Rodolfo Borges
postado em 21/12/2009 08:22
As escolas classe e parque de Brasília foram idealizadas por Anísio Teixeira para atender às unidades vizinhança que nortearam a elaboração da capital. Nos planos do educador, os estabelecimentos de ensino estariam distribuídos de forma a permitir que seus alunos pudessem chegar a eles a pé, sem se expor aos riscos do trânsito (leia Para Saber Mais). Mas a diminuição progressiva na quantidade de alunos matriculados nas séries iniciais do ensino fundamental da rede pública no Plano Piloto mostram que o modelo educacional imaginado por Teixeira não corresponde à atual realidade dos colégios.Prestes a completar 50 anos, a vizinhança que mora em torno das escolas classe (EC) envelheceu e seus filhos, que usufruíram da educação pública perto de casa, mudaram-se para as regiões onde a moradia é mais barata ; e onde o governo vem abrindo novas escolas. Essa é uma das explicações da Secretaria de Educação do Distrito Federal (SE-DF) para o fenômeno. Em 2007, havia 18.740 alunos matriculados nas 46 escolas da Diretoria Regional do Plano Piloto e Cruzeiro. Esse número teria caído para 15.697 em 2009 se o sistema educacional do DF não tivesse ganhado mais um ano.
O problema pode ser observado com mais nitidez na EC 413 Sul. A instituição tem capacidade física para abrigar até 20 turmas de 1; a 4; série e do 1; ao 5; ano, mas, finalizada a telematrícula, tem previstas apenas sete turmas (num total de 99 alunos) para o próximo ano, e algumas com apenas 9 dos 28 estudantes possíveis. A matrícula ainda será complementada em fevereiro com a distribuição das vagas remanescentes, mas o diretor da escola não demonstra muita confiança quanto ao preenchimento das 280 vagas oferecidas ; metade do potencial da instituição.
;Fizemos uma mobilização para nos aproximar da vizinhança. Divulgamos as vagas e a escola por meio de panfletos, jornais e carros de som, mas não atingimos a comunidade da forma que esperávamos;, admite o diretor Alcemiro de Sousa Nobre. Segundo ele, a escola da 413 Sul chegou a trabalhar com educação infantil nos últimos quatro anos para preencher a falta de alunos, mas, a instituição vai voltar a oferecer apenas as primeiras séries do ensino fundamental em 2010, consequência das estratégias boladas pela SE-DF para solucionar a questão (leia mais na página 21).
Mudança
A família de José Aurino da Rocha Neto e Roberta Cabral de Sousa é um bom exemplo da dinâmica vivida pelos moradores do Plano Piloto. Roberta, hoje uma dona de casa de 34 anos, estudou seus primeiros anos escolares na Escola Classe da Quadra 405 Sul, onde seus pais ainda moram. Depois do casamento, a família se mudou para o Guará e matriculou os filhos numa escola particular próxima de casa. ;Eles estudaram durante um ano lá, mas, depois desse período, descobrimos que o Roberto (filho mais velho, de 11 anos) não sabia escrever um A;, reclama o analista de sistemas José Aurino, 45.
Preocupados com a educação dos três filhos, o casal, que hoje mora no Lago Sul, iniciou uma pesquisa nas escolas da cidade e é taxativo quanto à conclusão. ;O primário das escolas públicas do Plano Piloto é muito superior ao das escolas particulares;, garante José Aurino. Prova disso, para o pai, é o desempenho da filha Giulia, 10, no colégio particular em que cursou a 6; série em 2009 ; a família não confia tanto na qualidade das séries seguintes do ensino público.
;Ela foi premiada por escrever a melhor redação dos 15 colégios da rede. Devemos isso à EC 206 Sul;, defende Aurino, cujo filho de 4 anos estuda no Jardim de Infância da 208 Sul. O analista de sistemas atribui grande parte da qualidade do ensino aos professores, que ;estão ali por amor às crianças e compromisso com a educação, e não por dinheiro;.
A qualidade do ensino das séries iniciais da rede pública também é ressaltada pela secretária interina de Educação, Eunice Santos. ;Temos EC entre as maiores notas do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) do Brasil.; O problema, segundo ela, é que os brasilienses não têm essa noção. ;Precisamos que a sociedade do Plano Piloto confie mais na educação do DF;, resume.
Educação Integral
Nascido na cidade de Caetité (BA), em junho de 1900, o educador Anísio Spínola Teixeira foi o responsável por planejar o sistema de educação do Distrito Federal, e o fez à semelhança de modelo implantado por ele na Bahia durante a década de 1950. Teixeira também participou da criação da Universidade de Brasília (UnB), da qual chegou a ser reitor.
Plano
A unidade vizinhança era composta, no plano do urbanista Lucio Costa, por um clube, as escolas classe e parque, uma igreja, um posto de saúde, um cinema, um teatro e um jardim de infância. A única unidade vizinhança integral construída na cidade é composta pelas quadras 107, 108, 307 e 308 da Asa Sul.
Nove séries
O ensino fundamental brasileiro ganhou mais um
ano em 2009 ; passou de oito para nove séries. O objetivo do governo federal é ter mais crianças na escola e lhes proporcionar mais tempo de estudo. Acrescentando 3.840 alunos que frequentaram o 1; ano do ensino fundamental da rede pública neste ano, a quantidade de matrículas chega a 19.537, que, se levada em conta, pode mascarar a diminuição de estudantes.
Para saber mais
Tempo integral
De acordo com os planos de Anísio Teixeira, a escolarização no Distrito Federal começaria no Jardim de Infância, para crianças de 4 a 6 anos, e continuaria na escola classe, que seria frequentada por alunos de 7 a 14 anos. Durante esse período de 7 anos, a educação seria complementada na escola parque. Nas palavras do próprio Teixeira, a intenção era ;juntar o ensino propriamente intencional, da sala de aula, com a auto-educação resultante de atividades de que os alunos participem com plena responsabilidade;.
O educador defendia a criação da escola com o nome ;parque; para marcá-la como um lugar divertido e diferente. Nessas escolas parque, as crianças aprenderiam artes industriais, sociais e de recreação. Esse sistema, sempre oposto ao horário de aula, pretendia colocar o ensino público como prioridade máxima nas políticas brasileiras. Era um modelo de ensino inspirado no que já havia sido implantado nos Estados Unidos.
;Nessas condições, a criança, além das quatro horas de educação convencional, no edifício da escola-classe, onde aprende a estudar, conta com outras quatro horas de atividades de trabalho, de educação física e de educação social, atividades em que se empenha individualmente ou em grupo, aprendendo, portanto, a trabalhar e a conviver;, escreveu Teixeira.