A construção das histórias de amor não costuma ser fácil. Contos de fadas são raros e a maioria dos casais precisa exercitar o amor diariamente, diante dos percalços da vida. Mas também há os empurrões do bem, que ajudam a fortalecer a relação. E foi exatamente isso que aconteceu ontem com 26 brasilienses, a maioria de funcionários de uma fábrica de doces, que se casaram em grande estilo em uma igreja do Lago Sul. Emocionados, não cansaram de agradecer à iniciativa da patroa, que buscou o apoio de parceiros para realizar a cerimônia tão especial na vida dessas pessoas.
Amores como o de Marilene Carvalho Gaspar, de 1,53m, que até ontem era noiva de Márcio Victor de Souza Silva, mas hoje já é mulher. ;Quando o conheci e nos apaixonamos, eu tinha só 14 anos;, conta ela, hoje com 18. O marido, de 21 anos, é músico ; toca bateria. E foi pela música que conquistou a amada. ;Minha prima cantava em uma banda que ele tocava. Eu ia nos ensaios e foi acontecendo. Hoje, eles não tocam mais juntos, mais nosso amor está mais forte do que nunca;, comemora Marilene, com seus grandes olhos castanhos valorizados pela maquiagem.
O relacionamento enfrentou muitas dificuldades. Uma das principais inimigas foi a própria mãe dela, que não queria ver o garoto ;nem pintado de ouro;. Márcio passou por isso quando ganhou um forte advogado, João Pedro, que já tem dois anos. ;Eu engravidei e ele começou a frequentar minha casa. Daí se entendeu com minha mãe. Hoje, ela adora ele;, garante. Os dois, que vivem em Santa Maria, trabalham de doceiros na fábrica de Maria Amélia Campos Dias, no Lago Sul.
O pai de Márcio ainda casou outra filha, Ana Lídia Souza Silva, 19, na mesma cerimônia. ;Eu sempre quis me casar, mas era algo que parecia distante. E aconteceu depois de seis meses morando juntos. Estou muito feliz mesmo;, garante ela. Maria Cecília, que faz dois anos em janeiro, é filha de Ana Lídia e foi ao casamento. ;Estou nervosa também, não dormi bem. Quero estar logo com o meu marido;, confessa, ansiosa, enquanto se preparava em um salão da paróquia Nossa Senhora do Rosário, na QL 26 do Lago Sul.
A fábrica, em que trabalha a maioria dos que passaram para o time dos casados, tem os bolos e doces de casamento como uma de suas especialidades. ;Eles vivem trabalhando para o sonho dos outros. É justo que tenham os seus realizados também;, valoriza a empresária Maria Amélia, que vive há nove anos em Brasília e é casada há 22. ;Eu lembro de tudo do meu casamento. Tudo! E me arrependo de não ter me casado de véu e de não ter tido bolo. Acho que é por isso que hoje faço tantos;, aposta.
Aluguel
Com um bom relacionamento no mercado brasiliense de casamentos, a doceira conseguiu os melhores serviços para seus funcionários, que teriam dificuldades para bancar um casório do próprio bolso. ;O aluguel dos vestidos, se fosse cobrado, sairia de R$ 2 mil a R$ 4 mil;, informa o alfaiate Fernando Peixoto, que abraçou a ideia. ;Sempre busco me manter atento a causas sociais. Por isso, atendi na hora o chamado da Maria Amélia, que é um anjo para esses funcionário.; Bruno Anderson, que vestiu os noivos com fraques da sua loja ; de onde não saem por menos de R$ 350, ficou bem contente em ver a felicidade nos olhos daqueles 13 homens. ;Além de parceiro, sou amigo da Maria Amélia e jamais me negaria a ajudar uma causa tão nobre;, garante.
A cerimônia começou quase ao meio-dia, quando os noivos entraram nervosos na igreja. Não haviam visto ainda suas noivas arrumadas, muitas das quais não seguraram as lágrimas ao pisar no tapete vermelho. Uma delas era Rosana Soares, a mais velha a colocar a aliança e uma das mais emocionadas. ;Casar era meu maior sonho, mas eu não podia. Já escrevi para um monte de programa de televisão, mas acabou sendo minha chefe, a nossa mãe, que realizou isso na minha vida;, diz ela, que tem 41 anos e está grávida de sete meses do primeiro filho, minutos antes de se encontrar no altar com Antônio Severino, de 26. ;Nossa história é incrível. Quando nos conhecemos, foi amor à primeira vista e ele abandonou a noiva duas semanas antes do casamento;, conta.
O cabeleireiro Eliezer Marcos, que suou para dar conta das noivas minutos antes do casamento, nunca havia participado de uma cerimônia coletiva. ;E olha que são 29 anos de profissão;, informa. ;Eu achei linda essa iniciativa e essa energia delas está me fazendo muito bem;, relata. ;Eu amo o me trabalho. Se eu puder aliar isso ao fato de ajudar alguém, é ótimo. Elas estão lindas e eu estou feliz por ter participado disso;, complementa o maquiador Pedrinho Monteiro. Todos trabalharam voluntariamente e fizeram ainda a alegria de pais como o técnico em contabilidade José Eustáquio de Oliveira, 64, que saiu de João Pinheiro (MG) para ver o filho, Eduardo Brandão, 32, se casar. ;É o primeiro dos meus três filhos que eu vejo casando. Estou realizado;, define.
Personagem da notícia
Trabalho com carinho
Mineira de Bambuí, a quase 600km de Brasília, Maria Amélia, que hoje completa 41 anos, veio para a capital para realizar o sonho de ser doceira. De sua fábrica, na QI 21 do Lago Sul, já saíram delícias que encantaram centenas de festas, principalmente casamentos. O esforço de uma centena de funcionários é recompensado por ela com mais do que um bom salário. ;Um bom ambiente de trabalho se consegue com respeito e carinho pela equipe;, acredita Maria Amélia, que é querida como uma mãe por quem trabalha com ela. ;É incrível, eu nunca tive uma chefe assim. Ela se preocupa mesmo conosco, ao ponto de querer realizar nossos sonhos;, valoriza um dos noivos do casamento coletivo Eleomar de Oliveira, 22, que trabalha como empacotador.
Maria Amélia teve a ideia do casamento coletivo ao atender um pedido. ;A igreja me pediu os doces para ajudar em outro casamento coletivo, mas com menos gente. Eu aceitei na hora, mas pensei em pedir que casasse também quem eu pudesse ajudar;, lembra ela. ;O padre aceitou e eu cheguei um dia na fábrica e gritei: ;Quem quer casar?;. Acharam que era brincadeira;, diverte-se. ;Foi um sufoco para conseguir a documentação. Boa parte deles são do Nordeste e tiveram que buscar documentos nos cartórios de lá. Mas graças a Deus deu tempo;, conclui ela, que entrou na igreja na companhia do marido, Ronaldo (foto). (RV)