postado em 08/04/2010 09:12
A casa da família da estofadora Nadir Miranda, 49 anos, fica em um lugar incomum: a Praça Zé Ramalho, na Vila Planalto(1). Bem no meio dela, perto das árvores, numa área de lazer e convivência da comunidade. Mas ela não se considera uma invasora. Veio para Brasília com a mãe e as irmãs em 1971 e, dois anos depois, se instalou no Acampamento Rabelo, Alojamento 9, Casa 3. Como o futuro da Vila Planalto era incerto, aos poucos, os vizinhos deixavam o lugar. Nadir cresceu, se casou, teve filhos e continou morando na mesma casa, no mesmo endereço. A praça, ela diz, surgiu em volta. Enquanto isso, a situação dela seguiu indefinida.Nadir saiu do Rio de Janeiro ainda pequena na companhia da família em busca de uma vida melhor. Logo que chegou, a mãe se inscreveu em uma lista do governo para receber um lote na Vila Planalto. Mas ninguém sabia ao certo qual seria o destino final dos acampamentos. A promessa de distribuição dos lotes saiu do papel na década de 1980. Quem se inscreveu ganhou um lote. ;O cadastro ficou no nome da minha mãe porque todos os filhos eram menores de idade e só ela ganhou um lote. Quando o espaço foi entregue, eu já estava casada e com filhos, não queria morar com a minha mãe. Queria ter a minha própria casa;, justifica.
Ela conta que muitos moradores dos antigos alojamentos aceitaram trocar a Vila Planalto por outras cidades e ganharam os terrenos. ;É muito frustrante essa situação para quem chegou com a família há muito tempo. Também sou pioneira e luto pelo meu lote dentro da Vila Planalto. Minha luta é para permanecer aqui;, diz. Nadir acredita que tem o direito de permanecer onde está, caso contrário já teria saído ; ela abriu um processo contra a administração e conta que conseguiu uma liminar para permanecer na casa. A estofadora recorda que já sofreu algumas investidas do governo para tirá-la de lá. ;Eles não podem chegar aqui e me mandar embora. Eu não invadi o local, isso tudo aqui era habitado na época em que eu cheguei. Eles transformaram isso aqui em praça comigo dentro;, diz.
Lotes
Após o fim das construções dos prédios na Esplanada dos Ministérios, o futuro dos acampamentos da Vila Planalto ficou incerto. A ideia era de que as casas fossem desmontadas. Mas a luta dos moradores e a pressão sofrida pelo governo fizeram com que as famílias se assentassem cada vez mais. O governador do Distrito Federal à época, José Aparecido, assinou dois decretos em 1988: de fixação e de tombamento(2) da Vila Planalto como patrimônio histórico. Mesmo assim, os moradores até hoje sofrem com as incertezas. Eles não têm as escrituras definitivas das casas, receberam termos de concessão de uso.
Segundo a assessoria de imprensa da Administração de Brasília, o caso dos moradores da Vila Planalto deve ser tratado com a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (Seduma). A assessoria de imprensa da secretaria garantiu que foi formado um grupo técnico e o processo de regularização da Vila Planalto está em andamento. Já existe um levantamento preliminar baseado em imagens e agora uma equipe técnica irá ao local para apontar as irregularidades. De acordo com a assessoria, existem normas de gabaritos que devem ser cumpridas pelos moradores, uma vez que a região é tombada. A Seduma afirmou ainda que desconhece o problema de Nadir e vai verificar se ela tem o termo de concessão de uso.
1 - História
A ocupação da Vila Planalto começou na década de 1950, com o início da construção de Brasília. As construtoras Rabelo e Pacheco Fernandes foram as primeira a montar acampamentos na região para erguerem o Palácio da Alvorada, o Eixo Monumental e a Praça dos Três Poderes. Mais de 20 empreiteiras se instalaram onde hoje é a Vila Planalto para trabalhar nas edificações. Atualmente, a Vila Planalto é composta por quatro acampamentos: Rabelo, Pacheco Fernandes, DFL e Tamboril.
2 - Preservação
O Decreto n; 11.079, de 21 de abril de 1988, determinou o tombamento da Vila Planalto como Patrimônio Histórico do Distrito Federal. A região, que está sob responsabilidade da Administração Regional de Brasília, foi inserida no Livro do Tombo, na categoria de Conjuntos Urbanos e Sítios Históricos e também faz parte da poligonal de tombamento do Plano Piloto, que é considerado patrimônio cultural da humanidade. Mas hoje a Vila Planalto perdeu as características históricas que a transformaram em patrimônio.
"É muito frustrante essa situação para quem chegou com a família há muito tempo. Também sou pioneira e luto pelo meu lote dentro da Vila Planalto. Minha luta é para permanecer aqui"
Nadir Miranda
Nadir Miranda