Guilherme Goulart
postado em 14/04/2010 08:35
Goiânia (GO) ; As seis horas do depoimento prestado pelo pedreiro Adimar Jesus da Silva, 40 anos, serviram para que a polícia goiana alinhavasse alguns pontos para a conclusão do caso. O homem que confessou o assassinato de seis jovens em Luziânia (GO) confirmou informações e revelou detalhes dos crimes cometidos entre 30 de dezembro e 22 de janeiro, embora ainda tenha entrado em contradições. A tendência é de que ele seja indiciado por homicídio, estupro, ocultação de cadáver e furto. Os quatro crimes(1) valeriam para cada vítima, o que daria mais de 300 anos de prisão em caso de condenação às penas máximas. A definição depende das conclusões de laudos técnicos.Os esclarecimentos de Adimar tiveram início por volta das 21h de segunda-feira e terminaram às 3h de ontem. Participaram do interrogatório ocorrido na Delegacia Estadual de Repressão a Narcóticos (Denarc), em Goiânia (GO), equipes da Polícia Federal, em Brasília, e da Polícia Civil de Goiás. ;Ele está tentando formatar uma história com mais coerência para justificar a barbaridade que fez. Mas o interrogatório é apenas um meio da investigação;, afirmou o delegado-adjunto da 1; Delegacia Regional de Goiânia, Juracy José Pereira, também responsável pelo inquérito do caso Adimar.
Uma das novidades do depoimento passa pela quantidade de garotos que sofreram violência sexual ; eles tinham entre 13 e 19 anos e desapareceram do Parque Estrela Dalva, no município a 66km do Distrito Federal. Adimar admitiu à polícia relações sexuais com cinco dos seis jovens antes dos assassinatos. Até segunda-feira, dizia que os abusos ocorreram contra dois deles. A senadores da CPI da Pedofilia, contou que fizera sexo com as seis vítimas.
O pedreiro também admitiu prazer em matar, apesar de ter negado em entrevistas. Na madrugada de ontem, detalhou a forma com que atraía e matava os garotos. Normalmente, levava-os até uma área rural perto do Parque Estrela Dalva ; a Fazenda Buracão, a 1,8km da entrada de Luziânia ; com a promessa de dar maconha a eles. Como o cerrado ficava em um ponto de descida, deixava a vítima passar à frente e acertava a primeira pancada com a parte de trás de uma enxada. ;Adimar colocava o cidadão na frente dele e matava pelas costas. O terreno é íngreme e permite isso;, revelou o delegado-geral da Polícia Civil de Goiás, Aredes Pires. Os cadáveres retirados da fazenda no último domingo apresentavam marcas de espancamento. Em outras ocasiões, o acusado falou em ofertas de emprego e de programas sexuais.
Segundo a polícia, o assassino confesso teve cuidado na forma como enterrava os restos mortais das vítimas. As roupas teriam sido jogadas em um dos lixões de Luziânia, onde a polícia vasculhou.
Os delegados também identificaram a intenção do pedreiro em desqualificar as vítimas. Ele alegou, por exemplo, que todos teriam envolvimento com drogas ou seriam homossexuais. Como comprovaram os investigadores, nem todos fumavam maconha ou faziam programas com homens. ;Ele tenta fazer isso para se justificar;, explicou o delegado Juracy Pereira. As duas versões são usadas por Adimar como motivação dos crimes. O pedreiro chegou a afirmar, em coletiva à imprensa na segunda-feira, que teria sido contratado por R$ 5 mil por uma das vítimas (George Rabelo dos Santos, 17 anos) para matar os outros garotos devido a dívidas de drogas. Zé, como Adimar chama George, não teria pago e também foi morto. Mas a explicação é questionável, pois o rapaz foi o terceiro e não o último a desaparecer.
Frio e dissimulado
As contradições e as dificuldades em organizar as ideias por parte do acusado fizeram com que a polícia goiana admitisse, inclusive, que alguns pontos da investigação poderão permanecer obscuros. O principal deles: o motivo dos assassinatos em série. ;Se foi pelo abuso sofrido anteriormente ou se foi por dinheiro que ele fez tudo isso, ainda não temos certeza. Não sei se vamos chegar à motivação real, pois se trata de um psicopata;, admitiu Pires.
A suposta doença mental do acusado, por exemplo, faz com que ele tenha atitudes incoerentes. No dia em que acabou preso pela polícia, no último sábado, no mesmo bairro onde ocorreram os sumiços, Adimar esteve em Brasília para doar sangue. Outra incongruência se revela em relação aos sentimentos. Mostra frieza para contar o que se lembra dos crimes e, segundo desconfia a polícia, dissimulação ao tocar no assunto da família. Faz cara de choro ao falar da irmã e dos sobrinhos, com quem morava no Parque Estrela Dalva, mas não derrama lágrimas.
O pedreiro também tem dificuldades em guardar nomes. Talvez por ser analfabeto, como comprovaram os investigadores do caso. ;Ele só sabe desenhar o próprio nome. A referência dele são os objetos das pessoas que ele matou. Ele aponta para as fotos e diz: ;Esse é o do celular, esse é o da bicicleta, esse é o que tinha namorado;;, contou o delegado Pires.
Prisão temporária
Adimar deve ficar detido na Denarc, em Goiânia, pelo menos até o fim da semana. A prioridade da polícia agora é a análise e a identificação dos corpos das vítimas e, finalmente, liberá-los para as famílias. O celular e as bicicletas de algumas das vítimas são relacionados como provas de que Adimar cometeu os homicídios.
O responsável pelo inquérito também pediu ontem a extensão da prisão temporária do pedreiro. Os cinco dias pedidos inicialmente vencem hoje. Assim, a polícia terá pelo menos mais 25 dias para concluir a investigação. O prazo é prorrogável. ;Vamos esgotar tudo o que é possível. Investigação não tem tempo. Se vocês pensarem que esse cidadão morava ao lado das vítimas e nenhum familiar o apontou como o criminoso, imaginem o trabalho da polícia para chegar até ele;, disse o delegado Pires.
1 - Punição
A pena por homicídio qualificado vai de 12 a 30 anos de prisão. A por ocultação de cadáver varia de um a três anos de reclusão e multa. Um estuprador condenado pode ficar até 12 anos na cadeia, em casos de vítimas maiores de 14 anos e menores de 18 anos. O furto qualificado é punido com três a oito anos de reclusão. Caso Adimar Jesus seja indiciado por esses crime para cada uma das seis vítimas e venha a ser condenado às maiores penas, ele poderia receber uma sentença de 318 anos de prisão. Mas, no Brasil, uma pessoa fica, no máximo, 30 anos atrás das grades.
Como anda a apuração
A polícia ainda não elucidou todos os detalhes do caso Adimar, mas já tem algumas certezas. Também aponta as contradições no depoimento do acusado. Confira:
DÚVIDAS
Cúmplices
Existe a possibilidade de Adimar ter recebido ajuda para cometer os homicídios dos seis jovens do Parque Estrela Dalva. Uma testemunha revelou, por exemplo, que escapou de uma abordagem feita pelo suposto assassino. Na ocasião, o pedreiro teria a companhia de outro homem. Na segunda-feira, o chefe do Departamento de Polícia Judiciária de Goiás, Josuemar Vaz, chegou a afirmar que o acusado teria agido sozinho, mas a participação de comparsas ainda não está completamente descartada.
Outros delitos
A Polícia Civil de Goiás vai cruzar o nome do acusado com o sistema nacional da polícia. Há a suspeita de que ele tenha cometido outros crimes no Brasil. Será pedida a ajuda de policiais candangos e baianos, além da Polícia Federal.
A morte da mulher
Adimar disse que ela morreu em um terreiro de macumba na Bahia, do qual a sogra seria a dona. A pressão para que ele participasse dos rituais teria sido responsável pela separação do casal. Segundo o pedreiro, a morte ocorreu na época em que ele morava em Brasília. A polícia goiana pedirá ajuda aos colegas baianos para que se aprofunde o caso.
O motivo
O pedreiro fala de aversão por sexo (por ter sido estuprado) e morte por encomenda (dinheiro). A segunda alternativa se baseia na versão de que George Rabelo, uma das vítimas, teria oferecido R$ 5 mil para matar os demais devido a dívidas de drogas. Não pagou e acabou assassinado. A polícia goiana admite que talvez nunca descubra os reais motivos de Adimar para os seis assassinatos. O acusado é tratado como psicopata pelos delegados.
CERTEZAS
O assassino
Para a polícia goiana, Adimar Jesus da Silva é o responsável pela morte dos seis jovens moradores de Luziânia. Além de confessar os crimes, forneceu detalhes dos homicídios e apontou os locais onde enterrou os cadáveres das vítimas. Ainda falta, porém, a confirmação se os corpos encontrados são dos garotos. A identificação será feita por DNA.
Sexo com as vítimas
Apesar de o pedreiro ter variado as versões em conversas com a polícia, a imprensa e parlamentares, os investigadores do caso não têm dúvidas de que ele fez sexo com os seis jovens assassinados. Para os investigadores, os laudos apenas comprovarão a tese.
Armas usadas
O pedreiro usou paus, pedras e uma enxada. Os objetos passam por análise da perícia técnica, mas a polícia tem certeza de que foram usados para tirar a vida das vítimas. Usava a parte de trás da enxada para atacá-los pelas costas.
Drogas
Os investigadores afirmam que quatro jovens tinham envolvimento com drogas.
Comportamento anormal
A polícia se baseia em laudo assinado por psicólogos para comprovar que Adimar é um psicopata. Os depoimentos prestados pelo acusado também revelaram as dificuldades dele em se expressar e em manter versões coerentes em uma mesma narrativa.
CONTRADIÇÕES DO DEPOENTE
Abusos sexuais
É o ponto em que o pedreiro Adimar mais se contradiz. Em um primeiro momento, admitiu relações sexuais com dois jovens. À CPI da Pedofilia afirmou que teve com todos eles. O último depoimento à polícia oficializou cinco. Para a polícia, todos sofreram violência sexual.
Motivação
Adimar fala em motivação financeira e sexual. Diz que uma das vítimas queria os demais mortos por causa de dívidas de drogas. Mas também fala em crimes sexuais, o que confirma o perfil pedófilo detalhado em laudo criminológico de maio de 2008.
Convencimento
Outro ponto de dificuldade da polícia, pois o acusado troca com frequência as versões de como convencia as vítimas a segui-lo até uma área rural. Primeiro, falou em oferecimento de R$ 200 para pequenos serviços. Também disse que os atraía para fazer programas. Na última delas, cita drogas. Chamaria os garotos com a promessa de maconha.
Sequência dos homicídios
O pedreiro tem dificuldades em apontar a sequência das mortes. Troca os nomes das vítimas com frequência, inclusive o dia da morte de cada jovem. Nem sabe dizer os nomes dos garotos. Precisa de referências de objetos ou roupas para se lembrar de quem é.
Três perguntas para Aredes Pires, delegado geral da Polícia Civil de Goiás
O caso está solucionado?
Nós achamos que esse crime vai ter início e vai ter fim. Temos certeza de como ele iniciou e como ele findou. O meio é que teremos alguma dificuldade. Até porque há um laudo que comprova que ele não tem um comportamento normal. Estive com ele em Luziânia, na Denarc (Delegacia Estadual de Repressão a Narcóticos) por duas vezes e na CPI da Pedofilia. Algumas declarações têm coerência. Nas demais, ele oscila. E oscila em relação aos mesmos pontos.
Quais são eles?
Em todas as entrevistas, Adimar diz que um dos menores o tinha procurado para encomendar as mortes. Mas a gente mostra as fotografias e aí começam as contradições. Toda vez, ele aponta o George como o jovem que o procurou para matar os demais e que fez a apresentação dos outros para ele. Isso ele confirmou em todos os interrogatórios. Mas e a sequência das mortes? Isso ele não dá conta. E o último ele sempre afirma que era o Márcio. Com relação aos relacionamentos sexuais, em todas ele deu uma vacilada, exceto em relação a dois que sempre afirmou que teve. Ele não sabe o nome. Fala: ;Com o do celular (Paulo Victor) e o Márcio;.
Há algum sentimento de arrependimento no assassino?
Tentamos tirar isso dele e em nenhum momento isso foi possível. Ele não consegue chorar. A gente provocava isso. Eu queria ver ele chorar. Eu tentei, mas não consegui. Queria tirar um sentimento dele, mas não ia além de tentar um choro. Acho que ele é despido de sentimentos. É um psicopata. É um cidadão que não vai ter cura. O psicopata nasce psicopata e morre psicopata. É um cidadão que, se colocado em liberdade, vai voltar a cometer o mesmo crime: violência sexual com tendência a homicídio.