Cidades

Câmara evita empossar preso

Embora a Procuradoria-Geral da Casa Legislativa afirme ser legal Geraldo Naves assumir o mandato de deputado, a Mesa Diretora protela a convocação do jornalista, que está há quase um mês na Papuda

postado em 11/03/2010 08:39

Reguffe: Os distritais não querem passar pelo constrangimento de dar posse a um colega preso. Apesar da divulgação de parecer da Procuradoria-Geral da Câmara Legislativa a favor do direito de Geraldo Naves (DEM) em assumir a vaga de titular, os deputados evitam publicar a convocação do suplente. Ela poderia ter ocorrido logo em seguida à renúncia de Júnior Brunelli (PSC), no último dia 2. Pelo regimento interno da Casa, o prazo máximo para essa chamada é de 48 horas. Mas, para adiar um possível desgaste político, a Mesa Diretora ainda não resolveu o que fazer.

A opinião da Procuradoria no caso de Geraldo Naves só aumentou a tensão sobre o assunto na Câmara. Os distritais estão divididos entre os que não aceitam, em hipótese alguma, a convocação do substituto encarcerado e aqueles a favor da publicação do ato, mesmo que a consequência possa precipitar a posse de um deputado em circunstâncias inusitadas. As duas correntes, no entanto, se chocam com os interesses do pretendente a distrital.

Integrantes da Mesa Diretora do Legislativo: caberá aos quatro distritais decidir sobre a convocação de NavesO suplente (leia memória) não abre mão da vaga de titular. Mas vai usar todo o tempo que tiver para não ser o primeiro deputado em Brasília a tomar posse de dentro da Papuda. Pretende, antes,se livrar da cadeia. Na tarde de terça-feira, a defesa do político entrou com pedido de relaxamento da prisão preventiva. O recurso ainda não foi julgado. ;Se ele tem um prazo previsto no regimento interno, por que não usá-lo? Ele quer retornar à Câmara como saiu de lá, limpo;, diz o advogado Ronaldo Cavalcanti. Geraldo Naves teve a prisão preventiva decretada por suspeita de participação na suposta tentativa de suborno do jornalista Edson Sombra. A denúncia também levou à prisão José Roberto Arruda e mais quatro assessores próximos ao governador afastado.

;Não é justo;
O presidente da Câmara Legislativa, Cabo Patrício (PT), é um dos que não concorda em dar posse a Naves. Por isso, até hoje não autorizou que a convocação fosse publicada no Diário da Câmara Legislativa, momento em que se inicia a contagem do prazo de 30 dias, prorrogáveis por igual período, para que o substituto assuma o cargo. ;Não é justo a gente passar por esse tipo de constrangimento. É um desgaste que não pertence à Câmara Legislativa. Se ele quer a vaga, deveria fazer uma provocação à Justiça;, sugere o chefe do parlamento local.

Apesar de o presidente da Câmara ser contrário à convocação, o assunto será decidido em conjunto pela Mesa Diretora. E provavelmente ele será voto vencido entre os colegas do comando. Milton Barbosa (PSDB), Batista das Cooperativas (PRP) e Raimundo Ribeiro (PSDB) acham que a chamada do suplente deve ser formalizada. Para que as opiniões sejam confrontadas, é necessária uma reunião da Mesa Diretora, prerrogativa de Cabo Patrício, que chefia o Legislativo. O encontro não tem data marcada.

Próximos passos
O consenso entre os integrantes da Mesa Diretora passará pela forma como se dará os passos seguintes à convocação de Naves. Os distritais, mesmo aqueles favoráveis à publicação do ato no Diário da Câmara, não querem pedir a autorização de custódia ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) antes de o deputado confirmar oficialmente o interesse em ocupar a vaga na Câmara. A permissão do STJ é uma exigência legal para a posse, já que Naves teria de ser mantido preso sob a responsabilidade dos distritais.

Nesse estágio, a Mesa Diretora deverá recorrer ao parecer da Procuradoria-Geral que apesar de ter opinado a favor da convocação de Naves não vinculou o ato ao pedido de autorização na Justiça. O procurador-geral Fernando Nazaré apenas cita a necessidade de consulta ao STJ sem determinar o agente responsável pela iniciativa nem o momento que a mesma deva ser tomada. O procurador comenta que, na hipótese de a autorização do Judiciário não sair, a ;Câmara deverá chamar o suplente seguinte da ordem de convocação;. Esse nome seria o de Washington Mesquita, que se recusou a votar no processo de impeachment de Arruda com o argumento de que a vaga pertencia por direito a Geraldo Naves.


Memória
Ascensão e queda
O jornalista Geraldo Naves ; ex-apresentador do programa policial Barra Pesada ; é o segundo suplente do DEM na Câmara Legislativa. Ele assumiu a vaga de deputado distrital várias vezes, a última das quais em 22 de dezembro do ano passado, quando Paulo Roriz voltou para a Secretaria de Habitação. Em 11 de janeiro, Naves conseguiu um posto importantíssimo dentro da Casa. Foi eleito presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), então encarregada de analisar a admissibilidade dos pedidos de impeachment de José Roberto Arruda (sem partido).

A escalada de poder de Geraldo Naves não parou por aí. Em 27 de janeiro, Alírio Neto deixou o bloco do PMDB e, com isso, a presidência da CPI da Codeplan, que investigaria denúncias de corrupção no Executivo nos últimos 19 anos. O bloco peemedebista indicou Naves para integrar a comissão. A derrocada do parlamentar começou poucos dias depois, em 5 de fevereiro. Ao se ver envolvido no escândalo da tentativa de suborno do jornalista Edson Sombra, Naves saiu das duas comissões e pediu afastamento da Câmara. Acabou preso em 12 de fevereiro e, desde então, está na Papuda.



Dispensa de licença
Uma proposta de emenda à Lei Orgânica do Distrito Federal apresentada ontem à Mesa Diretora da Câmara Legislativa sugere que a Justiça tenha o poder de processar o governador ou o vice sem antes pedir autorização aos distritais. A mudança, se for aprovada na Casa, pode atropelar o rito previsto para a abertura de processo contra José Roberto Arruda e encurtar o prazo para que ele passe a ser réu em ações penais decorrentes das investigações da Caixa de Pandora. Com as regras atuais, a estimativa para que a Câmara permita a abertura desses processos é de um mês.

A consulta à Câmara Legislativa em caso de processo contra o governador está amarrada no Artigo 60 da Lei Orgânica. Para alterar o item, é necessária a aprovação de uma emenda por maioria absoluta (dois terços) dos deputados, ou seja com a anuência de, pelo menos, 16 parlamentares. Na tarde de ontem oito distritais se mostraram favoráveis ao projeto.

Milton Barbosa (PSDB), Érika Kokay (PT), Cabo Patrício (PT), Aylton Gomes (PR), Eliana Pedrosa (DEM), Alírio Neto (PPS) e Rogério Ulysses (PSB) assinaram proposta de autoria do deputado José Antônio Reguffe (PDT), sugerindo a alteração na legislação do DF. ;Quando um cidadão comum é acusado de algum crime, é processado pelo poder público. Com o governador não deve ser diferente. O Brasil não pode ser um país de dois pesos e duas medidas;, considerou Reguffe.

Outros parlamentares, como o de Chico Leite e de Paulo Tadeu, ambos do PT, se posicionam a favor da proposta. Chico Leite já havia, inclusive, manifestado interesse em elaborar proposta com o mesmo teor. Assim, faltariam em tese os votos de seis distritais para garantir a aprovação da emenda.

Regimento
Uma vez aprovada a revogação do Artigo 60, a mudança tornaria sem efeito o rito processual que se iniciou a partir da chegada do pedido do STJ para processar Arruda. Com a provocação da Justiça, o regimento interno da Câmara estabelece que a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa se manifeste sobre o pedido. Para tanto, a CCJ é obrigada a dar um prazo de defesa ao acusado, no caso, Arruda.

Como foi notificado ontem pela procuradora Patrícia Vieira, o governador afastado e preso terá 10 dias para se pronunciar. Caso não o faça, a própria comissão designará um defensor. Depois, ainda há mais um período de 10 dias para que o relator do caso elabore um parecer. Há uma tese defendida por juristas na Câmara de que a emenda ao Artigo 60 não valeria para a situação de Arruda, pelo princípio da retroatividade, segundo o qual alterações em matérias de natureza penal não podem prejudicar o réu. (LT)




Decreto emperrado
Geraldo Naves não abre mão da vaga na Câmara: defesa entrou com pedido de relaxamento da prisão do suplente; Antes da proposta de emenda à Lei Orgânica, os deputados já haviam sugerido um projeto de decreto legislativo autorizando o STJ a processar o governador afastado e preso José Roberto Arruda no âmbito do Inquérito n; 650. Mas a proposta acabou emperrada em função da polêmica sobre sua validade prática. O projeto de decreto legislativo pode ser aprovado com o mínimo de sete votos, por maioria simples. Mas o expediente é usado, em geral, para assuntos de natureza interna da Câmara e não tem força de lei. Portanto, a iniciativa foi encarada como uma demonstração de vontade política, mas sem o peso necessário para evitar o rito de consulta à Câmara.



Inconstitucionalidade
Tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra o Artigo 60 da Lei Orgânica do DF, que determina que o governador distrital só pode ser alvo de ação penal mediante autorização da Câmara Legislativa. A Adin ainda não foi julgada.



O que diz a lei
Embora a Procuradoria-Geral da Casa Legislativa afirme ser legal Geraldo Naves assumir o mandato de deputado, a Mesa Diretora protela a convocação do jornalista, que está há quase um mês na PapudaO argumento da Procuradoria-Geral da Câmara Legislativa para se posicionar a favor da convocação de Geraldo Naves ; mesmo estando o suplente preso na Papuda ; se baseia no inciso V, Artigo 55 da Constituição Federal, segundo o qual o deputado perderá o mandato quando decretar a Justiça Eleitoral. Como interpretou o procurador Fernando Nazaré, a prisão preventiva de Naves ;não interfere no âmbito eleitoral e nem implica perda dos direitos políticos;. Assim, ;enquanto não houver determinação de afastamento, ele poderá permanecer como deputado distrital;, considerou Nazaré em seu parecer. O inciso VI do mesmo artigo constitucional ainda estabelece que o impedimento para assumir o mandato em virtude de decisão judicial exige o trânsito em julgado da decisão, o que não condiz com a prisão preventiva.

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