Cidades

Para as famílias dos meninos mortos, acabou um sofrimento e começou outro

Todos se perguntam como os adolescentes foram abordados, se reagiram, se sofreram. E desconfiam da participação de cúmplices

postado em 12/04/2010 08:30
O sentimento predominante nas mães dos seis adolescentes mortos em Luziânia era de atordoamento, mistura de alívio, espanto, indignação e revolta. Se, finalmente, chegou ao fim a angústia que se estendia por 101 dias, começou um ciclo de dúvidas e indagações. ;Eu pedi a Deus uma resposta, e Ele me deu;, conformava-se Sônia Vieira, mãe de Paulo Víctor Vieira de Azevedo Lima, de 16 anos, que desapareceu em 4 de janeiro. Ela estava em um retiro de oração, em busca de forças para esperar pelo filho, e só foi comunicada da morte do adolescente no início da noite.

O pai de Paulo Víctor estava inconformado. ;Meu filho era um menino incapaz de machucar alguém. Cada um tem um carma, mas você não imagina o tamanho da dor desse meu;, disse José Vieira Lima. O adolescente vítima da brutalidade era o único filho homem entre os quatro irmãos. ;Dias antes de sumir ele tinha me dado um abraço bem apertado, e dito que estava ficando forte;, lembrou, emocionado, o pai. Segundo informações passadas pela polícia à família, Paulo Víctor era um dos que tentaram resistir antes de ser morto. ;Eles disseram que ele lutou muito, até o fim. Eu vejo ele exatamente assim, alguém que não ia se entregar mesmo;, afirmou a irmã de Paulo Víctor, Fabiane de Azevedo, 17 anos. Ela conversava, na porta do Instituto Médico Legal, em Luziânia, com os irmãos de Márcio Luiz de Souza Lopes, 19 anos, desaparecido em 29 de janeiro, e de Diego Alves Rodrigues, 13 anos, que sumiu em 30 de dezembro.

Pior pessoa
;Meu irmão não iria com esse homem a não ser que ele estivesse armado. Tenho certeza de que tem mais gente envolvida nisso, as coisas não podem ter acontecido desse jeito simples não;, revoltava-se Marcelo Luiz Sousa Lopes, irmão de Márcio. Ele esteve no local onde foram encontrados os corpos e implorou, sem sucesso, para ver o corpo do irmão. ;Só levariam ele para aquele lugar onde ele foi achado se o matassem. Estou sentindo uma mistura de alívio e desespero, não consigo assimilar;, repetia a irmã da vítima, Lúcia Maria de Sousa Lopes.

O pai de Márcio passou mal assim que soube da notícia da morte dofilho e foi internado num hospital da cidade. A mãe, Maria Lúcia de Souza Lopes, acompanhou o marido e passou boa parte do dia afastada da movimentação de reconhecimento dos corpos. ;Nem a pior pessoa do mundo mereceria isso. Minha mãe disse que lutou para achar o nosso irmão, e que agora vai atrás de justiça;, desabafou Lúcia. Segundo os filhos, a mãe, que não falava havia dias, quebrou o silêncio com muitas palavras de revolta desde que soube da morte de Márcio. ;Ela está segurando uma barra que é maior que ela;, preocupava-se Marcelo.

Se agora já se sabe o que aconteceu, a pergunta que mais aflige os parentes é outra, como aconteceu. O irmão de Diego Alves, o mais novo e o primeiro a desaparecer, Gedeon Gomes tenta entender como o adolescente se aproximou do assassino. ;Ele era o mais medroso de todos, não iria com um desconhecido nunca. Acabou a nossa família assim que levaram o nosso caçula.; A mãe do adolescente, que está tomando medicamentos para controlar a ansiedade, não escondia a revolta. ;Tomara que quem fez isso apodreça na cadeia, ele é mais pobre que todos nós;, afirmou Adelnira Alves de Souza. Ela deixou o IML amparada pelos outros filhos. ;Arracaram de mim o meu coração. Parece até que eu não estou pisando no chão;, considerou.

Sem rumo
Completamente sem rumo, Cirlene Gomes de Jesus, mãe de George Rabelo dos Santos, 17 anos ; que desapareceu em 10 de janeiro ; não sabia como seguiria a vida após sair do IML. ;Esperava receber meu filho vivo, não em um saco;, disse após ser interrogada por um dos peritos responsáveis pelo reconhecimento dos corpos. Ela não come nem dorme desde que recebeu a notícia. ;Sinto ódio e ao mesmo tempo pena, meu filho já descansou, esse rapaz não. O pior é que ele estava pertinho da minha casa e eu não pude ajudar meu filho;. Cirlene considerou que toda a luta das mães de Luziânia em busca de seus filhos não foi em vão. ;Não me arrependo de nada, nunca. Começaria tudo de novo para pegar ele com vida;, disse.

Outra que também foi pessoalmente ao IML falar com os perito foi Mariza Pinto Lopes, mãe de Divino Luiz Lopes da Silva, 16 anos, que desapareceu em 13 de janeiro. Ela deixou o local bastante abatida, vestindo a camiseta estampando a foto do filho. ;Foi muita judiação tudo isso que foi feito. Uma pessoa que faz uma coisa dessas não é um humano;, limitou-se a dizer com a voz embargada. Agora, segundo à mãe, cabe às famílias apenas esperar. ;Só o que falta é a certeza com o reconhecimento do corpo, nada mais;, concluiu.

;A minha esperança desmoronou, um pedaço da minha vida também;, repetia com a voz embargada Francisco Carlos Santos, pai de Flávio Augusto dos Santos, 14 anos, que desapareceu em 18 de janeiro. A mãe do adolescente, Valdirene Fernandes, pouco conseguia pronunciar. ;Estou muito abalada com toda essa história. A gente vai batalhar para seguir, e que Deus me ajude;, afirmou sem tirar os olhos do chão.

Da esperança de reencontrar os seis meninos com vida ficaram apenas as faixas e as fotos dos meninos ainda espalhadas nas fachadas de muitas casas da cidade e nas camisetas usadas durante as campanhas pelas buscas.

Colaborou Luiz Calcagno

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