postado em 09/04/2010 07:00
A coleção de outono desembarcou nas lojas, mas as promoções continuam no comércio de rua e em shoppings. Os letreiros estampados nas vitrines com a promessa de até 80% de desconto em pleno abril surpreendem. Comerciantes explicam que a novidade é para ajudar a limpar o estoque, enfrentar a concorrência e manter a alta no movimento provocada pelas liquidações de verão. Especialistas em varejo, no entanto, criticam a iniciativa e falam em banalização dessa estratégia.O comércio festejou o resultado do início deste ano. Dados do setor mostram uma queda no desempenho em janeiro e em fevereiro em relação ao mês anterior, porém apontam um salto na comparação com o mesmo período de 2009. De maneira geral, sobraram poucas peças da coleção passada. As promoções se estenderam, segundo os próprios lojistas, para não esfriar as vendas e a tendência é que, com o tempo, elas virem atrativo permanente para sugar os clientes.
A oferta de preços baixos em abril sinaliza uma prática consolidada em países da Europa e nos Estados Unidos: liquidações todo mês. ;Não tem jeito, a concorrência cada vez maior nos obrigará a isso;, comenta o gerente da Brooksfield, Edivan Rodrigues. Na loja dele, no Conjunto Nacional, os descontos variam de 30% a 50%. Calças de sarja caíram de R$ 258 para R$ 129. ;Temos que concorrer, inclusive, com as nossas outras lojas;, diz. A Brooksfield tem quatro unidades no Distrito Federal.
No Brasília Shopping, quatro lojas anunciam promoções: M. Officer, Tricott, Aviator e Cheeky. No Taguatinga Shopping, pelo menos três: Mônica Sanches, Siberian e First Class. No Pátio Brasil: Via Veneto e TNG. O presidente do Sindicato do Comércio Varejista do DF (Sindivarejista-DF), Antônio Augusto de Moraes, afirma que não há explicação clara para as liquidações fora de hora. ;As vendas foram boas em janeiro e emfevereiro. Isso deve ser marketing pontual de algumas lojas;, diz.
Chamariz
Com os preços mais baixos, os comerciantes oferecem facilidades de pagamento. Na avaliação do presidente da Federação do Comércio do DF (Fecomércio-DF), Adelmir Santana, as medidas não passam de chamariz em uma época tímida para o setor. Geralmente, as vendas só voltam a melhorar perto do Dia das Mães. ;Não há motivo específico para liquidações no início de abril, mas os lojistas são muito criativos, usam desse artifício para manter o movimento em alta;, comenta.
Na Toulon, loja de roupa masculina, as vitrines anunciam até 80% de desconto. Nas prateleiras, o preço de bermudas, por exemplo, despencou de R$ 88 para R$ 28. ;A ideia é atrair o cliente para dentro da loja, onde a gente oferece as peças promocionais e apresenta a coleção nova, que é tradicionalmente mais cara;, explica o subgerente Bruno Amorim. Segundo ele, há peças em liquidação o ano inteiro na unidade do Conjunto Nacional. ;Tem gente que compra pelo preço, não pela coleção;, completa.
A pedagoga Ana Léia Dias, 29 anos, foi ao shopping pagar uma conta no banco na tarde de ontem. Passou pela Siberian, viu movimento na loja e resolveu entrar. Saiu pouco depois com duas camisetas para o marido: cada uma por R$ 19,90. O preço antigo era R$ 59,90. A promoção, contou o gerente Sidney Araújo, fez as vendas quadruplicarem. ;Por mim, pode virar moda esse negócio de promoção o tempo todo. Nem queria comprar, mas estou fazendo a festa;, comentou Ana.
Para o economista da Fundação Getulio Vargas (FGV) André Braz, as promoções em abril não se explicam pelo aumento da concorrência, como defendem os lojistas. ;Concorrência sempre existiu, principalmente no segmento de vestuário. Isso é pura estratégia de marketing;, observa, antes de alertar os consumidores. ;O comércio não faz liquidação porque é bonzinho. Em geral, baixam-se os preços de itens que ficam encalhados, que não saem com facilidade.;
"Concorrência sempre existiu, principalmente no segmento de vestuário. Isso é pura estratégia de marketing"
André Braz, economista da Fundação Getulio Vargas
André Braz, economista da Fundação Getulio Vargas
Palavra de especialista
Recurso banalizado
;Banalizaram as promoções, o que é um erro gravíssimo de estratégia mercadológica. Os comerciantes estão atirando para todos os lados. Daqui a pouco, ninguém vai acreditar mais em ofertas. Eles jogam os preços lá em cima, não conseguem mantê-los e depois se veem obrigados a realizar as promoções. Isso acostuma mal o cliente. Promoção tem início e fim, faz sentido quando a intenção é alavancar as vendas e desencalhar produtos em um período específico. Mas do jeito que a gente vê hoje, perdeu o sentido. Se o cliente entra na loja e constata que o preço é o mesmo da semana passada, que a promoção, na verdade, não existe, ele não volta mais. A banalização está tão grande que existem empresas que não se sustentam mais sem oferecer descontos. O cliente tem que escolher uma loja pelo preço justo que ela oferece, pelo bom atendimento, e não necessariamente pela promoção.;
Charles Szulcsewski, mestre em administração de empresas, especialista em varejo, coordenador dos cursos de vendas da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) em São Paulo e em Brasília.
Ouça entrevista com Charles Szulcsewski
Eu acho...
;É bom que haja promoções com mais frequência, mas isso incentiva a gente a gastar mais e muitas vezes desnecessariamente. Nem precisamos do produto e acabamos comprando só porque ele está com desconto. Se as liquidações virarem uma coisa eterna, ou a gente se acostuma com os anúncios ou então o consumismo vai crescer ainda mais.;
Juracy Paiva, 61 anos, aposentada
Juracy Paiva, 61 anos, aposentada