto com medicamentos e equipamentos na área, por exemplo, se insere em outras rubricas. ;No orçamento do programa, entram cursos de capacitação para profissionais da rede e qualquer tipo de equipamento para novas práticas, entre outras coisas;, diz. É exatamente a falta de capacitação que o coordenador de Ginecologia e Obstetrícia da SES, Avelar de Holanda Barbosa, aponta como fator para o crescimento da mortalidade materna.

;Temos um sistema de saúde que, fisicamente, é o melhor do país. Os centros de saúde e hospitais do DF estão bem localizados e temos os melhores recursos, mas não o melhor serviço, por problemas de gerenciamento;, admite Barbosa. Segundo o coordenador, a rede pública do DF apresenta deficiências de pessoal e enfrenta dificuldade para atender a demanda local.

Demanda que, para o secretário adjunto de Saúde, Florêncio Cavalcante, é intensificada por gestantes provenientes do Entorno, que interferem no coeficiente do DF. ;Os hospitais de Brasília são referência em atendimento materno. Por isso, recebemos gestantes de Águas Lindas, Santo Antônio do Descoberto e Unaí;, alega. Segundo a SES, essas pacientes costumam chegar ao momento do parto sem passar pelo pré-natal, o que favorece complicações na gravidez.

Indicador
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o índice de mortalidade materna é o indicador mais preciso para dizer se um serviço dá boa assistência à mulher, lembra Avelar Barbosa. ;Se os serviços de assistência primária, secundária e terciária não melhorarem, o índice de morte materna não vai melhorar;, completa, acrescentando que 98% dos casos de morte materna são evitáveis. ;Basta que o acompanhamento pré-natal seja bem-feito;, resume o médico.

A professora Maria Isabel Fortes da Silva, 37, é vítima das deficiências do serviço no DF. Grávida de quatro meses, Maria Isabel precisou pagar pelos próprios exames em um laboratório particular. ;Eu não poderia esperar três meses pelo resultado, por causa de complicações na gestação;, conta a professora, que pagou cerca de R$ 330 por exames de hepatite B e C, glicemia, toxoplasmose e sífilis, além do hemograma, que ficaram prontos em apenas uma semana.

Para Maria Isabel, não adianta fazer os exames no centro de saúde. ;Eles só são entregues quando a mulher está para parir;, critica a professora, que mora e se consulta em São Sebastião. Empregada doméstica, Ana Dalva Vilar, 31, só precisou se consultar uma vez no centro de saúde de São Sebastião para perceber que a situação é complicada. ;Como estou grávida de gêmeos, meu parto é considerado de risco desde o início. Por isso, fui transferida para o Hospital Regional da Asa Sul, onde nunca tive problema com atendimento;, conta.


1 - Média nacional
O coeficiente considera óbitos de gestantes durante a gravidez ou até 42 dias após o parto. No Brasil, a média gira em torno dos 50 casos por 100 mil nascidos vivos, proporção considerada alta e que não representa todos os casos devido à subnotificação. Em países desenvolvidos, o índice não passa 10 por 100 mil e contempla apenas registros de morte inevitáveis.


2 - Filhos
O coeficiente de mortalidade infantil leva em conta as mortes de crianças até 28 dias. Apesar de ter aumentado de 2007 para 2008, o índice do DF está bem abaixo da média nacional de 23 por mil nascidos vivos. Em alguns estados do Nordeste, essa taxa chega a 40. Em regiões mais desenvolvidas, contudo, o índice varia de 6 a 8 por mil nascidos vivos.

PALAVRA DO ESPECIALISTA
Índice ;dentro do aceitável;

O aumento do indicador de mortalidade infantil de 2007 para 2008 no Distrito Federal é considerado pequeno pelos especialistas. Para o epidemiologista Pedro Tauil, da Universidade de Brasília (UnB), a taxa do DF está dentro do aceitável e, no Brasil, se comparada apenas à de estados como Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

O professor universitário explica que, ao contrário da mortalidade materna, o óbito de crianças durante ou pouco depois da gestação não é prevenível com tanta facilidade. ;O combate à mortalidade infantil depende de um bom pré-natal, mas doenças do ambiente externo, como as respiratórias ou a diarreia, também influenciam nessa conta;, diz Tauil.

Pediatra e neonatologista do Hospital Universitário de Brasília (HUB), José Alfredo Lacerda de Jesus confirma a importância do pré-natal, mas alerta para outro problema. ;Em alguns lugares, não existe ligação entre a assistência pré-natal e o parto. A mãe faz o pré-natal em um centro de saúde e não tem a garantia de ser assistida no hospital da mesma região;, analisa o pediatra, que lamenta que o parto humanizado ainda não tenha sido implantado no DF.

Há apenas uma instituição pública que trabalha com parto humanizado na capital. Para o secretário adjunto Florêncio Cavalcante, a Casa de Parto de São Sebastião vem desempenhando um bom papel, mas não há previsão de quando o serviço será estendido para todo o DF. ;Algumas pessoas acham que casa de parto tem de ter um obstetra, o que dificulta a ampliação do sistema;, explica, acrescentando que a ideia é fortalecer o centro de São Sebastião para, depois, expandir o parto humanizado.


ESTATÍSTICAS

Coeficiente de mortalidade infantil no DF (por mil nascidos vivos)

2005 - 13,7

2006 - 12,8

2007 - 11,1

2008 - 11,8

Coeficiente de mortalidade materna no DF (por 100 mil nascidos vivos)

2005 - 30,5

2006 - 46,7

2007 - 39

2008 - 52,2

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