Cidades

Renomado arquiteto inglês tem boa impressão sobre Brasília

Em visita à cidade, o crítico internacional de arquitetura avalia as principais características que destacam a capital no cenário mundial e sai daqui com boa impressão

postado em 07/01/2010 08:40
A arquitetura e o paisagismo de Brasília atraem visitantes de toda parte desde a época da construção. No ano em que completa meio século de vida, a cidade recebeu mais um hóspede ilustre. O arquiteto inglês Kenneth Frampton, 79 anos, passou os últimos três dias conhecendo monumentos, prédios residenciais e espaços da capital. Ele é professor da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, e renomado crítico de arquitetura moderna. Conhecedor de inúmeras cidades mundo afora, Kenneth comparou características de Brasília com Bogotá (Colômbia), Kyoto (Japão), Los Angeles (EUA) e Paris (França).

Kenneth Frampton em frente ao Palácio da AlvoradaKenneth buscou inspiração para escrever o trecho de um livro que exibirá fotos dos primeiros anos da cidade. Para tanto, percorreu a 308 Sul ; quadra com paisagismo projetado por Burle Marx ;, visitou o Catetinho, a Igrejinha, a Universidade de Brasília (UnB) e o Núcleo Bandeirante, entre outros lugares. A parada de ontem à tarde foi o Palácio da Alvorada, construção idealizada por Oscar Niemeyer para abrigar os presidentes do país. Em frente ao prédio, Kenneth explicou por que ele é um dos pontos altos da arquitetura da cidade: ;Ele é delicado e muito raro. Me lembrou o Palácio de Katsura(1) (em Kyoto);.

O texto do arquiteto fará parte do livro Brasília ; Marcel Gautherot, onde há imagens registradas pelo fotógrafo francês que se encantou pelo Brasil. Nos anos 50 e 60, Gautherot fotografou as construções da capital, além de viajar pela Amazônia e por outros cantos do país. O acervo(2) está no Instituto Moreira Salles, em São Paulo, que organizou o livro em comemoração ao cinquentenário de Brasília. O material, editado por Samuel Titan Júnior, será lançado até abril deste ano.

O arquiteto inglês se lembrava de uma Brasília distante, mas não muito diferente: a de 1966. Naquele ano, ele fez uma viagem pela América Latina e parou no Distrito Federal por dois dias. ;Não havia tantas construções fora do Plano Piloto;, reparou. O tradicional passeio pelas dependências do Congresso Nacional não era possível à época. Frampton se recorda de uma cerca instalada em frente ao prédio, protegido pelos militares. ;Não podíamos chegar muito perto;, disse.

Visita guiada
No tour pela cidade, Frampton contou com uma especialista na área: a professora de arquitetura da UnB Sylvia Ficher levou-o para conhecer prédios do centro. Ele ficou admirado com um edifício comercial em construção no Setor Militar Urbano, projeto de autoria do arquiteto Danilo Matoso. ;O espaço principal tem uma galeria e luz incrível. O auditório é simples e bem proporcional;, notou. O inglês só não gostou do que viu nos setores comerciais. ;Perderam o controle das alturas. Eu não esperava tantos prédios comerciais perto do centro, não achei bom. Eles poderiam estar em qualquer lugar, são prédios comuns;, ressaltou. O visitante lembrou o caso de Paris, capital francesa, onde as grandes construções foram barradas no centro e levadas a regiões mais afastadas. Um dos poucos arranha-céus permitidos é o La Tour Montparnasse, com mais de 200m de altura.

A altura dos prédios daqui chamou a atenção de Frampton. Definir um limite para os edifícios é, na opinião dele, um fator determinante para a paisagem da cidade. ;Ter diferentes alturas é algo muito negativo. A altura dá unidade ao espaço;, afirmou. Os limites não devem ser os impostos pelos engenheiros ou pelos avanços tecnológicos, segundo ele, mas por leis respeitadas pelas construtoras. O tamanho dos blocos das superquadras do Plano Piloto agradou ao arquiteto. ;As pessoas têm a sensação de viver perto do chão e isso deixa o ambiente mais humano. Em prédios altos, elas perdem o contato com o chão;, completou.

Concentração
Ele destacou que o maior desafio, não só de Brasília, mas de todas as cidades do mundo, é conter o consumo. O gasto de recursos que movem a comunidade, como água, energia e combustível, deve ser controlado. ;Em Brasília ainda há muito espaço. Você pode densificar o Plano e economizar mais recursos. Cidades mais concentradas são mais sustentáveis;, disse.

Outro problema é a tendência de mudar a aparência da paisagem para melhorar a segurança dos moradores. Em visita à Vila Metropolitana, no Núcleo Bandeirante, Frampton deparou-se com grades de ferro protegendo quase todas as casas. ;Tenho certeza que isso é essencial, mas é uma história triste. Os padrões de segurança não são fáceis de entender, é um pouco psicológico;, comentou. As grades lembraram ao arquiteto condomínios fechados ocupados pela classe média de Bogotá, na Colômbia, e casas cercadas do bairro do Harlem, em Nova York, EUA.

O paisagismo das superquadras e da Esplanada dos Ministérios é destaque da capital, na opinião do arquiteto. ;As quadras têm uma escala e os prédios são cuidadosamente separados. O paisagismo é mais impressionante do que os prédios;, disse. Frampton achou fácil caminhar pelas calçadas da cidade ; que considera ;extremamente bonita;. Ao se referir ao Plano Piloto, ele usou o adjetivo walkable, algo como ;em que se pode andar;. O ambiente é favorável tanto para carros quanto para pedestres, na avaliação do inglês. ;Em Los Angeles (EUA), se você caminha na rua, é parado pela polícia;, brincou. Kenneth deixou a capital brasileira com boas impressões sobre a capital e ainda mais bagagem para escrever o livro. ;A questão do paisagismo é mais e mais importante. Vou olhar Brasília por esses olhos, é algo que vou enfatizar no texto;, concluiu.

1 - Palácio japonês
O Palácio de Katsura é uma vila com jardins em Kyoto, no Japão, e um dos pontos turísticos da região. Sua característica marcante é a construção shoin, estilo adotado em residências de samurais e de altas classes sociais. As casas contam com módulos de madeira articulados, nichos, prateleiras e o tokonama ; área destinada a pinturas e enfeites. O palácio também tem uma casa de chá e jardins. Uma réplica de Katsura foi construída no Parque do Ibirapuera, em São Paulo ; é o Pavilhão Japonês.

2 - Acervo fotográfico
As obras exibidas no livro fazem parte do acervo do Instituto Moreira Salles, entidade civil sem fins lucrativos com programação cultural em São Paulo e no Rio de Janeiro. O instituto conserva cerca de 550 mil fotografias, 100 mil músicas e uma infinidade de livros e quadros. Destacam-se as obras do fotógrafo Marc Ferrez e os acervos do pesquisador José Ramos Tinhorão e do músico Pixinguinha.

Perfil

Kenneth Frampton
Aos 79 anos, o arquiteto é professor, crítico e escritor. Ele é o autor dos livros História crítica da arquitetura moderna e Le Corbusier, que fala sobre o trabalho do famoso arquiteto do século 20.

# Professor da Escola de Arquitetura da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos
# Estudou arquitetura em Londres nos anos 50 e entrou para o Royal Institute of British Architects
# Começou a carreira na Inglaterra e mudou-se para os Estados Unidos na década de 1960
# Nos EUA, trabalhou na Universidade de Princeton e nos anos 60 entrou no quadro da Universidade de Columbia
# Entre os prêmios recebidos por Frampton, estão a Médaille d;Or of the Parisian, da Academia Parisiense de Arquitetura, e o National Honours Award, do Instituto Americano de Arquitetos.

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