postado em 03/04/2010 08:36
A matemática dos bancos de escola tem a fama de ser uma disciplina difícil, por envolver árduos cálculos e raciocínios, e abstrata, já que muitas vezes é ensinada às crianças e adolescentes de forma dissociada da realidade que os cerca. No Centro de Ensino Fundamental Juscelino Kubitschek (CEF JK), que fica no condomínio Mestre D;Armas, em Planaltina, o professor Nilson Carlos dos Santos, 38 anos, conseguiu subverter esses conceitos entre seus alunos. Para isso, usou um material bastante simples: o bambu, abundante na chácara onde mora na região. Cilíndricos, selados nas extremidades e ocos por dentro, os talos da planta podem ser facilmente transformados em cofres naturais. Para isso, basta fazer, no topo, uma abertura grande o suficiente para depositar moedas. Trabalhados dessa forma, os recipientes foram entregues às crianças do CEF JK, para que depositassem suas economias. A partir daí, operações de adição, subtração e multiplicação deixaram de ser apenas de números no papel. Começaram a corresponder a algo concreto, a uma empreitada pessoal de cada aluno.O projeto, batizado de Bambu Real, foi implantado em meados de julho do ano passado por Nilson dos Santos, que leciona ciências naturais além de matemática, e por um colega que deixou a escola, o pedagogo Alexsandro Domingues. Na ocasião, alunos de duas turmas de terceira série passaram meses depositando pequenas quantias nos bambus, com o apoio dos familiares. Uma turma fez a experiência por seis meses. A outra começou mais tarde, em outubro de 2009, e participou por três meses. Enquanto faziam poupança, as crianças discutiam em sala de aula sobre o destino do dinheiro e recebiam noções de economia doméstica.
;Falamos sobre valor da conta de água, da conta de luz. Cada um teve que pesquisar o valor das contas da sua casa. Comparamos, discutimos sobre maneiras de economizar. As crianças ensinaram aos pais;, conta o professor Nilson dos Santos. Ele diz que houve um bom envolvimento das famílias. Além de contribuírem para acumular receita nos cofrinhos de bambu, pais e mães aceitaram entrar na discussão acerca de como cortar gastos no lar e, especialmente, evitar o desperdício de recursos como água e energia. Os estudantes também faziam planos sobre como aplicar o dinheiro do cofrinho quando terminasse o período letivo, data marcada para eles serem abertos. ;Discutimos, além da economia doméstica, a economia sustentável. Foi muito bem aceito. Muitas mães vieram me procurar querendo cofrinhos para os outros filhos, que não estavam na terceira série;, afirma Nilson.
Nos últimos dias de aula, os cofres foram serrados e o montante reunido por cada aluno, contabilizado. Eles tiveram que escrever um relatório sobre como tinham obtido suas economias e sobre como pretendiam utilizá-las, levando em conta as noções de consumo responsável e de não desperdício adquiridas em sala de aula. O dinheiro foi levado para casa.
Moderação até mesmo nas férias
As economias de muitas crianças sobreviveram ao período de férias, mostrando que a didática dos cofrinhos de bambu atingiu seus objetivos. Danielle Nunes, 9 anos, integrante da turma de terceira série que aderiu tardiamente ao projeto, acumulou R$ 25 em três meses. Gastou R$ 4 durante as festas de fim de ano, e iniciou o ano letivo de 2010 dona de um capital de R$ 21. O motivo do gasto? ;Saí com uma amiga da minha mãe e ela me comprou uma coisa para comer. Quando eu quis pagar, ela disse que era presente, mas eu dei o dinheiro mesmo assim. Aí, minha mãe disse para ela aceitar, porque era projeto da escola;, conta, mostrando-se uma devedora conscienciosa. Agora, Danielle pretende continuar poupando até ter R$ 100, quantia mínima necessária para abrir uma conta na Caixa Econômica Federal. ;Conversei com meu pai, quero guardar o dinheiro e ganhar um Poupançudo;, conta, referindo-se aos bonequinhos promocionais dados como brinde pela instituição financeira.
David Cardoso Caetano, 9 anos, teve total apoio do pai, da mãe e da irmã mais velha e conseguiu acumular R$ 200. Destes, restaram R$ 58. Os gastos feitos foram todos solidários. O menino destinou R$ 5 para o irmão mais novo comprar um lanche, R$ 20 para compras do salão de beleza da mãe e o restante como ajuda de custo para a irmã pagar a faculdade. ;Eles vão me ajudar de novo e este ano vou guardar. Só gasto se for importante;, afirma o garoto.
Danielle e David continuarão a ter o apoio da escola para levar seus planos adiante. Agora alunos da quarta série do ensino fundamental, eles voltaram a ganhar cofrinhos de bambu. É que o professor Nilson dos Santos conseguiu expandir o projeto. Este ano, 300 alunos das três turmas de terceira e três de quarta série vão participar. ;Conversei com a direção e com os outros professores, e vamos trabalhar em conjunto;, afirma. O educador quer ainda levar a experiência para o Centro Educacional Pompílio, também em Mestre D;Armas, onde dá aulas para jovens e adultos à noite. ;Muitos dos meus alunos da oitava série lá trabalham, pagam contas. Para eles, será ainda mais complexo e interessante;, diz.
Além disso, este ano, o Projeto Bambu Real terá um viés adicional no CEF JK: o das diversas maneiras de aproveitamento da planta. ;Já começamos a discutir isso no ano passado, no embalo da questão da economia sustentável, mas vamos aprofundar. Em 2009, fizemos porta-lápis com os talos de bambu que não serviam para cofres. Este ano, peguei a serragem que sobrou do corte lá na chácara e misturei com água e cola, para fazer papel. Usaremos tábuas para prensar e o mimeógrafo daqui da escola.; Nilson ressalta que o bambu, por ser da família das gramíneas, cresce de novo espontaneamente, sem precisar ser replantado.
As crianças e o dinheiro
A maneira como as crianças se relacionam com o dinheiro vem da observação da dinâmica doméstica. Procure dar o exemplo de consumo responsável.
Desde cedo, deve ser mostrada a diferença entre o consumo por necessidade e aquele para satisfazer um desejo.
Incluir a criança no planejamento econômico familiar ajuda na aquisição de noções básicas de economia. A organização de uma festinha de aniversário ou o planejamento de uma viagem de férias são boas ocasiões para chamá-la a participar.
Se você decidiu que é a hora de dar dinheiro para seu filho administrar, o ideal é começar com semanadas em lugar de mesadas. Ele vai saber administrar melhor a quantia em um período menor de tempo. A quantia deve ser bem baixa no início.
Especialistas apontam 7 anos como a idade para dar as primeiras quantias e ter conversas com a criança sobre o valor do dinheiro.
Os 11 anos são a idade em que a compreensão da criança já permite a ela administrar uma mesada. Mas não abandone as conversas e acompanhe como ela gasta seu capital, em especial durante a adolescência.