A solução do triplo homicídio na 113 Sul é um desafio. A investigação é dificultada pelas circunstâncias misteriosas em que o crime ocorreu. Não houve flagrante. Os corpos foram encontrados em 31 de agosto, três dias após as mortes, segundo a primeira perícia feita no apartamento 601/602 do Bloco C. As portas não foram arrombadas. Apesar da brutalidade dos assassinos, até agora os policiais não encontraram ninguém que tenha ouvido qualquer barulho suspeito ou pedidos de socorro. Embora houvesse dinheiro e cheque no apartamento, somente joias de Maria Villela desapareceram.
Mesmo diante dessas dificuldades, o advogado Raul Livino, conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF) e professor de direito penal, acredita que a tecnologia vai ajudar a elucidar o crime. ;O laudo fala. Com ele, é possível desvendar um crime sem confissão ou testemunha. E a confissão ainda pode ser retratada, ou seja, a pessoa confessa e volta atrás depois. O laudo não.;
Com a ajuda de Livino e do presidente do Sindicato dos Delegados do DF, Mauro Cezar Lima, o Correio preparou um tira-dúvidas sobre as possibilidades de atuação da polícia no desenrolar da apuração. Para Lima, mais importante do que apresentar um suspeito é fundamentar o pedido de prisão. ;É preciso reunir elementos fortes. Não adianta pedir a prisão sem base legal, pois há casos em que a autoridade policial se antecipa e a pessoa prova a inocência na Justiça;, destaca.
; Tira-dúvidas
1- Como é feita a prisão de um suspeito ou autor de crime quando não há flagrante?
A autoridade policial apresenta pedido de prisão ; temporária ou preventiva ; para o juiz. Antes de julgar o pedido, o magistrado encaminha os autos para o Ministério Público. Esse se manifesta dizendo se acata ou não a solicitação da polícia e devolve os autos para o juiz, que decide pela prisão ou não. Todo esse processo pode acontecer no mesmo dia.
2- O que caracteriza um flagrante?
Existem vários tipos. O flagrante direto é quando a polícia chega no momento em que o autor está cometendo o crime. O flagrante indireto ocorre quando a polícia encontra a pessoa com a arma do crime ou quando o criminoso foge e é perseguido.
3- Para o autor escapar do flagrante, quanto tempo é preciso se passar depois do crime?
O flagrante perdura até que a perseguição policial tenha se encerrado. Existe o senso comum de que o criminoso está livre do flagrante em 24 ou 48 horas após o fato. Mas isso não procede, pois não está escrito em lugar algum. Esse prazo surgiu da sensação de que após dois dias do crime, a polícia deixaria de fazer diligências, o que não é verdade. No caso do triplo homicídio da 113 Sul, não houve estado de flagrante, porque quando a polícia descobriu os corpos, no dia 31, não havia suspeitos. Quando houver prisões, apela-se para a preventiva ou a temporária.
4- Em que situação é pedida a prisão preventiva?
A prisão preventiva é pedida quando há indícios de autoria, certeza de que houve um crime, para garantir a ordem pública (e que a pessoa não cometerá outro crime), para a produção e a coleta de provas no processo (e evitar ameaça a testemunhas ou destruição de provas) e para garantir a aplicação da lei penal (quando há risco de fuga). Não existe um prazo fixado. Normalmente, dura 81 dias, período da instrução processual. Mas pode ser por mais tempo se houver justificativa.
5- E quando é pedida a prisão temporária?
A prisão temporária é pedida se há indícios de autoria e quando é imprescindível para a polícia concluir as investigações. No caso de crimes comuns, a temporária vale por cinco dias e pode ser renovada por igual período. No da 113 Sul, considera-se a hipótese de crime hediondo (de extremo potencial ofensivo). Nessa situação, a prisão temporária pode ser por 30 dias, renovada pelo mesmo tempo. E não há fiança.
6- Que tipo de prova dá subsídios a um pedido de prisão?
A coleta de provas segue algumas etapas. Começa com a suspeita, depois com a fundada suspeita (termo técnico que indica que alguma evidência já foi encontrada) e, por fim, os indícios de que alguém praticou ou participou do delito. Ter indício não significa ter certeza plena da autoria ou participação. Mas com indícios já é possível pedir a prisão. Por exemplo, se policiais encontram alguém portando uma arma compatível com a do crime que investigam e essa pessoa não possui álibi, trata-se de um forte indício contra ela.
7- Quando a equipe da 1; Delegacia de Polícia tiver um suspeito ou desvendar a autoria do crime, como será o passo a passo até que tal pessoa seja presa?
Ninguém pode ser preso a não ser em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, no caso o juiz. Na morte dos Villela e da empregada deles, o rito a ser seguido é o de prisão sem flagrante, ou seja, a polícia indicia o suspeito ou autor e apresenta o pedido de prisão ao juiz. Depois de analisado pelo MP, o magistrado acata ou não.
8- A prisão pode ocorrer a qualquer hora do dia ou noite?
O mandado de prisão só pode ser cumprido entre as 6h e as 18h. Se a autoridade policial conseguir o mandado à noite, tem de esperar o dia amanhecer para cumpri-lo. Fora desse período, a prisão só ocorre se ficar comprovado que o acusado vai fugir ou que pode ocorrer outro crime no local onde ela se encontra. Prisão em flagrante pode acontecer a qualquer hora.
9- Qual é o prazo para que a equipe da 1; DP elucide o crime?
O inquérito deve ser concluído em 30 dias. Se isso não ocorrer, a autoridade policial vai ao Judiciário e pede a prorrogação do prazo para concluir a investigação. Em tese, a solicitação pode ser feita inúmeras vezes. Mas, pela Norma Geral de Ação da Polícia Civil do Distrito Federal, qualquer tipo de crime não esclarecido em 30 dias seguiria para a delegacia especializada. No episódio do triplo assassinato da Asa Sul, o caso seria encaminhado para a Coordenação de Investigação de Crimes contra a Vida (Corvida). Na prática, porém, não há tanta rigidez no cumprimento de tal regra. Prevalece o bom senso ; por exemplo, se a delegacia circunscricional está prestes a esclarecer o caso, continua à frente da apuração.
10- Se o crime for solucionado, o criminoso irá a júri popular (julgamento pelos jurados) ou será submetido a júri singular (um juiz julga e fixa a punição)?
É muito prematuro para dizer. Se ficar caracterizado o crime latrocínio, ou seja, o criminoso matou para roubar, o caso é julgado pelo júri singular. Se ficar provado que o autor matou as três pessoas por qualquer outro motivo que não o roubo, o réu vai a júri popular.
; Se você tiver qualquer informação sobre o crime, ligue para o telefone 197