Cidades

O fim de Coração Gelado, adolescente que aterrorizava Santa Maria

postado em 17/08/2009 08:52
Era para ser mais um dos inúmeros assaltos de Coração Gelado, 16 anos. ;Bora, bora. Passa o dinheiro que desta vez não vai ser como antes. Se não tiver dinheiro vou mandar bala;, dizia o rapaz repetidamente à cobradora. Ontem, ele fez a última ameaça. Morreu com o dinheiro do roubo na mão após ser atingido por um tiro na cabeça, vindo do fundo do micro-ônibus que fazia a linha 0.020, trajeto Santa Maria/Gama Leste e Oeste. O autor do disparo foi um policial civil do Departamento de Operações Especiais (DOE), com mais de 15 anos de experiência. Ele estava de folga e com o filho pequeno no colo. Disparou antes de o adolescente cumprir as ameaças.

A ação frustrada do assaltante aconteceu por volta das 13h de ontem, na QR 404/304 da avenida principal de Santa Maria. Testemunhas contaram à polícia que o rapaz não estava sozinho. Entrou com pelo menos dois comparsas, que correram ao ver o colega morto. Ao ouvir o barulho do disparo, uma cobradora que estava como passageira no banco de trás do motorista, se preocupou apenas em abraçar a filha de 14 anos. ;Ele caiu morto nos meus pés. Fiquei muito nervosa e minha filha começou a tremer;, contou a testemunha.

[SAIBAMAIS]A morte de Coração Gelado provocou alvoroço no bairro. Moradores não quiseram comentar o assunto e o micro-ônibus foi cercado por policiais do DOE, armados com metralhadoras e fuzis. Amigos do assaltante rondavam o local de bicicleta e perguntavam quem era o responsável pela tragédia. ;A mãe dele sofria muito por causa disso. Ele era chamado de Coração Gelado porque já matou três pessoas;, disse uma senhora de 62 anos, que conhecia o rapaz. Segundo o delegado-chefe da 33; DP (Santa Maria), Watson Warmiling, o adolescente era conhecido por cometer roubos a coletivos. O delegado suspeita que foi ele quem assaltou outro micro-ônibus, no mesmo local, uma hora e meia antes de morrer.

Testemunhas disseram que o coletivo estava lotado, com passageiros sentados e em pé, o que levou as testemunhas a questionarem se o policial arriscou a vida de quem usava o transporte. ;Vai que ele erra o tiro. Poderia ter colocado em risco a vida de alguém;, disse uma delas, sem se identificar. Entretanto, a atitude do policial em sacar a arma foi aplaudida pelos colegas, uma vez que nenhum usuário se feriu. ;O policial agiu com grande destreza e se reagiu foi porque era absolutamente necessário;, elogiou Warmiling. O episódio trouxe medo à população de Santa Maria. ;Quando entro no microônibus já olho para os lados porque os assaltos acontecem sempre por aqui;, disse o vigilante Benedito Pereira.

A história de Coração Gelado foi contada pelo Correio em 13 de novembro do ano passado. Ele se encontrava foragido desde o dia 3 de agosto deste ano de uma casa abrigo no Gama, onde estava em semi liberdade. O próximo passo será localizar os outros envolvidos nos assaltos da região. Ainda de acordo com o delegado, o número de roubos a coletivos caiu 80% este ano em relação à 2008.

PERFIL
Uma arma no lugar de livros

Em vez de livros e cadernos, o menino que ganhou o apelido de Coração Gelado, pela frieza com que cometia seus delitos, carregava debaixo da camisa uma arma. Foram cinco passagens pelo Centro de Atendimento Juvenil Especializado (Caje). Em uma delas, matou e deixou a faca enterrada no pescoço da vítima. O corpo mirrado e a simplicidade com que chorava quando era chamado para ouvir bronca na diretoria do Centro de Ensino Fundamental 308 de Santa Maria, onde estava matriculado na 5; série, deixava dúvida nas pessoas. Mas ao ouvir comentários sobre a rotina de crimes praticada pela gangue dele logo entendiam o porquê da fama: Coração Gelado era temido por onde andava. Até pelos parceiros. Assim como ocorreu com outros jovens que integraram o mundo do crime muito cedo, a saga de Coração Gelado terminou precocemente.


MEMÓRIA
Coletivos sob risco

14 de julho de 2009
Um homem matou a tiros o motorista de ônibus Ricardo Henrique Leite, 25 anos, na Quadra 4 do Setor Sul do Gama, em frente a um movimentado comércio. Na ocasião, os companheiros de trabalho protestaram para pedir mais segurança. Duas semanas antes do atentado, a vítima avisara à polícia que havia pessoas armadas dentro de seu veículo. Os policiais, porém, deixaram um dos criminosos fugir. Há suspeitas de que os mesmos bandidos tenham assassinado o trabalhador.

10 de outubro de 2008
O cobrador da Viação Viva Brasília Gaspar Joaquim dos Santos Silva, 38 anos, morreu em uma noite de quinta-feira, durante o expediente. Foi assassinado por um homem de aproximadamente 25 anos, que pegou a linha 501.3, trajeto Eixo Norte e Sul-Sobradinho II, na Rodoviária do Plano Piloto. A polícia confirmou que o cobrador foi vítima de latrocínio ; roubo seguido de morte ; e divulgou o retrato falado do criminoso. Desesperada, a família pedia justiça. De janeiro a junho de 2008, o número de roubos a coletivos no DF aumentou 45%, se comparado ao mesmo período do ano passado.

Colaboraram Ary Filgueira e Leilane Menezes

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