Cidades

Para atrair os clientes, postos reduzem preços, parcelam pagamentos e oferecem até viagens

Na última semana, o valor do litro de derivado de petróleo caiu de R$ 2,73 para R$ 2,25 e o álcool, de R$ 2,35 para R$ 1,66

postado em 23/03/2010 08:47
Na tentativa de reconquistar clientes, donos de postos de combustíveis do Distrito Federal baixam os preços, anunciam parcelamento em seis vezes no cartão de crédito, aceitam cheques pré-datados para 30 dias e oferecem até viagem a Caldas Novas (GO) para quem acumular R$ 1 mil em notas fiscais. O litro da gasolina, que no início do mês custava R$ 2,73 na maioria dos postos, chegou a R$ 2,25 na última semana. O valor do álcool despencou de R$ 2,35 para R$ 1,66 em alguns estabelecimentos.

As promoções provocam uma cena rara nos últimos meses: fila de carros para abastecer. Após aplicar aumentos sucessivos nas bombas, empresários do setor se mostram dispostos a atrair motoristas. Espalham faixas com a nova tabela de preços e, para garantir o movimento, treinam os frentistas a informar que não sabem até quando os valores atuais serão mantidos. O recuo nas vendas nos dois primeiros meses deste ano preocupou os donos de postos, segundo funcionários ouvidos pelo Correio.

Dono da Rede Gasol, a maior do DF, Antônio Matias justifica a queda dos preços como resultado da livre concorrência. ;Vendo pelo preço que achar que devo vender;, diz. A Gasol possui 91 postos, quase um terço do total. Acostumado a cobrar o mesmo valor em todas as unidades, Matias se viu obrigado a variar o litro da gasolina entre R$ 2,39 e R$ 2,45, e o do álcool entre R$ 1,85 e R$ 1,99. ;Se não tem clientes, o jeito é baixar o preço para vender. Mas não tem nada a ver com pressão popular;.

Mutreta
Matias desconfia de quem está cobrando mais barato que ele. ;Tem mutreta no meio;, acusa, sem entrar em detalhes. No posto Auto Shopping da 111 Norte, a gasolina custa R$ 2,29 e o álcool, R$ 1,66. O cliente pode parcelar o pagamento em três vezes no cartão Visa e em seis vezes, no Mastercard. ;Não é promoção, é guerra;, define o dono do posto, que não quis se identificar. A Rede Auto Shopping tem 12 postos no DF. Mais dois serão inaugurados em breve.

A rede conhecida como Braga também tem 12 postos espalhados pelo DF. Em um deles, na Estrutural, cartões de crédito e cheques não são mais aceitos. Para pagar R$ 2,29 pelo litro da gasolina e R$ 1,79 pelo litro do álcool, o cliente tem que optar pelo dinheiro ou pelo cartão de débito. Quem acumula R$ 1 mil em notas pode desembolsar mais R$ 140 e ganhar três dias de hospedagem em um hotel de Caldas Novas, com direito a quatro acompanhantes.

O autônomo Carlos Eduardo Soledade, 27 anos, aproveita para abastecer com os preços mais baratos, mas diz não acreditar na continuidade das promoções. ;É tudo combinado. Eles abaixam, deixam a gente feliz e depois aumentam de novo;, prevê. ;Não sabemos até quando vai ficar esse preço. Eu já enchi logo meu tanque;, emenda o servidor público Antônio Carlos Vilarins, 55, que pagou R$ 2,29 pelo litro da gasolina. ;Melhorou. Semana passada estava R$ 2,73;, compara.

Carlos Recch, dono de um posto no centro de Taguatinga, acredita que a tal guerra de preços é, na verdade, uma estratégia das grandes redes para quebrar os pequenos empresários. ;Ninguém está fazendo isso de graça. Eles querem controlar o mercado de vez;, analisa Recch, que presidiu o sindicato da categoria durante 11 anos e hoje nem é mais filiado. ;As grandes redes não quebram: compram mais barato e vendem mais barato. Já eu vou ter que fechar as portas se continuar assim;, completa.

Abuso
Para Charles Guerreiro, coordenador do Movimento contra a Cartelização dos Combustíveis do DF, as promoções provam que há preços abusivos no DF. ;Eles podem vender mais barato. Está claro que existe uma gordura de lucro;, sustenta. Cerca de 14 mil adesivos da campanha foram distribuídos desde novembro do ano passado. ;Provocamos uma briga entre eles. Vamos continuar atentos. Se os preços voltarem ao patamar anterior, intensificaremos os boicotes;, promete.

Está marcada para a próxima sexta-feira uma reunião de integrantes do movimento com o governador em exercício, Wilson Lima. Na pauta, a redução da carga tributária incidente sobre o preço dos combustíveis e a lei distrital que proíbe a instalação de postos em supermercados. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello pode derrubar essa lei a qualquer momento. Mas o GDF teria a opção de se antecipar e apresentar um projeto de lei revogando a legislação em vigor.

SUSPEITA DE CARTELIZAÇÃO
A Secretaria de Direito Econômico, ligada ao Ministério da Justiça, investiga desde novembro do ano passado denúncias de formação de cartel no DF. Em 2003, a prática criminosa de combinação de preços foi comprovada durante uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara Legislativa. O Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) também apura se os preços praticados nos postos de Brasília são abusivos. Ontem, o presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Combustíveis Automotivos e de Lubrificantes do DF (Sinpetro-DF), José Carlos Ulhôa, não foi localizado pela reportagem. Ulhôa não atendeu a ligação e a assessoria da entidade não respondeu o e-mail enviado.

"Se não tem clientes, o jeito é baixar o preço para vender. Mas não tem nada a ver com pressão popular"
Antônio Matias, dono da Rede Gasol


"Ninguém está fazendo isso de graça. Eles querem controlar o mercado de vez"
Carlos Recch, ex-presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo

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