Rodolfo Borges
postado em 02/09/2009 07:50
Um dia depois da descoberta dos corpos de três moradores do Bloco C da 113 Sul, os vizinhos do advogado José Guilherme Villela acordaram muito preocupados com a segurança do prédio. O sistema de câmeras do condomínio é antigo e, por isso, serve apenas para que os porteiros façam o monitoramento de quem entra e sai do prédio. "De que adianta um sistema de câmeras de segurança que não grava?", questionava-se a advogada Débora Cristina Souza, que mora no bloco há dois anos e se disse assustada e chocada com o que aconteceu.
Para os moradores, será inevitável abordar o tema segurança no condomínio durante os próximos dias. Eles haviam agendado uma reunião para discutir a reforma do prédio de 36 apartamentos na noite de ontem, mas o triplo homicídio do 6º andar (leia cronologia) estava na ordem do dia desde a noite anterior. "O sistema de vigilância vai ter que passar por mudanças", considerou uma advogada que mora no prédio e preferiu não se identificar.
Segundo os vizinhos, algumas vezes, as portas de vidro das três prumadas do prédio não trancam automaticamente. E à noite, apenas um porteiro acompanha quem entra e sai, o que, para alguns, reforça o clima de insegurança. Apesar das falhas apontadas, um dos moradores entrevistados pela reportagem considera a segurança do prédio boa. "Moro aqui há seis anos e nunca houve problemas. Esse foi um caso pontual. Não acho que seja necessário reforçar a segurança", disse, pedindo para não expor o próprio nome. O morador considera mais grave que o estacionamento em frente ao prédio seja frequentado por usuários de droga. "Já informamos às autoridades sobre o problema, mas nada foi feito", reclamou.[SAIBAMAIS]
Polícia e curiosos
Os agentes de investigação da polícia circularam em volta do Bloco C das 10h às 12h de ontem e, além de conversar com os moradores do próprio prédio e de edifícios vizinhos, checaram o conteúdo de vídeos feitos pelas câmeras de segurança do Bloco E em busca de imagens que contribuíssem para solucionar o caso. A perícia nos carros das vítimas (um Passat importado e um Corsa Sedan) foi realizada na manhã de ontem, mas os veículos continuam na garagem do prédio.
Curiosos, alguns moradores procuravam novidades por meio da imprensa, que circulava por baixo do Bloco C à espera de informações. "Só pode ter sido queima de arquivo", opinou a advogada Ignácia Rocha de Fonseca, 67, depois de perguntar se o crime já tinha sido desvendado. Moradora do Bloco J da 113 Sul, Ignácia se incomodou por um crime tão bárbaro ter acontecido próximo a sua casa, mas disse não se sentir insegura na quadra. "Passeio com meu cachorro às 23h, às vezes às 2h. A região é tranquila", garantiu.
Villela e a mulher eram tidos pelos vizinhos como um casal discreto. Segundo a engenheira Sabrina Soares, 30 anos, eles não falavam com quase ninguém no prédio. "Eram muito reservados", contou a moça, cujos pais moram no Bloco C.
O advogado trabalhava apenas em seu escritório, que fica no Setor Comercial Sul. A empresa Villela Advogados Associados ocupada todo o 14º andar do Edifício Denasa. Não houve expediente ontem - apenas um funcionário esteve no local. Na portaria, a ordem deixada pela família do casal era para não deixar ninguém subir.
» Francisca era muito apegada à família
Ary Filgueira
A empregada Francisca Nascimento da Silva, 58 anos, não tinha o costume de passar o fim de semana longe da família. Ela trabalhava de segunda-feira a sábado no apartamento dos Villela, na 113 Sul. Quando saía, às 12h, ia direto para casa, em Santa Maria, onde morava com duas irmãs mais novas. Por volta das 16h do último sábado, familiares estranharam a demora da vítima e iniciaram uma busca pelo telefone. Ligaram até para amigos distantes, em Damianópolis (GO), onde ela costumava ir nas folgas do trabalho. Mas ninguém soube dizer o paradeiro de Francisca. Somente dois dias depois é que descobriram que ela estava morta.
"É muita brutalidade. Não sei como alguém pode fazer isso com um ser humano", lamentava, inconformado, o sobrinho da empregada Ricardo Eustáquio Peres, 52. Técnico em manutenção de elevador, ele viajou de Belo Horizonte (MG) para ajudar no enterro dela no Distrito Federal. Com lágrimas nos olhos, Ricardo recorda da visita inesperada que Francisca fez no dia do aniversário dele. "Em abril de 2007, ela juntou a família e chegou em minha casa. Eu sou um privilegiado por ter convivido com Francisca", destacou.
Na sexta-feira passada, um dia antes de morrer, Francisca ligou para a irmã mais nova, Maria Nascimento Silva, com quem morava na QR 313 de Santa Maria. Foi o último contato dela com um familiar. As duas eram confidentes e costumavam conversar todos os dias ao telefone. Até aquele momento, segundo Maria, não havia nada de diferente com Francisca. "Ela parecia bem calma. Fez as recomendações que sempre fazia, como, por exemplo, abrir as janelas para a casa estar arejada quando ela chegasse", lembra.
Segundo os funcionários do Bloco E, a empregada da família Villela costumava sair toda manhã, por volta das 7h30, para ir ao mercado. Aquela que deve ser a última gravação em vídeo de Francisca foi feita às 7h38 da última quarta-feira por uma câmera de segurança do prédio, quando ela voltava das compras.
Francisca estudou apenas até a quarta série do ensino fundamental. Apesar da pouca escolaridade, a empregada doméstica tinha avidez em conhecer a cultura brasileira. Todo ano, ela viajava duas vezes. A cearense planejava conhecer o Maranhão. Estava juntando dinheiro para comprar as passagens. "Ela não tinha filhos nem namorado. Gostava apenas de viver", descreve um parente, que não quis se identificar.
O corpo de Francisca não havia sido liberado do IML até ontem à noite. O enterro dela deve ocorrer somente hoje. Familiares discutem a possibilidade de o sepultamento ser no Cemitério de Taguatinga, cidade onde parentes da vítima moram.
» Cronologia
» Quarta-feira, às 7h38
A imagem da empregada Francisca Nascimento da Silva é captada por uma câmera do Bloco E da 113 Sul. A mulher se dirigia a um mercado nas proximidades, como costumava fazer várias vezes por semana.
» Quinta-feira, às 21h45
Maria Carvalho Mendes Villela é deixada em casa por uma amiga. Todas as quintas-feiras, ela tinha o hábito de sair com um grupo de colegas para uma happy-hour.
» Sexta-feira, às 14h
José Guilherme Villela não vai para o escritório dele, no Setor Comercial Sul. A mulher, sócia na firma de advocacia, também não comparece ao local.
» Sexta-feira, às 16h
Francisca telefona para a irmã mais nova, Maria, lembrando-lhe de arejar a casa da família em Santa Maria e passando outras recomendações.
» Sábado, às 16h
Como Francisca não aparece em casa (ela costumava deixar o apartamento dos patrões sempre aos sábados por volta das 12h), as irmãs começam a procurá-la. Ligam para o imóvel da 113 Sul, onde ninguém atende, e para outros familiares. Acabam pensando que Francisca viajara.
» Segunda-feira, às 14h
Nem Guilherme Villela nem a mulher dele comparecem ao escritório.
» Segunda-feira, às 20h
Depois de telefonar várias vezes para o apartamento dos avós, a neta Carol, acompanhada de um policial federal amigo da família, vai ao apartamento da 113 Sul. Ela pede para o porteiro abrir a porta. Como ele não tem a chave, um chaveiro é chamado.
» Segunda-feira, às 20h30
A neta consegue entrar no apartamento e encontra os corpos dos avós e da empregada. Ela e o policial federal acionam a polícia, que constata o triplo homicídio por esfaqueamento. A perícia estima a hora da morte entre as 17h e as 19h da sexta-feira.