Cidades

Choveu em Brasília, em apenas cinco dias, mais do que o previsto para o mês inteiro

Volume de chuva entre quinta-feira passada e segunda foi de 188 milímetros, enquanto a previsão para abril inteiro era de 132mm. Segundo a Defesa Civil, número de ocorrências não aumentou, mas a gravidade dos problemas tem sido maior

Luiz Calcagno
postado em 06/04/2010 08:13
A força da natureza não respeita classe social. Isso ficou claro nas inúmeras ocorrências de alagamentos e danos causados pela chuva em todo o Distrito Federal. Carros quebrados, eletrodomésticos perdidos, asfalto esburacado e até árvores derrubadas sobre barracos estão no rol de ocorrências registradas pelo Corpo de Bombeiros Militar e pela Defesa Civil. De acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), somente os primeiros cinco dias do mês de abril foram suficientes para que chovesse mais do que o esperado para o mês inteiro. Foram 188 milímetros(1) enquanto o previsto para os 31 dias era de 132mm.

O supervisor de Defesa Civil, major Alan Alexandre Araújo, afirmou que, apesar dos transtornos causados pela chuva, o órgão não registrou aumento no número de ocorrências. Ele explicou que as dificuldades enfrentadas(2) pela população têm sido piores, e as chuvas, mais intensas, mas os problemas são os mesmos: alagamentos que derivam de ocupação desordenada do solo e ruas sujas, principalmente. "Atuamos quando há risco de desabamento, quando há necessidade de retirar a família de um local, por exemplo. Notificamos para que a questão seja resolvida, ou interditamos a área, se houver necessidade", afirmou.

Ocupação irregular na Chácara Santa Luzia, na Quadra 17 da Estrutural: a cada chuva, muita lama, prejuízos e o risco de doenças por conta da falta de saneamento

Cuidados
Segundo o major, a maioria das ocorrências no Plano Piloto, por exemplo, é causada por entupimento na rede de captação de águas pluviais. Em outras cidades do DF, segundo Araújo, construções sem um acompanhamento técnico também são motivo de alagamento. Muitas vezes há uma impermeabilização exagerada do solo. ;É importante não jogar lixo na rua, e colocá-lo para a coleta em um horário mais próximo da passagem do caminhão do lixo;, falou.

De acordo com o major do Corpo de Bombeiros Mauro Sérgio de Oliveira, no último fim de semana, o Corpo de Bombeiros atendeu 136 ocorrências decorrentes da chuva. Foram três inundações, seis cortes de árvores que caíram e 127 acidentes de trânsito. ;É preciso sempre estar de olho no estado de conservação do veículo e respeitar a velocidade da via, principalmente quando chove. A população também deve evitar construções perto de rios e barracos e desobstruir, sempre que possível, as bocas de lobo;, recomendou.

O Inmet avisa que só deve parar de chover na segunda quinzena do mês. O meteorologista Manuel Rangel explicou que aglomerados de nuvens provenientes da região Norte atingiram Goiás e DF, passando por Mato Grosso. ;De fato, está chovendo mais que o esperado. Vivemos um período de transição entre outono e inverno;, explicou.

Segundo Rangel, em abril de 2009, o volume de água chegou a 375mm. No entanto, o meteorologista disse que ainda é cedo para dizer se o volume em 2010 ultrapassará ou não o valor do mesmo mês do ano passado, o maior dos últimos cinco anos. ;O certo é que as chuvas não devem durar o mês inteiro. A expectativa é que, a partir da segunda quinzena, as massas polares que vêm da região Sul, frias e secas, afastem a nebulosidade. Com isso, deve predominar o sol;, disse.

1 - Grande quantidade
O Inmet calcula o volume de chuvas em milímetros. Em 2 de abril, por exemplo, o dia em que mais choveu no ano, foram 74,4 milímetros. Pode parecer pouco, mas cada milímetro corresponde a um litro de água por metro quadrado. Em uma área de quatro metros quadrados, por exemplo, a quantidade de chuva seria de aproximadamente 297,6 litros de água.

2 - Como agir
Em caso de alagamento, a Defesa Civil recomenda à população uma série de cuidados. A população deve desligar a energia da residência, subir os eletrodomésticos a uma altura segura, e levar idosos e crianças para um local mais seguro. Se não existir esse lugar, e a água continuar a subir, é importante chamar o Corpo de Bombeiros o quanto antes.


Estragos e prejuízos
À população, resta contabilizar o prejuízo e se preparar para as próximas chuvas. Os moradores do condomínio Green Park, na 911 Norte, que o digam. A garagem de um dos prédios ficou alagada no último domingo. A água barrenta quebrou um muro lateral da parte de trás do terreno e levou lama, inclusive, para o fosso do elevador e para o reservatório de água dos moradores. Ao todo, 26 veículos ficaram submersos e foram danificados.

De acordo com o síndico do condomínio, Arnaldo Alves Batista, 53 anos, a sorte foi a construção estar dentro do prazo de garantia da construtora. Com isso, ao menos a parte estrutural será reformada sem gastos financeiros para os moradores. Mesmo assim, ainda há o prejuízo dos proprietários dos carros. ;Fica uma imagem ruim, de destruição. São pessoas assustadas, água contaminada, elevador alagado. Isso é desagradável. É uma perda bastante grande;, apontou Batista. ;Se não estivéssemos na garantia, o prejuízo poderia passar de R$ 200 mil;, completou.

A estudante Leandra Lopes, 31, chegou de viagem às 22h de domingo. A água já tinha baixado. A irmã deixou a jovem e o marido em frente ao carro da família, que tinha ficado estacionado. Eles descarregaram, e só então viram os danos. ;Primeiro vimos o tanto de barro. Em seguida, vimos nosso carro. Aí, só pensamos nos gastos. Acionamos o seguro, mas como é fenômeno da natureza, não sei se vai cobrir;, falou.

Os moradores da Chácara Santa Luzia, na Quadra 17 da Estrutural, já se acostumaram a ter água pelas canelas sempre que chove. Porém, quando o volume de chuva é maior, o local inunda até a cintura. Tanquinho de lavar roupas, geladeiras, televisões e sofás são as maiores perdas. O local fica abaixo do nível do asfalto e não tem captação de águas pluviais. O risco de se contrair doenças causadas pela falta de saneamento é visível. Questionado pela reportagem, o catador Zaqueoleide Leite Pereira, 36 anos, admitiu que a ocupação é irregular, mas argumenta que não tem para onde ir. ;Esperamos receber casas do governo há mais de um ano. Eles prometeram, mas não resolvem. Temos que ficar;, reclamou.

Na Rua 10 de Vicente Pires, a água não chega a invadir as casas. Mas isso porque uma erosão com mais de 4m de profundidade corta a frente das residências e até ameaça um muro a cair. Segundo moradores, o perigo é ainda maior quando chove, porque a água cobre o buraco e o asfalto, e fica difícil saber onde começa um e termina o outro. A funcionária Pública Nilza de Fátima Caixeto, 47, conta que até carros já caíram na falha. ;Não dá nem para entrar de carro em casa. Colocamos pontes de madeira, feitas em casa, para poder sair de casa, e não é seguro;, disse.


Chuva mês a mês

Novembro de 2009
Quantidade esperada ; 238mm
Quantidade registrada ; 189mm

Dezembro de 2009
Esperado ; 248mm
Registrado ; 307mm

Janeiro 2010
Esperado ; 241mm
Registrado ; 121mm

Fevereiro 2010
Esperado ; 214mm
Registrado ; 36,8mm

Março de 2010
Esperado ; 180,9mm
Registrado ; 249mm

Abril de 2010
Esperado para o mês todo: 123,8mm
Registrado nos primeiros quatro dias do mês: 188mm
Dia 1 ; 6,2mm
Dia 2 ; 74,4mm
Dia 3 ; 8,2mm
Dia 4 ; 43,6mm

A medição é realizada a cada 12h.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação