Carioca de nascimento, o ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, tem um carinho especial por Brasília, cidade aonde chegou aos nove anos. Primeiro funcionário de carreira a assumir o cargo, Barreto foi secretário-executivo dos ex-ministros Márcio Thomaz Bastos e Tarso Genro, e hoje tem em mãos pelo menos quatro grandes problemas ligados diretamente ao Distrito Federal: o desaparecimento de jovens em Luziânia, a violência no Entorno, a crise política desencadeada após a Operação Caixa de Pandora e a possibilidade de intervenção federal no DF. Sobre o último tema, o ministro ressalta que a situação em Brasília pode ser considerada normal. ;A crise não contaminou o sistema de segurança ou de gestão do Governo do Distrito Federal, embora, é claro, a instabilidade administrativa tende a provocar uma certa ineficiência na execução dos serviços públicos;, diz Barreto, em entrevista exclusiva ao Correio.
Segundo ele, o governo federal vem acompanhando a situação de perto, mas a decisão sobre o assunto é do Supremo Tribunal Federal (STF). Cabe ao seu ministério apenas redigir o decreto presidencial e apontar o interventor. O governo federal tem adotado cautela em relação ao tema, que, caso seja adotado, pode afetar outros setores. ;Brasília tem peculiaridades, como funcionamento de embaixadas, administrações diretas, indiretas e autárquicas que não podem sofrer qualquer prejuízo no seu funcionamento em razão de uma crise política no DF;, diz o ministro da Justiça.
Outra questão que preocupa o ministro da Justiça é o desaparecimento de adolescentes em Luziânia, assunto principal do encontro que Barreto terá amanhã com o governador de Goiás, Alcides Rodrigues (PP), em Goiânia. O ministro afirma que existem alguns avanços nas investigações que podem indicar os primeiros indícios do que houve com seis jovens na cidade do Entorno. A região, segundo Barreto, passou a ser um dos focos de atenção do governo federal, em função do avanço da criminalidade, causado pela superpopulação. A União, nos dois últimos anos, conforme o ministro da Justiça, investiu R$ 58 milhões em equipamentos para as polícias atuarem no Entorno. A seguir, os principais pontos da entrevista de Luiz Paulo Barreto
ENTREVISTA
Luiz Paulo Barreto
INTERVENÇÃO
;O governo federal tem acompanhado de perto esse assunto. O Ministério da Justiça é responsável pela ordem jurídica, política e social, no que diz respeito ao governo federal e às instituições que funcionam no Brasil. Brasília tem peculiaridades, como funcionamento de embaixadas, administrações diretas, indiretas e autárquicas que não podem sofrer qualquer prejuízo no seu funcionamento em razão de uma crise política no DF. Se esta crise política contamina algum tipo de trabalho, colocamos em risco a integralidade da gestão brasileira, e o Ministério da Justiça não permitirá que isso aconteça. Estamos acompanhando o sistema de segurança pública, verificamos que, por enquanto as estruturas funcionam, as instituições estão funcionando, há uma calma social em Brasília. Nós vimos agora, com a visita da secretária de Estado americana, Hillary Clinton, que passou em paz e tranquilidade pela cidade.;
O PROCESSO
;Temos que acompanhar o assunto de perto apenas para que se mantenha essa ordem jurídica, pública e social em Brasília. Quanto à decisão do pedido de intervenção, o governo federal apenas aguarda uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que avalia se cabe ou não uma intervenção. Se o fizer, caberá ao Ministério da Justiça auxiliar o presidente da República na redação de um decreto, na forma e na extensão da intervenção e na escolha de um interventor para a tarefa. Quanto à necessidade de uma intervenção, é competência exclusiva do Poder Judiciário, e no Brasil está entregue à mais alta Corte que é o STF, que tem competência, maturidade, sensibilidade para avaliar um tema como este.;
SITUAÇÃO ATUAL
;A Constituição foi sábia ao deixar sob competência da Suprema Corte brasileira a avaliação de uma situação grave, que é a intervenção em um estado federado. É uma situação de exceção, em último caso. Mas ela é prevista na Constituição justamente quando se percebe uma falência nas estruturas políticas e de gestão no estado federado. Essa falência em Brasília é mais sensível porque é diferente de qualquer unidade da Federação. Qualquer problema de gestão do Executivo e Legislativo em Brasília pode acabar comprometendo, contaminando o sistema federal que funciona na capital do país. O Ministério da Justiça acha que a ordem jurídica está mantida, a ordem social também. Estamos vendo manifestações quase todas pacíficas, sem nenhum tipo de tumulto. As instituições estão funcionando em Brasília normalmente, a segurança pública está em ordem. Neste momento, estamos em uma crise ainda restrita ao aspecto político. A crise não contaminou o sistema de segurança ou de gestão do Governo do Distrito Federal, embora, é claro, a instabilidade administrativa tende a provocar uma certa ineficiência na execução dos serviços públicos.;
CAIXA DE PANDORA
;A investigação está em curso. O inquério n; 650 está em andamento. Cada vez que ele revela um fato novo, exige uma linha de apuração complementar. O intuito do Ministério Público, do Judiciário e da Polícia Federal, que estão trabalhando em harmonia, é para se chegar à verdade do que aconteceu, do que foi denunciado, o que levou as pessoas em Brasília a serem filmadas no manuseio estranho e indevido de dinheiro em grande quantidade, supostamente dinheiro que não é legal e que pode ser fruto de um esquema de corrupção montado na capital do país. Isso é muito grave, muito sério, e certamente não pode ficar sem uma apuração detalhada e sem uma identificação de cada um dos responsáveis para que o processo seja instaurado e as pessoas tenham seu direito à defesa. Mas o importante, neste momento, é chegar ao esclarecimento dos fatos que foram mostrados de maneira muito rica em termos de vídeos e aúdios, que chocaram a população do Distrito Federal e que exige uma apuração ampla, completa e profunda dos acontecimentos."
LUZIÂNIA
;É um problema que ainda está sem solução. Há um trabalho forte da Polícia Civil de Goiás na elucidação desse crime e a Polícia Federal está dando apoio de forma complementar. Já houve reunião de inteligência das polícias, houve oferecimento do Ministério da Justiça de meios, como sistema tecnológico, para ajudar na investigação dos desaparecimentos, há desde helicópteros para ajudar nas buscas até monitoramento telefônico que permita uma apuração mais ampla. A PF esteve na casa de cada uma das famílias dos desaparecidos, conversou com as mães, fez um levantamernto da situação pretérita ao desaparecimento e estamos em um bom nível de diálogo. Se necessitar de mais policiais federais, mais equipamentos tecnológicos, a PF vai fornecer, porque é importante saber o que aconteceu. A falta de notícias sobre os desaparecimentos cria uma certa angústia na população do Distrito Federal e Entorno porque não se sabe o que aconteceu. Percebo que em Luziânia há um certo clima de temor e existem mães preocupadas com que isso também ocorra com seus filhos.;
A INVESTIGAÇÃO
;Há algumas linhas de investigação que vêm sendo trabalhadas pela polícia. Houve alguns avanços obtidos que, mantidos em sigilo, vão propiciar o mais rápido desenrolar das investigações. Há um progresso, mas não existe um fio condutor que leva a uma explicação preliminar do que aconteceu. A polícia não está descartando nenhuma linha e trabalha, por exemplo, com tráfico de pessoas para imigração ilegal, trabalho escravo, exploração sexual. Está sendo investigado se existe alguma relação entre as pessoas que desapareceram. Esperamos que, rapidamente, tenhamos notícias de algum indício ou caminho para saber o que aconteceu.;
ENTORNO
;Na segunda-feira teremos uma reunião com o governador de Goiás, Alcides Rodrigues, e toda sua equipe de segurança pública. É claro que, além de reforçar e reiterar a parceria com o estado, quero discutir a questão do Entorno. Buscar com o governo alguns projetos para 2010 que permitam a melhoria da segurança pública na região, que tem problemas graves de superpopulação, de violência e criminalidade. Por isso temos dado uma atenção especial à região. O Ministério da Justiça, em 2008 e 2009, construiu, em Brasília e no Entorno, 120 postos comunitários e liberou R$ 58 milhões só em equipamentos para a polícia. A presença da polícia por si só tem inibido a ocorrência de criminalidade porque há uma integração com a população, que passa a ver o posto comunitário como uma referência da presença do Estado brasileiro. Isso aconteceu, por exemplo, no Itapoã, onde a presença dos postos reduziu em 50% a incidência de crimes. Eu quero ampliar essa política no Entorno, além de ativar a Força Nacional para que ela consiga agir mais na região de forma ostensiva para inibir a ocorrência de criminalidade.;