Jornal Correio Braziliense

Cidades

Redução de pena de Durval Barbosa depende de detalhes da participação de outros envolvidos

Ao denunciar o suposto esquema de pagamento de propinas do Executivo local para o Legislativo, Durval Barbosa deu um salto no escuro no que se refere a garantias para se livrar de possíveis condenações. Quanto mais o delator da Operação Caixa de Pandora contribuir com informações seguras sobre empresários, servidores públicos e políticos enrolados na teia da corrupção que denuncia, mais chance ele terá de evitar um desfecho mais severo para seu futuro que o leve à prisão. A avaliação final, no entanto, sobre o valor dessa contribuição para a elucidação de crimes é do juiz de cada processo que ele responde, com base na convicção do Ministério Público Federal (MPF) e do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), autores das denúncias e ações de improbidade administrativa em tramitação contra Durval.

No inquérito da Operação Caixa de Pandora, o ministro Fernando Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), acatou pedido da subprocuradora-geral da República Raquel Dodge, previsto na Lei n; 9.807/99, que trata de atos praticados por organizações criminosas, e concedeu proteção policial para Durval, que se tornou colaborador da Justiça. Ele tem andado com escolta. Já prestou mais de 20 depoimentos e continuará detalhando as denúncias que fez contra o governador José Roberto Arruda, o vice-governador Paulo Octávio, deputados distritais, empresas prestadoras de serviços e integrantes do Ministério Público. Por enquanto, segundo investigadores, ele tem ajudado. Mas não significa que esteja livre de pagar pelos crimes que denuncia.

Não há definição ainda sobre a extensão da validade de eventual delação premiada nos demais processos que Durval já responde no Tribunal de Justiça do DF. Segundo especialistas no assunto, em tese, a lei que trata da delação premiada relaciona o instituto a ações penais e não poderia beneficiar réus na esfera cível, como é o caso dos processos por improbidade administrativa. Mas não há consenso sobre isso. No caso das 10 ações penais contra Durval, também não há garantia de sucesso na intenção de reduzir a pena ou extinguir a punibilidade.

Perda do foro
Ao deixar o cargo de secretário de Relações Institucionais do DF, Durval Barbosa perdeu o foro privilegiado para ser julgado no Tribunal de Justiça do DF, onde os processos tramitam num ritmo muito mais lento do que numa vara criminal comum. Em dezembro, sete denúncias sob a responsabilidade dos desembargadores baixaram para um juiz de primeiro grau. No Tribunal de Justiça do DF, as ações contra quem tem foro especial exigem a deliberação do Conselho Especial, formado pelos 19 desembargadores mais antigos, apenas para o recebimento da denúncia. Duas ações penais em que Durval é acusado de formação de quadrilha e corrupção foram recebidas depois de três sessões interrompidas com pedidos de vista.

Para obter o benefício da delação premiada, Durval terá de contribuir com o detalhamento sobre eventual participação de outros envolvidos em cada uma das ações penais a que já responde. Em duas delas, ele tem a seu lado o ex-governador Joaquim Roriz (PSC). Numa das ações penais, eles são acusados de usar dinheiro supostamente desviado de contratos do governo com a empresa Linknet para a compra de urnas eletrônicas, usadas da campanha eleitoral de 2002 para ensinar as pessoas a votar. Na avaliação de especialistas, para ter redução da pena, em processos como esse, Durval terá de apresentar novos elementos além dos já denunciados pelo MP. Nem mesmo a confissão é suficiente.

Operações
Irregularidades nos contratos do Instituto Candango de Solidariedade (ICS) e na Codeplan são investigados desde 2005 por promotores de Justiça no Ministério Público do DF. Em 2008, houve duas operações que ficaram conhecidas como Megabyte e Terabyte. A casa em que Durval(1) vivia com a família, no Lago Sul, foi alvo de mandados de busca e apreensão, e também na da ex-mulher.

Na avaliação do criminalista Luiz Francisco Barbosa, um delator nunca consegue ter o controle total da situação. "A delação deve sempre ser uma decisão pessoal e não uma estratégia de defesa. Não há delação seletiva. Ou (o delator) entrega tudo ou dança junto", acredita o advogado, que aceitou falar em tese. Barbosa representa o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) no processo do mensalão do PT em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF). Jefferson é o autor das denúncias que originaram a ação penal contra 40 pessoas, entre as quais o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, que também responde como réu no mesmo processo.

1 - Ações de improbidade
Durval Barbosa responde a 37 ações, sendo 10 penais. Ele já foi condenado duas vezes por ato de improbidade administrativa, em processos que questionam contratos sem licitação com empresas de informática, por meio do Instituto Candango de Solidariedade. Num deles, perdeu o direito de ocupar cargos públicos que está em grau de recurso. Nas ações penais, ele poderá ser condenado à prisão, a depender da pena.

Riscos de uma mentira
Os termos da delação premiada que beneficiará Durval Barbosa serão definidos no curso da instrução criminal, explica a assessoria de imprensa da Procuradoria-geral da República. Os detalhes são mantidos sob sigilo. A subprocuradora-geral da República Raquel Dodge, responsável pelo caso, já deixou claro que pretende ajuizar ação penal contra o governador José Roberto Arruda. Durval Barbosa também deverá ser denunciado no mesmo inquérito 650, em tramitação no Superior Tribunal de Justiça, por corrupção. Nos depoimentos, ele confessou que recolhia dinheiro com empresas do ramo de informática e os repassava a representantes do governo, prática iniciada na gestão anterior que teria se perpetuado na atual com a suposta compra de apoio de deputados e enriquecimento ilícito de secretários.

Ao delatar antigos aliados, Durval poderá conquistar o direito de ter a pena reduzida, em caso de condenação, e até alcançar a extinção da punibilidade, se sua ajuda for considerada essencial. A Lei n; 9.807, de 1999, estabelece que o benefício é concedido para quem colabora na identificação dos demais envolvidos na ação criminal e na recuperação total ou parcial do produto do crime, ou seja, do dinheiro desviado dos contratos públicos para bolsas, cuecas e meias.

Convencimento
Ao conceder o prêmio, o juiz e o promotor devem levar em conta a personalidade do delator, além de natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão do crime. Autor da ação penal, o Ministério Público e também o magistrado precisam ficar convencidos de que o delator falou a verdade e disse tudo o que sabe sobre os assuntos tratados. Uma mentira pode destruir toda a confiança conquistada pelo delator.

Consultado pelo Correio sobre o instituto da delação premiada, o criminalista Alberto Zacharias Toron falou em tese sobre o assunto. Ele explicou considerar que no julgamento de um caso que tramita no STJ, o benefício precisa ser aprovado não só pelo relator do inquérito, como pelos demais ministros integrantes da corte, uma definição que só ocorrerá no julgamento da ação. "Há um risco envolvido na delação premiada, quando o sujeito que participou de uma atividade criminosa, além de confessá-la, entrega outras pessoas, relatando outros fatos para se beneficiar com a redução ou com a extinção da pena", afirmou. ";Já vi casos de que a pena não foi reduzida", disse Toron, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo. E acrescentou: "Penso que a matéria ao ser discutida no STJ não pode ser decidida monocraticamente". (AMC)