Jornal Correio Braziliense

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Volume de água da Barragem do Descoberto diminuiu 18% em 25 anos

A represa é responsável por dois terços (65%) do abastecimento do Distrito Federal. Ocupação desordenada é um dos vilões

Ano de 1974. De longe, era possível ver a imensidão e fartura de água da Barragem do Descoberto, responsável por dois terços (65%) do abastecimento do Distrito Federal. Naquele tempo, as construções começavam a surgir em grande escala e o verde das matas ciliares acabou sendo esmagado com a ocupação humana, fator que contribuiu para o assoreamento do lago e, consequentemente, a degradação ambiental. De lá para cá, o cenário mudou drasticamente. Em 25 anos, o volume de água caiu 18% e a vazão, que era de 6 mil metros cúbicos por segundo, baixou para 5,4 mil. A perda é de 600 litros por segundo ou 36 mil litros por minuto, 2,1 milhões de litros por hora e 51,8 bilhões ao ano. O líquido perdido diariamente é mais do que suficiente para abastecer toda Taguatinga, onde há mais de 300 mil habitantes.

A Barragem do Descoberto está localizada às margens da
BR-070 (rodovia que liga o Plano Piloto a Águas Lindas), a poucos metros da divisa do DF com Goiás. Inicialmente, a área inundada era de 14,8km;, mas hoje são 12,4km;. O maior problema fica na região de Águas Lindas, onde diversas moradias se fixaram nas últimas décadas sem que houvesse preocupação com infraestrutura. O resultado não poderia ser outro: durante o período de chuvas, com a perda de vegetação natural, o solo fica desprotegido e a água acaba escorrendo pela superfície em vez de se infiltrar na terra e abastecer o lençol freático. Além de provocar erosões, a força da água também carrega para dentro dos mananciais todo tipo de resíduos, como barro, areia e lixo, o que dificulta ainda mais o processo de vazão.

De acordo com o supervisor de meio ambiente da Companhia de Saneamento de Brasília (Caesb), Maurício Luduvice, o crescimento urbano desordenado em cidades próximas do manancial não é o único vilão da história, embora contribua significativamente para a escassez de água. ;Além dessa ocupação não planejada, temos também a questão da educação das pessoas. Muitas acham que lago é depósito de lixo. Temos de mudar essa consciência;, explicou, mencionando ainda fatores climáticos e geológicos que podem ter parcela de culpa na diminuição do volume da barragem.

A situação do manancial ainda passa despercebida pela maioria população. O comerciante Valdigne Ferreira, 53 anos, por exemplo, mora há três anos em uma região de chácaras de

Brazlândia, próximo à Barragem do Descoberto. Ele avalia que é importante o cuidado com o manancial, mas diz não ter notado a diminuição do volume de água no lago que abastece mais de um milhão de pessoas em Ceilândia, Taguatinga, Plano Piloto, Samambaia e Recanto das Emas. ;Na época da seca, é normal baixar um pouco, mas nunca vi faltar água na região;, disse.

Embora nem todos percebam, o Lago do Descoberto agoniza, como se a morte viesse lentamente, com o passar dos anos. Em razão desse risco, especialistas correm contra o tempo para evitar que o nível do reservatório baixe ainda mais e comece a afetar a distribuição de água nas cidades do DF. Para isso, o Instituto Brasília Ambiental (Ibram), em parceria com a Agência Reguladora de Águas e Saneamento (Adasa), Caesb e outros órgãos de proteção ambiental trabalham para recompor a vegetação perdida, a fim de reduzir os impactos provocados pelas invasões. Um deles é o projeto de plantio de 130 mil mudas de espécies nativas ao longo da orla do lago e a realização de um trabalho de conscientização com os moradores e agricultores da região.

Santa Maria

A Barragem Santa Maria se encarrega de abastecer cerca de 27% da população de Brasília. Foi construída em 1961 com um espelho d;água de 6 km;. O manancial quase não perdeu em volume e extensão nos últimos anos, tendo atualmente 5,9 km;. Segundo o supervisor de Meio Ambiente da Caesb, Maurício Luduvice, o fato de estar localizado na área do Parque Nacional de Brasília torna o manancial mais protegido em razão da vegetação existente ao seu redor. Ele é responsável por garantir água a mais de 500 mil pessoas do DF. Na época da seca, uma das maiores preocupações é com o risco de queimadas que podem destruir a mata e prejudicar o lençol freático com o escoamento de água pelo solo no período de chuvas. Outra preocupação é o aterro sanitário da Vila Estrutural, o lixão. Estudos têm sido feitos para avaliar se o chorume estaria contaminando os lençóis freáticos próximos à bacia de Santa Maria, o que pode comprometer a qualidade da água.

O longo processo de destruição que atinge os mananciais hídricos do DF e o crescimento populacional têm feito a Caesb estudar como buscar água em locais mais distantes ou acessíveis. No mês passado, a companhia anunciou que, para 2011, o Lago Paranoá terá a função de fornecer água a 500 mil pessoas. Esta seria uma alternativa, diante do risco iminente de faltar água no DF, sobretudo no período de seca. O processo de buscar recursos hídricos em outros lugares deve afetar o bolso do brasiliense. ;À medida que a gente tem que pegar água mais longe, os custos aumentam e esse repasse é feito ao consumidor;, disse o superintendente de Recursos Hídricos da Adasa, Diógenes Mortari.