Helena Mader
postado em 08/03/2010 08:31
Mais de 15 anos depois da desapropriação de uma área de 600 hectares, entre Sobradinho e Planaltina, o assunto se transformou em uma batalha judicial, que envolve a disputa por uma indenização de mais de R$ 200 milhões. O terreno foi desapropriado em 1994 para a criação de um ponto de captação de água da Companhia de Saneamento Ambiental de Brasília (Caesb) ; usado para o abastecimento da capital federal. De lá para cá, o suposto dono da área foi declarado falsário pelo Ministério Público do Distrito Federal e pela Justiça e a propriedade das terras voltou para as mãos dos antigos herdeiros. Essa história que parece não ter fim ganhou agora novos capítulos. A Justiça reinseriu o suposto falsário na ação e proibiu os herdeiros de entrarem no processo, dando continuidade pela luta por essa indenização milionária. Para criar a estação de captação Corguinho, às margens da BR-020, a Caesb desapropriou uma área equivalente à do futuro Setor Noroeste. O terreno foi classificado como zona de proteção de mananciais e, por isso, não pode mais ser ocupado nem para fins urbanos, nem mesmo para finalidade rural, já que qualquer intervenção pode comprometer a qualidade da água. O Decreto 16.156/94, assinado pelo então governador Joaquim Roriz, tornou as terras públicas. Para a conclusão do processo, faltava apenas o pagamento da indenização a Sebastião Falcão Trindade, que se apresentava como dono do lote e tinha à época o registro em cartório de toda a área.
Mas, em 2001, o Ministério Público do Distrito Federal entrou com uma ação civil pública, acatada posteriormente pela Justiça, pedindo o cancelamento das matrículas e a nulidade da escritura de compra e venda apresentada por Sebastião Falcão Trindade. O pedido foi baseado em uma perícia do Instituto de Criminalística. ;O Laudo Documentoscópico 9557/2000 concluiu categoricamente pela falsidade material da aludida escritura pública;, justificou o juiz Waldir da Paz Almeida, que determinou o cancelamento da matrícula e da escritura das terras, em 2003. A Polícia Civil concluiu que o caso era mais um em meio à enxurrada de denúncias de grilagem e falsificação de documentos, comuns na década de 90.
O começo
As terras em questão pertenciam originalmente à antiga Fazenda Serandy, de propriedade dos irmãos Valeriano Leite da Fonseca e Aureliano Carlos da Fonseca. Eles adquiriram a gleba de 1.075 hectares em 1919. Em 1994, quando o espólio tentou registrar a área para transferi-la para a empresa Martinez Empreendimentos Imobiliários ; de propriedade de Fábio Starace Fonseca, um dos herdeiros ; os advogados descobriram que as terras teriam sido vendidas para Orlando Benatti em 1945 e, posteriormente, revendidas para Sebastião Falcão Trindade.
Depois de descobrir essa transação até então desconhecida, os herdeiros entraram com uma ação de anulação de registro de imóveis. Mas com medo de que o processo se arrastasse por muito tempo, acabaram fazendo um acordo com Sebastião Falcão Trindade, pelo qual teriam direito a uma área de quase 500 hectares. Para isso, pagaram ao réu R$ 300 mil. Na área destinada aos herdeiros, foi implantado o condomínio Alto da Boa Vista, que foi regularizado no ano passado. Os 600 hectares restantes permaneceram sob o domínio de Sebastião e, logo depois, foram desapropriados.
Com a ação do Ministério Público do DF e com a decisão da Justiça, a matrícula e a escritura de toda a área foram canceladas, ou seja, as terras teriam que voltar para as mãos dos herdeiros de Valeriano e Aureliano Fonseca. O pagamento da indenização pela desapropriação foi suspenso. Logo depois disso, Fábio Starace Fonseca, detentor de 98% dos direitos hereditários da área, ingressou como parte na ação de indenização contra a Caesb, aberta inicialmente por Sebastião Falcão Trindade. Fábio e os advogados da sua empresa exigiam na Justiça o pagamento de valores atualizados. Em 2008, a 7; Vara de Fazenda Pública excluiu Sebastião da ação e incluiu os herdeiros.
Em junho do ano passado, com a criação da Vara de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, o caso foi remetido para o juiz titular dessa vara, Carlos Divino Rodrigues, que marcou uma audiência para debater o caso. O magistrado entendeu que Fábio Fonseca não teria legitimidade para ingressar no processo de pedido de indenização porque ainda não tem o registro formal da área. Mesmo como herdeiro legítimo, ainda falta a averbação da reserva legal até que o cartório entregue os documentos.
Em novembro do ano passado, a Vara de Meio Ambiente e Desenvolvimento Fundiário retirou Fábio Fonseca e os demais herdeiros do processo. ;Essa decisão é absurda, uma aberração. O juiz agiu com parcialidade;, reclama o advogado da Martinez Empreendimentos e dos herdeiros, Márcio Carvalho. Além de recorrer dessa decisão, o advogado entrou com um pedido de exceção de suspeição, pedindo uma troca de juiz no caso. Carlos Divino se declarou imparcial para continuar à frente do processo e cabe agora uma decisão superior no Tribunal de Justiça do DF.