Cidades

Luziânia é o municipio com mais casos de jovens desaparecidos

Seis em cada 10 casos de desaparecimento de crianças e adolescentes registrados em Goiás, em 2009, ocorreram no município. Angústia dos familiares é grande

postado em 03/02/2010 08:05
Cirlene Rabelo, mãe de George, espera achar o filho, que sumiu no último dia 10: Luziânia é a cidade de Goiás onde ocorrem mais casos de desaparecimento de crianças e adolescentes. Em 2009, de cada 10 registros feitos no estado pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, seis ocorreram no município. Nos últimos 33 dias, foram registradas sete ocorrências semelhantes, três a mais que a média mensal do ano anterior.

Em 2009, a secretaria especial da Presidência da República computou 94 casos de desaparecimento em Goiás. Desses, 56 ocorreram em Luziânia. É quase o dobro do número registrado no ano anterior, quando 29 famílias fizeram ocorrências de desaparecimento de seus filhos nas delegacias da cidade. Localizado a 60 quilômetros de Brasília, o município é o quarto mais populoso de Goiás, com 200 mil habitantes, segundo estimativas de 2008 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE).

Ainda de acordo com os dados oficiais, a média mensal de desaparecimentos de menores em Luziânia no ano passado ficou em cinco. Em dezembro, a dona de casa Aldenira Alves, 36 anos, fez boletim de ocorrência do sumiço do seu filho, Diego Rodrigues, de 13 anos. Na sequência, outros cinco jovens também começaram a ser procurados por suas famílias, conforme o Correio revelou com exclusividade no dia 16 último. Em 2010, o número de ocorrências ficou muito acima da média justamente quando veio à tona o misterioso sumiço deles.

Eles não se conhecem e não têm passagem pela polícia. Mas moram no mesmo bairro: Parque Estrela Dalva. Além de Diego, são procurados: Paulo Victor Lima, 16 anos; George dos Santos, 17; Divino da Silva, 16; Flávio Augusto dos Santos, 14; e Márcio Luiz Lopes, 19, o último a sumir, em 22 deste mês.

Luziânia registrou este ano 13 desaparecimentos, incluindo os adultos. Para o delegado regional do município, José Luiz Martins, a estatística está dentro do normal. ;Se formos comparar o número de desaparecidos com a população de Luziânia, não há nada de excepcional;, disse. Segundo ele, ainda não foi definida uma linha de investigação para apurar o caso dos seis jovens. ;Essas coisas são corriqueiras, acontece em todo lugar do mundo, mas esses últimos casos se diferenciam dos demais com o passar do tempo;, afirmou.

[SAIBAMAIS]Sem pistas
A estudante Fernanda Lopes, 19 anos, irmã de Divino, disse que recebeu a visita de policiais civis ontem. ;Eles me disseram que não havia pistas e queriam saber se nós tínhamos alguma informação para ajudar na investigação;, contou. Ela disse que, há 20 dias, a mãe, a diarista Mariza, não consegue se alimentar, à espera do filho.

A dona de casa Cirlene Rabelo, 42 anos, mãe de George, não desgruda do celular. Espera uma ligação do filho. Em uma cadeira de balanço em frente de casa, diz receber visita dos policiais diariamente. ;Eles têm todas as informações do meu filho. Tenho esperança de que vou encontrar ele vivo;, disse. O delegado José Luiz Martins ressaltou que a visita dos policiais é um procedimento comum. ;Nossos agentes estão frequentando os mesmos ambientes que os adolescentes costumavam ir, como escolas, e sempre conversam com os familiares;, explicou.

Ontem, a Secretaria de Segurança Pública de Goiás enviou dois delegados para ajudar na apuração em Luziânia. Na semana passada, o secretário Ernesto Roller, anunciou que seriam seis trabalhando exclusivamente no caso. O delegado regional voltou a garantir que a Polícia Civil de Goiás tem condições de elucidar o caso sem a necessidade de ajuda do governo federal.

A servidora pública Sônia Vieira, 43 anos, mãe de Paulo Victor, foi chamada ontem para prestar depoimento. Foi sua primeira convocação desde que seu filho sumiu, após sair para pagar uma conta na casa lotérica de uma movimentada avenida da cidade. ;Nem vi o delegado, só me pediram informações gerais sobre Paulo Victor;, contou.

Hoje, às 9h, está prevista uma audiência na Câmara de Vereadores do município com integrantes da CPI das Crianças e Adolescentes Desaparecidos da Câmara dos Deputados, Polícia Civil e familiares dos adolescentes. Amanhã, as mães prometem fazer um protesto na Esplanada dos Ministérios. Elas querem a Polícia Federal no caso.

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Márcio Luiz de Souza Lopes,
19 anos

Caçula dos seis filhos da dona de casa Lúcia de Souza e do servidor aposentado José Luiz Lopes, não era de fazer amigos e pouco conversava com a mãe. Vizinhos mal o conheciam. Era o único filho de Lúcia e José Luiz que ainda morava com eles. Mas, reservado, preferiu ficar em um cômodo anexo da residência, feito de tijolo e telhado de zinco, com duas portas, mas sem janelas. Parou de jogar bola dias antes de sumir porque a chuteira direita rasgou-se. Foi visto pela última vez às 18h do último dia 22, quando saiu de casa, no Parque Estrela Dalva 4, para andar de bicicleta. Ele é ajudante de serralheiro.


Flávio Augusto dos Santos,
14 anos

Vaidoso e sociável, Flávio era disputado pelas meninas no Parque Estrela Dalva 7, onde sua família reside. Desde que desapareceu, na manhã do último dia 18, a mãe atende pelo menos três ligações por dia de garotas perguntando sobre seu paradeiro. O aluno do 8; ano do ensino fundamental trabalhava à tarde como repositor de estoque em uma distribuidora de doces de Luziânia. Com os R$ 200 que ganha de salário, comprou um celular com câmera fotográfica e baixou no computador dezenas de fotos que tirou do próprio rosto. Saiu para ir a uma oficina de bicicletas no mesmo bairro e nunca mais voltou.


Divino Luiz Lopes da Silva,
16 anos

Apelidado de Manchinha, por causa de uma falha na parte de trás da cabeça, Divino é considerado o melhor jogador de basquete no time do colégio, no Parque Estrela Dalva 0. Com 1,70m de altura, jogava como pivô. O estudante da 6; série do ensino fundamental saiu de casa no último dia 13, por volta das 10h, para brincar com os amigos. Alan, um deles, disse que o viu acompanhado de David e João, com quem costumava empinar pipas na esquina de casa. Os dois, no entanto, afirmam que não estiveram com Divino no dia do desaparecimento.


George Rabelo dos Santos,
17 anos

Por R$ 20, George limpava lotes no Parque Estrela Dalva 8, localizado em uma área rural e rodeado de mato por todos os lados. Por R$ 15, cavava cisternas. Segundo familiares, é um menino trabalhador. Só não gosta de ajudar nas tarefas domésticas, conforme relato de Cirlene Gomes Rabelo, a mãe. Gosta mesmo é de jogar futebol e os amigos garantem que é bom de bola. Foi na quadra de futsal perto de casa que conheceu a namorada, de 12 anos, com quem estava havia um ano. No último dia 10, saiu de casa às 11h para encontrá-la no Parque Estrela Dalva 8. Nunca mais voltou.


Paulo Victor Vieira de Azevedo Lima,
16 anos

Antes de sair de casa, Paulo Victor sempre pedia autorização à mãe. Falava onde ia, quem o acompanharia e a que horas estaria de volta. Seus melhores amigos são: Jean, Paulo César, Eduardo e Vinícius. Obediente e pacato, gostava de passar as tardes dormindo. Não se negava, porém, a ajudar a família no trailer da mãe, que vende lanches ao lado do Hospital de Luziânia, último local onde foi visto. No dia 4, o aluno do 5; ano do ensino fundamental saiu de casa para pagar uma conta na lotérica do Parque Estrela Dalva 7. A conta foi paga, mas ninguém o viu no estabelecimento.


Diego Alves Rodrigues,
13 anos

O armário que Diego tanto pediu à mãe, no valor de R$ 300, chegou em 29 de dezembro, um dia antes de ele desaparecer do Parque Estrela Dalva 4. Até então, pendurava roupas pelo quarto. As prateleiras ainda estão embrulhadas no papelão, encostadas na parede. Fanático por informática, fazia computação às sextas e sábados e passava os fins de semana na internet, sempre com os amigos Jaílton, Dedé e Gabriel. No dia em que desapareceu, havia saído de casa para ir à oficina mecânica que fica no mesmo bairro. Deixou o estabelecimento por volta das 12h, dizendo que ia para casa almoçar. Não apareceu mais.

Garoto diz ter visto o bando
Um garoto de 12 anos, morador de Luziânia, está assutado e não esquece a cena que presenciou dentro de casa na manhã de segunda-feira. Primo de um dos desaparecidos, ele garante ter escapado de um sequestro. Quando colocado em dúvida pelos vizinhos, fecha a cara e reconta a história com detalhes.

O menino esperava a mãe, sentado em um toco de madeira na porta de casa, quando viu um Fiat Dobl; se aproximar da casa de um vizinho. Um homem teria saído do veículo, caminhado em volta da casa e se dirigido ao menino, que fugiu para os fundos de casa e trancou as portas. ;Tinha uma mulher e outro homem dentro do carro;, contou. O estranho teria batido na porta da casa do garoto e tentou abrir a porta, colocando a mão por entre a esquadria de ferro, mas não conseguiu. ;Ele estava com uma luva e o boné encobria os olhos. A Priscila, nossa cadelinha, partiu para cima e ele afastou ela com um chute;, relatou, amendrontado. Após cinco minutos, o homem misterioso voltou para o carro e saiu em disparada. O caso demonstra a apreensão e o medo que vivem os moradores do município.

Alexânia

Em Alexânia, Pollyanna de Sousa Carvalho, 14 anos, desaparecida desde 28 de dezembro, retornou para a casa dos pais domingo último. A menina está machucada e internada no hospital da cidade. Ela portava uma Carteira de Identidade falsa e uma passagem de ônibus procedente de Ituiutaba (MG). Segundo o chefe da delegacia local, Antônio Carlos Silveira, uma vizinha de 22 anos que teria levado a adolescente pode ser responsabilizada pelo desaparecimento. (DB)

Colaborou Naira Trindade

Opinião do internauta
Leitores comentaram, no site do Correio, sobre o fato de a polícia de Goiás ter recusado ajuda do DF e do governo federal no caso dos meninos desaparecidos. Confira algumas opiniões:

Gilmar Alves
;Um caso desse devia ter mais seriedade. Por que não mobilizar a PF?;

Helio Santos
;Intervenção federal já! Infelizmente, em algumas regiões do Brasil, ainda persiste essa arrogância. Quanto mais profissionais qualificados melhor e mais fácil para prender quadrilhas.;

Carlos Magalhães
;Acho que, nesse caso, toda ajuda seria bem-vinda. Ou será que discussões sobre jurisdição estão acima do desaparecimento de jovens e o desespero dos familiares?;

Francisco Sampaio
;Intervenção federal, não. Investimento, sim. Resolveria de vez essa questão de segurança.;

Marcelo Queiroz
;Acho um absurdo a Polícia de Goiás não aceitar ajuda da PF.;

Elizeu Faria
;Enquanto os policiais de Luziânia não se conscientizarem da carência de ajuda federal, esse caso jamais será solucionado. Coitados desses familiares que esperam por essa polícia.;

Gildo Souza
;Se mexerem de verdade no Entorno, vão achar mais mães aflitas com o sumiço dos seus filhos.;

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