postado em 25/11/2009 07:10
Moradores do Distrito Federal decidiram se unir em favor de um combustível mais barato. Há menos de um mês, um grupo de amigos de Taguatinga deu início a uma campanha para mobilizar a população. Por iniciativa própria, cerca de 40 pessoas mandaram fazer adesivos, banners, camisetas e folders em tom de protesto aos preços cobrados nos postos do DF. Aos domingos, organizam carreatas até a divisa com Goiás, onde o litro do álcool e da gasolina custa, em média, R$ 0,40 e R$ 0,25 mais barato, respectivamente. As ações serão intensificadas nas próximas semanas. Sem apoio financeiro nem vínculos políticos, o grupo se reúne para definir estratégias de atuação. O site oficial que os organizadores batizaram de Movimento contra a Cartelização dos Combustíveis no DF será lançado em breve. Por enquanto, o convite para boicotar postos do DF(1) é espalhado por celular e pela internet. Cerca de 100 camisetas e mais de 2 mil adesivos de carro foram distribuídos em Taguatinga, Ceilândia, Samambaia, Águas Claras e Vicente Pires. Banners e folders devem ganhar as ruas ainda esta semana. Até aqui, o grupo gastou quase R$ 6 mil.
Os amigos querem que o movimento seja capaz de baixar os preços no DF e prometem não descansar enquanto isso não ocorrer. Eles garantem que os donos de postos sabem que há muita ;gordura; nos valores cobrados, apesar de a carga tributária em Brasília ser mais alta do que em Goiás. ;Não somos contra o lucro, mas não aceitamos abuso. Nossa indignação se transformou em reação. Decidimos parar de murmurar e reagir;, comenta o porta-voz do grupo, Charles Guerreiro, 40 anos, que tenta marcar um debate público com a presença de empresários do setor.
Tudo igual
Em todo o DF, de Planaltina ao Gama, os preços são praticamente os mesmos: R$ 2,74 pelo litro da gasolina e R$ 1,99 pelo litro do álcool. No posto BR de Engenho das Lajes, em Goiás, a cerca de 38km da saída de Taguatinga, esses valores caem para R$ 2,49 e R$ 1,59. O gerente do estabelecimento confirma que o movimento aumentou no último mês e que 70% da clientela é formada por gente como o policial militar Luciano Ferreira, 31, que atravessa a divisa para economizar R$ 25. ;Vale a pena pela economia, por menor que seja, mas, principalmente, pelo protesto;, diz.
Um posto Shell, do lado do DF, resolveu praticar o mesmo preço do concorrente goiano nos fins de semana. O dono baixou o valor do litro da gasolina de R$ 2,64 para R$ 2,49. Os amigos do movimento em prol do combustível baixo acreditam que isso já é reflexo da mobilização. ;Chegou a hora de a gente fazer alguma coisa. Eu vou distribuir adesivos para todo mundo;, compromete-se o estudante Diego de Almeida, 19, que aderiu ao movimento e todo domingo segue o comboio rumo à divisa. ;Não dá para continuar pagando R$ 400, R$ 500 por mês com gasolina;, completa.
Adesões
Os preços semelhantes nos postos do DF revoltam a professora Ana Paula Gouveia, 35. Quando soube da campanha, não titubeou em fazer parte dela. ;Eles querem enganar a quem com esse cartel? É absurdo não termos opção de preço. Eles cobram o que querem e a gente vai continuar pagando?;, provoca. No adesivo do movimento, aparece a imagem de um motorista com as mãos para cima, como se estivesse sendo assaltado pela bomba de combustível. ;Vamos parar com essa conversa fiada de que todo mundo em Brasília pode pagar R$ 2,74 pelo litro da gasolina;, acrescenta o porta-voz do grupo.
Sempre que passa pela BR-060 ; rodovia que liga Brasília a Goiânia ;, o caminhoneiro Wellington Marques, 27, não só completa o tanque como enche um galão de 30l, o que é proibido. ;Sei que não posso, mas fazer o quê? Tenho consciência de que me arrisco, mas é brincadeira abastecer no DF;, diz. Na semana passada, o sindicato que representa o setor anunciou que as distribuidoras de combustíveis aumentaram o valor do litro do álcool e da gasolina. Em nota, deram a entender que o novo reajuste chegaria às bombas. Até ontem, porém, os preços para o consumidor não tinham sido alterados.
A rede
De acordo com informações do Sindicato do Comércio Varejista de Combustíveis Automotivos e de Lubrificantes do Distrito Federal (Sinpetro-DF), há 308 postos no Distrito Federal. Desses 90, pertencem à Rede Gasol ; quase um terço do total. Em relação às bandeiras, 154 são BR ; exatamente a metade.
Valores
Memória
2000
Lei Distrital Complementar n; 294 entra em vigor. De autoria do Executivo, à época comandado por Joaquim Roriz, ela proíbe postos de combustíveis em supermercados, com base no argumento de que postos não podem funcionar perto de áreas onde há grande conglomerado de pessoas.
2003
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Combustíveis comprova a existência de cartel nos postos do DF. Vinte e duas pessoas são indiciadas. Por meio de laudos técnicos, escutas telefônicas e depoimentos, fica provado que os preços eram combinados em reuniões. Relatório final afirma ainda que a Rede Gasol dominava o mercado graças a um contrato privilegiado com a BR Distribuidora.
2004
Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), ligado ao Ministério da Justiça, condena o Sinpetro-DF e as redes Gasol e Igrejinha por formação de cartel e por orquestrarem a lei que impede postos em supermercados. Voto do conselheiro Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer revela que os donos de postos contaram com ajuda de deputados e ajudaram, inclusive, a redigir a lei.
Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) aciona a Justiça e pede a inconstitucionalidade da Lei Distrital
Complementar n; 294.
2007
Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) questiona judicialmente o preço da gasolina cobrado nos postos do DF e pede que seja estipulada uma margem de lucro de 15,87% sobre o preço da aquisição nas distribuidoras.
2008
Após os desembargadores do Tribunal de Justiça do DF negarem o pedido de inconstitucionalidade da lei que impede postos em supermercados, MPDFT recorre ao Supremo Tribunal Federal (STF).
2009
MPDFT abre investigação para apurar abuso no preço do álcool cobrado nos postos do DF.
Procuradoria-Geral da República (PGR) envia parecer ao ministro do STF Celso de Mello em que se manifesta pela inconstitucionalidade da Lei Distrital Complementar n; 294.
Secretaria de Direito Econômico (SDE), ligada ao Ministério da Justiça, abre investigação para apurar a formação de cartel e os preços abusivos nos postos do DF. Além disso, elabora parecer em que pede a revogação imediata da Lei Distrital Complementar n; 294.
Encontro
O movimento criado para combater o preço dos combustíveis cobrado no DF se reunirá no próximo domingo, no Taguaparque, a partir das 14h. De lá, o grupo seguirá em carreata até os postos na divisa com Goiás. Mais informações pelo telefone 9638-4021.