postado em 06/03/2010 07:56
A confusão se instalou de vez. Reviravolta na casa de Capitu. Aquela ilha ficará mais povoada. Antes, a suspeita era apenas com ela. Agora, com a filha dela também. Os veterinários e biólogos não têm mais dúvida: Capitu está grávida. Deve parir entre o fim de maio e o começo de junho. A barriga aumentou mais e as tetas estão volumosas. O andar está mais vagaroso. Ela tem até ralhado menos com as filhas. E pasmem: nem quer mais saber de chamego com Luís Pires, o macaco garanhão do pedaço. Ignora-o solenemente.E recusar chamego, definitivamente, não é coisa que a guerreira quarentona costuma fazer. Aliás, todas as loucuras protagonizadas pela babuína-sagrada mais famosa do Zoo de Brasília e do país; a macaca que revolucionou a literatura animal e obrigou primatas a refazerem conceitos ; foram por causa dessa estranha mania que ela tem de gostar muito de um, digamos, chamego. Não foi à toa que a danada aprendeu a nadar ; e macacos, a rigor, não nadam, têm medo de água ; para chegar à ilha do amante. As cenas, caro leitor, eram impublicáveis.
Pois bem, além de a própria estar grávida, a filha dela, Hamuta, jovenzinha em torno de 20 anos, também emprenhou, segundo avaliação dos veterinários. Luís Pires, o macaquinho na flor da idade que veio para copular com as filhinhas de Capitu, não perdoou ninguém. Traçou a família toda ; mãe e filhas. Pimba total. ;Ele também já copulou com a Fernanda, a mais nova;, garante a curadora de mamíferos do zoológico da capital, a veterinária Clareana Souza Gelinski, 29 anos.
Por enquanto, a barriga da caçulinha ainda não deu o ar da graça. ;Retirar babuínos para fazer ultrassom é muito complicado. Isso estressa muito o animal e se ela estiver grávida pode afetar o estado geral;, explica a bióloga Paula Jotta, 26. Só resta, então, esperar que o tempo mostre a barriga. Enquanto isso, na ilha dos babuínos sagrados, é hora de espera. E muita ansiedade.
Esta história toda foi contada pela primeira vez pelo Correio, em 1998. Naquele ano, Capitu botou pra quebrar geral. Mãe cuidadosa, a babuína-sagrada vivia na sua ilha com o marido, o sisudo Otelo, e as filhas Hamuta e Fernanda. Servia ao marido com zelo extremado. Cuidava das filhas, catava piolhos nas meninas... Mas eis que um dia, para acabar com a paz daquela família, um jovem macaco (bem mais jovem que o marido Otelo) chegou pra viver numa outra ilha. O macaco, um babuíno-verde (portanto de espécie diferente dos sagrados), estava na dele, esperando uma nova companheira que se encontrava a caminho.
Capitu, um dia, foi até a beira do lago. Avistou, do outro lado, o jovem babuíno verde se exibindo. Sim, Eliseu (era esse o nome do mancebo), na flor da idade, hormônios pulando pela cabeça, corria de um lado para o outro. Capitu só matutou a cena a que acabara de assistir. Todos os dias seguintes, ela ia à beira do laguinho para apreciar Eliseu. Otelo? Desconfiara da atração da macaca pelo macaco da outra ilha. Às vezes, retirava-a dali aos tabefes. Ela, sempre ela, dava um jeito e voltava.
Ciúmes e sopapos
Eliseu percebeu a admiração da macaca por Eliseu. E se exibia ainda mais. Jovens adoram isso. Um dia, um belíssimo dia, Capitu se superou. Caiu n;água e se aventurou a nadar. Penou, bateu pernas, quis se afogar, afundou, emergiu de novo. E seguiu ; esbaforida, desconcertante, enlouquecida. Chegou sã e salva. E eis quem a esperava? Ele, Eliseu, o fogoso, sedento e virgem Eliseu.
As cenas que protagonizaram não poderão ser reproduzidas aqui. Mas foram quentes, tórridas demais. Capitu passou uma tarde em êxtase. E Otelo? Minha gente, o pobre assistiu a tudo, do outro lado da ilha. Berrava, urrava. Mas, como não sabia nadar, teve que se conformar. No fim da tarde, ela voltou. Estava dilacerada de amor. Mas voltou. Era preciso cuidar da casa, das duas filhas e dele ; o marido traído. Capitu nunca foi uma mãe omissa, justiça seja feita.
Quando despontou na ilha, naquele fim de tarde, Otelo a recebeu aos sopapos. Capitu corria, dava voltas na ilha. Eliseu, do outro lado, assistia à cena e se debatia. Corria, urrava. Queria salvá-la. Mas como, minha gente? Ninguém ali, exceto a própria, sabia nadar. Capitu adormecia, acabada da surra, mas feliz pela tarde de amor. No dia seguinte, depois das prendas domésticas, se atirava no lago e nadava em direção do amante. Essa cena se repetiu ao longo de meses.
[SAIBAMAIS]Tentaram interromper o romance. Uma pena. A direção do zoo da época trouxe, com urgência, uma jovem babuína-verde (da mesma espécie de Eliseu) para que ele se interessasse por ela e copulasse. Apostaram em muitos macaquinhos-verdes correndo pela ilha. Ledo engano. Jaqueline (este é o nome da jovem macaca que veio do Rio de Janeiro para acabar com o romance) não agradou ao apaixonado Eliseu. Ele não tomou conhecimento dela. Nem a tocou. Só tinha olhos para Capitu, a macaca que lhe ensinou os segredos do amor.
Viúva sapeca
A direção do zoo radicalizou de vez, diante da recusa de Eliseu em aceitar a nova pretendente. Alegando a conservação e perpetuação da espécie, retirou Eliseu dali. Levou-o para uma ilha onde Capitu jamais conseguiria chegar a nado. Eliseu entrou em profunda depressão. Parou de comer. E pegou uma forte pneumonia. Morreu em 15 dias, naquele mesmo 1998. Jaqueline? Voltou para o Rio de Janeiro, do jeito que chegou à terra de JK: puríssima. Coitada!
Sem Eliseu, Capitu seguiu sua vida. Voltou ao lar. Ainda teve mais um filho de Otelo. Nasceu Tadeuzinho, o caçula. De vez em quando, ficava na beira do lago, olhado para a ilha de Eliseu, à procura dele. Nunca mais nadou. Abandonou esse esporte de vez. Em 2002, Otelo, velho e abatido, morreu. Capitu, pela segunda vez, se tornara viúva: do amante e do marido. Dedicou-se apenas aos cuidados dos filhos. Tornou-se severa com educação das meninas. Tadeuzinho foi morar num zoológico de São Paulo.
Quando ela vivia seu lado mais comportada, eis que o zoo trouxe ; novamente para perpetuação da espécie ; um jovem macaco-sagrado. Objetivo? Copular com as filhinhas da matriarca. Ninguém mais acreditava na volúpia de Capitu. Bem feito. Se queriam mesmo a continuação da espécie, agora o zoo será povoado. Capitu e Hamuta estão grávidas. Só resta saber se Fernanda também está prenha. ;Ela é demais. Cuido dela há sete anos e nunca tinha visto uma macaca como essa;, extasia-se o tratador Ésio Mendonça, 49 anos. Raul Gonzales, 54, diretor do zoo, vibra: ;É sinal de que os bichos estão cumprindo seu papel na conservação. Luís Pires veio pra isso;. Então, agora aguenta...
Longe da ilha, vive hoje empalhado no Museu de Zoologia do Zoo, o pobre Eliseu. Na manhã de ontem, ele foi levado até a ilha de Capitu pela coordenadora Grazielle Rodrigues, 27. Capitu, claro, não o reconheceu. Olhou de longe e seguiu. Aquele, definitivamente, do jeito que está ali, não é o macaquinho com quem viveu momentos inesquecíveis. Deixa pra lá. A história segue... Ela vai parir. E, de quebra, ainda ganhará o primeiro neto. Nunca mais haverá outra como Capitu, a macaca que é gente. Esta será sempre uma das minhas melhores histórias.