Helena Mader
postado em 16/10/2009 08:43
O grande diferencial de viver em um condomínio horizontal é a segurança proporcionada pelas cercas e guaritas. Na maioria dos parcelamentos, o acesso é controlado por vigilantes, o vaivém de visitantes é registrado por câmeras e os muros impedem a entrada de pessoas estranhas. Apesar de comum, esse aparato é ilegal: não existe nenhuma legislação que autorize o fechamento de condomínios no Distrito Federal. Sem amparo jurídico para essa prática, o Ministério Público do Distrito Federal quer a remoção de todos os cercamentos e cancelas instalados nos parcelamentos da cidade. Os moradores temem a retirada dos muros e pedem pressa na elaboração de uma lei que permita a manutenção do sistema de segurança.O Termo de Ajustamento de Conduta(1) assinado em maio de 2007, conhecido como TAC dos Condomínios, abriu uma brecha para a manutenção dos cercamentos. O texto diz que é preciso manter os parcelamentos ;sem qualquer muro externo, guarita ou outros obstáculos não autorizados por lei;. Ou seja, se houver uma legislação específica sobre o assunto, o fechamento fica permitido. Sem isso, o MP tem a prerrogativa de cobrar as derrubadas.
Mesmo abrindo essa possibilidade de regularização, o Ministério Público se opõe à manutenção das cercas e cancelas. ;A necessária garantia de acesso às áreas públicas dos parcelamentos, ou seja, aos equipamentos públicos urbanos e comunitários e aos espaços livres de uso público, é incompatível com a manutenção ou construção de muros e guaritas;, diz um trecho do TAC dos condomínios.
A grande preocupação do Ministério Público é garantir o livre trânsito de pessoas em áreas públicas e assegurar que o tráfego de carros também não seja comprometido por conta do cercamento de espaços extensos. Os promotores já questionaram o fechamento de alguns condomínios por meio de ações civis públicas. É o caso do Villages Alvorada, que fica às margens do Lago Paranoá, na orla Sul. Desde 2004, já foram várias tentativas de derrubada da guarita, por ordem judicial.
O argumento do MP nesse caso é que as edificações estão em área pública e agridem o projeto urbanístico do Setor Dom Bosco e do próprio Lago Sul. Mas os moradores do Villages Alvorada conseguiram liminar que impediu a demolição da cancela e dos alambrados do parcelamento. Mas, desde então, a comunidade convive com a incerteza, já que a ação civil pública ainda tramita na Justiça e depende apenas de uma análise do mérito da questão. Fiscais do governo estiveram várias vezes no condomínio, algumas até mesmo com tratores para remover as construções.
Violência
O síndico do Villages Alvorada, Lauro Ferreira Júnior, diz que a expectativa dos moradores é pela aprovação de uma lei que regulamente a colocação de muros nos loteamentos. ;Já convivemos diversas vezes com a presença de tratores e funcionários do GDF ameaçando derrubar a nossa estrutura de segurança. Todos nós queremos que o condomínio permaneça fechado;, diz Lauro. ;A violência na cidade está crescendo rapidamente, não podemos ficar à mercê da segurança pública;, acrescenta o líder comunitário.
No Jardim Europa II, no Grande Colorado, os moradores também enfrentam uma ação judicial. Lá, a mobilização em favor do fechamento é grande. O síndico do condomínio, Carlos Henrique Dutra Cardoso, conta que a comunidade teme uma onda de crimes. ;O policiamento que existe na região não é suficiente;, comenta Carlos Henrique. ;Quem mora em condomínio está em busca justamente de maior segurança. Não queremos nem cogitar a possibilidade de derrubarem as cercas;, justifica o síndico do Jardim Europa II.
Mesmo fechados, os loteamentos registram cada vez mais casos de assaltos. No Solar de Athenas, por exemplo, já houve registro de famílias rendidas dentro da própria casa. No Lago Azul, também no Grande Colorado, bandidos quebraram os muros e furtaram duas casas no mês passado. ;Imagina se não tivéssemos os muros. Seria um caos;, garante a presidente da União dos Condomínios Horizontais e síndica do Lago Azul, Júnia Bittencourt. Ela está mobilizando a comunidade que vive em parcelamentos para cobrar do GDF a elaboração rápida de uma legislação específica.
Fora de discussão
Qualquer lei que disponha sobre o uso e a ocupação do solo precisa ser elaborada pelo Executivo, senão o dispositivo pode sofrer uma ação direta de inconstitucionalidade por vício de origem. No passado, deputados distritais já apresentaram e aprovaram legislação autorizando os muros, mas todas foram derrubadas na Justiça por serem inconstitucionais.
O assessor de Políticas Institucionais do Ministério Público do DF, promotor Libânio Rodrigues, explica que as grades não têm valor no momento de registrar em cartório o memorial do loteamento. ;As áreas comuns são públicas e devem ser de livre acesso. Mesmo que haja uma lei, ela não vai valer para todos os casos. Áreas muito extensas certamente não poderão ser cercadas para que não impeçam o livre trânsito de veículos e pessoas;, comenta o promotor. ;O Ministério Público vem postulando junto ao governo a retirada dos muros e guaritas;, acrescenta Libânio.
O gerente de Regularização de Condomínios do GDF, Paulo Serejo, assegura que a demolição de cercas e cancelas nunca esteve em discussão dentro do governo. ;Nosso entendimento é que os parcelamentos devem permanecer como estão. Nada será derrubado e já estamos elaborando uma legislação que permita a regularização dos condomínios com a manutenção dos muros e guaritas;, assegura Serejo.
1 - Legislação
O TAC autorizou a venda direta de lotes localizados em terras de propriedade do GDF. Além de garantir esse benefício, o acordo entre o Ministério Público, o GDF e os moradores propiciou outras novidades, como facilidades no licenciamento ambiental.
O que diz o TAC
Confira o que estabelece o Termo de Ajustamento de Conduta dos Condomínios com relação às cercas e guaritas:
É preciso verificar se existem áreas destinadas a sistemas de circulação e implantação de equipamentos públicos urbanos e comunitários, bem como espaços livres de uso público, que serão proporcionais à densidade da ocupação;
O GDF tem que assegurar o acesso público às vias internas e externas do parcelamento, às áreas destinadas à implantação de equipamentos públicos urbanos e comunitários e aos espaços livres de uso público, sem qualquer muro externo, guarita ou outros obstáculos não autorizados por lei;
O governo tem que exigir a supressão de muros e outros obstáculos não admitidos na legislação pertinente ou incompatíveis com a implantação de corredores ecológicos;
É preciso definir estratégias que garantam a inserção dos parcelamentos de solo à malha urbana e de prestação de serviços do Distrito Federal.