Rodolfo Borges
postado em 28/09/2009 09:04
A coordenadora da Central de Captação da Secretaria de Saúde do DF, Daniela Salomão, considera que apenas campanhas sobre o benefício da doação podem mudar o quadro de baixas autorizações familiares. A iniciativa mais recente nesse sentido é do Ministério da Saúde, que lançou no último fim de semana uma campanha para incentivar a doação de órgãos. Sob o slogan ;A vida é feita de conversas. Basta uma para salvar vidas;, as peças publicitárias falam sobre a importância de comunicar à família, ainda que apenas verbalmente, a decisão de se tornar doador.Enquanto aguarda os resultados da campanha, a Secretaria de Saúde investe em estrutura para aumentar a quantidade de transplantes efetivados. No fim do ano passado, a equipe da Central de Captação do DF, antes composta por apenas três pessoas, recebeu mais cinco membros. Agora, cinco enfermeiras e três médicos trabalham diariamente no cadastro e no acompanhamento dos casos de morte cerebral que vão surgindo nas redes pública e privada da cidade.
Um grupo de neurologistas também se reveza diariamente para auxiliar o trabalho da Central, que recebeu aparelhos de eletroencefalograma, entre outros, recentemente. Apesar de não ter superado a quantidade de transplantes do primeiro semestre do ano passado, a Secretaria de Saúde já bateu seu recorde de transplantes de coração, com quatro procedimentos em menos de um ano.
O estudante João Jones Bogea Ramos, 21 anos, foi um dos beneficiados pelas doações neste ano. Portador de ceratocone(1), o jovem passou pela primeira de duas cirurgias para transplante de córnea e, a cada ponto que tira do olho esquerdo, enxerga com mais clareza. ;Não vou precisar mais usar lentes de contato rígidas;, celebra João, que vai esperar na fila pela segunda córnea.
Em abril, a Central de Captação realizou um curso de capacitação sobre diagnóstico de morte encefálica com servidores da rede pública de saúde. ;É preciso treinar os olhos das equipes. Às vezes, é só lembrar que existe a possibilidade da doação de órgãos;, diz Daniela Salomão, que espera comprometimento das equipes de saúde e planeja novas intervenções até o fim do ano.
1- Afinamento
O ceratocone é caracterizado pelo afinamento progressivo da córnea ; daí a terminação ;cone;. O portador da doença vai perdendo acuidade visual à medida que a córnea se afina. Em 90% dos casos, ambos os olhos são afetados e 20% dos pacientes precisam passar por cirurgia para corrigir o problema.
É preciso treinar os olhos das equipes. Às vezes, é só lembrar que existe a possibilidade da doação de órgãos;
Daniela Salomão, coordenadora da Central de Captação de Órgãos no DF
Causas que são uma barreira
A maior causa de não efetivação da doação no DF no primeiro semestre foi a contraindicação médica. Dos 94 possíveis doadores, 46 (48,9%) apresentavam condições que impediram a doação, como uma infecção ativa, um coração infartado ou rins prejudicados por doenças crônicas. Além disso, seis vítimas de morte encefálica também sofreram paradas cardíacas, o que invibializa a manutenção dos órgãos, e, ao fim dos exames, uma das 94 mortes encefálicas não foi confirmada.
No primeiro semestre, a Central não perdeu nenhum doador por deficiências de infraestrutura, mas chegou perto. O paciente de morte encefálica é grave do ponto de vista de manutenção e, quando Maria Eduarda, 3 anos, filha de Antônio Bertoldo e Patrícia Carlos Neto, recebeu seu primeiro diagnóstico(1), não havia vaga disponível na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) da SES-DF.
Para que seus órgãos fossem preservados, como queria a família, os médicos da Pediatria do Hospital Regional da Asa Sul (Hras) se valeram dos aparelhos do pronto-socorro, mas a menina teria de ceder seu lugar caso chegasse uma criança em estado grave ao hospital. Na manhã do último dia 15, graças aos esforços do chefe da Pediatria do Hras, Filipe Lacerda, e ao plano de saúde da família, a menina foi transferida para o Hospital Brasília. (RB)
1- Histórico
A menina chegou ao hospital por volta das 16h do último dia 14 depois de desmaiar em casa. Com suspeita de tumor e meningite, Maria Eduarda passou por exames e seu quadro apresentou piora no início da noite, o que impossibilitou sua transferência para um hospital onde pudesse ser realizada uma tomografia. Até o fechamento dessa reportagem, a causa da morte da menina não havia sido diagnosticada.