postado em 10/01/2010 08:27
"A decisão de uma fração da comunidade de moradores do bairro de Águas Claras de literalmente eliminar uma praça pública que reunia pessoas totalmente estranhas ao seu convívio ; consideradas ameaça a seus bem-estar e segurança; é revelador de graves problemas na gestão urbana de uma Capital planejada para ser o centro de elevada vida intelectual e de uma qualidade de vida exemplar ; segundo o genial humanista que a concebeu, Lucio Costa. Como urbanista, acredito que a decisão da comunidade é séria e deve ser levada a sério. Tão grave que devemos traçar os fundamentos desse repúdio a um espaço público que sempre foi essencial à civilidade, desde a origem das cidades: as suas praças.[SAIBAMAIS]Numa explicação sumária, pode-se dizer que a comunidade sempre repudiará os espaços públicos sobre os quais não tem controle, com os quais não tem a menor identidade, que não servem às suas necessidades ou estilos de vida. Como resolver o problema? A comunidade deve ter parte predominante na gestão dos espaços públicos diretamente vinculados a seu "espaço vital", de comunidade.
Na proposta vitoriosa de revitalização da via W3, de 2002 (terminativamente repudiada pelo próprio Governo do Distrito Federal, que promoveu o concurso e não aceitou o resultado), a gestão direta dos espaços públicos de interesse das comunidades moradoras e usuárias era peça central da revitalização, ou da própria vitalidade dos espaços urbanos.
A verdade é que Brasília ; o que inclui necessariamente Águas Claras e os demais bairros ; tornou-se, nos últimos 25 anos de "democracia", uma presa de interesses imobiliários e políticos de má qualidade. O vitorioso "projeto imobiliário" é repleto de exclusividades, avesso à inclusão, ao comunitarismo de qualidade. O próprio governo do DF tem ensinado a comunidade a burlar a Lei (como atestam os mais de 600 condomínios irregulares promovidos por grileiros distritais), a ser desonesta e egoísta, e a ridicularizar a Lei (como atesta a distribuição generosa de dinheiro público a políticos da maior importância em nossa Cidade, por um Secretário de Estado de Relações Institucionais).
A comunidade de Brasília deveria ser assistida por iniciativas públicas baseadas em conhecimentos científicos, em projetos responsáveis por seu bem-estar. Uma das primeiras conseqüências de "um novo tempo para Brasília" seria a compreensão ; e inclusão ; dos "estranhos", o controle das ameaças "vindas de fora" e a perda de medo e de iniciativa diante do crime organizado ; que, como vemos, começa a partir do exemplo do próprio governo local."
Professor Frederico Flósculo Pinheiro Barreto, do Departamento de Projeto, Expressão e Representação em Arquitetura e Urbanismo da UnB