Mariana Flores
postado em 18/10/2009 09:02
A pirâmide socieconômica do Distrito Federal está cada vez mais invertida. O topo, que abriga as famílias de renda mais elevada, alarga-se a cada ano. A base, onde se aglomeram os mais pobres, vai se estreitando. O movimento ocorre em todo o país, mas na capital federal as mudanças são bem mais expressivas. A justificativa é o aumento de renda. Salários mais altos pagos na cidade nos últimos 15 anos puxaram 383,2 mil pessoas para a classe AB(1), o que corresponde a mais de um quarto da população do DF. Pelo mesmo motivo, 94,8 mil brasilienses deixaram a classe C. Resultado: reduziu de um quinto dos moradores para apenas 10% entre 1993 e 2008, segundo o estudo Consumidores, produtores e a nova classe média: miséria, desigualdade e determinantes das classes(2), elaborado pelo professor Marcelo Neri, da Fundação Getulio Vargas (FGV), com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domiciliar (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).O salto de uma faixa para outra ocorreu em todas as classes de renda. Além das 94,8 mil pessoas que ultrapassaram a linha da pobreza e passaram da classe E para a D, o número de moradores que ingressaram na classe média quase duplicou em 15 anos. Ao todo, 511,9 mil pessoas inflaram a classe C desde 1993. Outras 383,2 mil passaram a ser consideradas ricas, compondo a classe AB, que atualmente chega a 669.390 brasilienses.
;O aumento de renda se deu em toda a população, mas com mais fermento nas classes mais baixas, por isso a classe C aumentou tanto. Esse acréscimo se deve à elevação de renda do trabalho e às transferências governamentais;, afirma o autor do estudo, professor Marcelo Neri.
A renda de R$ 4.807 por família pode parecer baixa para caracterizar a parcela mais abastada da população, principalmente na cidade que tem o rendimento mais alto do país(3), segundo a Pnad, mas apenas em Brasília o percentual de pessoas que pertencem à classe AB é tão elevado. Em todo o Brasil, 10,4% das famílias vivem com um valor superior a esse por mês. Ao todo, são 19,7 milhões de pessoas, das quais 669,3 mil moram na capital federal. Os estados que aparecem em segundo e terceiro lugar, Rio de Janeiro e São Paulo, têm um percentual bem inferior de moradores na classe AB, 14,5% e 14,4%, respectivamente. ;O número de membros nas famílias está caindo em movimento acelerado. Então, a média pessoal vai aumentar porque tem menos gente dividindo o bolo. Além disso, há cada vez mais casais sem filhos e pessoas morando sozinhas; por isso, considerando o cenário nacional, esse volume de R$ 4,8 mil é realmente alto;, afirma o professor de economia e finanças públicas da Universidade de Brasília (UnB), Roberto Piscitelli.
O rendimento elevado de Brasília se justifica pelos altos salários pagos aos servidores federais. ;Brasília é uma cidade sustentada pelo governo; se tirar o funcionalismo público essa renda cai muito;, diz o economista Adolfo Fachsida, professor da Universidade Católica de Brasília (UCB).
Mas o custo de vida também é elevado, o que acaba consumindo boa parte da renda, reclamam os moradores do DF. Com um rendimento domiciliar que passa dos cinco dígitos, o casal Gabriela Bernardon e Anderson da Costa Mello, de 34 e 35 anos, quitou este ano o apartamento em que mora com o filho, ainda bebê, na Asa Norte. Os dois mantêm aplicações financeiras, mas não sobra uma parte tão grande do rendimento, como imagina quem vê de fora, segundo eles. ;Gastamos muito dinheiro com o bebê e o custo de vida em Brasília é muito elevado. Imóvel é caríssimo, tudo é caro: roupa, restaurante; Acho que é o local mais caro do país;, reclama a analista do Judiciário, casada com um gestor do Planejamento, cargos que figuram entre os mais cobiçados pelos concurseiros.
Líder da desigualdade
A capital federal é a unidade da federação com maior concentração de renda do país(4). Ao mesmo tempo em que convive com o maior número de pessoas na classe mais rica, o Distrito Federal tem mais de um quarto de sua população nas classes D e E. Ao todo, são 696,1 mil pessoas que vivem em lares que têm rendimento mensal de até R$ 1.115. Com uma média de três moradores por casa no Distrito Federal, segundo a Pnad, isso equivale R$ 371 mensais por pessoa.
1- Divisão
O estudo divide a população da seguinte forma: a classe AB tem renda familiar superior a R$ 4.807; a classe C, entre R$ 1.115 e R$ 4.807. O rendimento domiciliar da D vai de R$ 768 a R$ 1.115, e a classe E agrupa as pessoas que vivem em domicílios com renda inferior a R$ 768.
2- Pesquisa
O levantamento teve como objetivo traçar um retrato das condições da população brasileira. A partir da desagregação em grupos de renda, o estudo mostra o quanto cresceu e diminuiu o poder de compra da população.
3- Contracheque
A renda média do brasiliense é a mais alta do país. Em 2008, estava, em média, em R$ 2.117, mais do que o dobro da média nacional, de R$ 1.036. A segunda colocada no ranking, São Paulo, tem um salário médio de R$ 1.290.
4- Terra de constrastes
O Distrito Federal é a unidade da Federação com maior desigualdade de distribuição de renda do país, segundo o IBGE. O Índice de Gini brasiliense é de 0,618, o mais elevado do país. O brasileiro é de 0,531. Pela metodologia, quanto mais próximo o indicador for do número 1, maior é a diferença de renda existente na cidade.