Cidades

Confissão dos homicídios de Ademar traz à tona debate sobre a progressão de regime

Adriana Bernardes
postado em 18/04/2010 08:32

A confissão do assassinato dos seis jovens de Luziânia por um presidiário beneficiado pela progressão do regime reacendeu a discussão sobre as regras para conceder o benefício. Os crimes praticados pelo pedreiro Ademar de Jesus Silva, 40 anos, provocaram ainda mais indignação porque o criminoso cumpria pena em regime domiciliar por ter abusado sexualmente de dois garotos em 2005. E pela existência de um laudo criminológico que apontou sinais de psicopatia.

No Brasil faltam estudos aprofundados sobre a reincidência de condenados por crimes sexuais. Mas uma pesquisa realizada nos Estados Unidos pelo ex-policial Maurice Godwin, da Carolina do Norte, revelou que 45% dos assassinos em série tinham indiciamento anteriores por delitos sexuais. E que 19% estavam em liberdade condicional quando mataram. Os dados estão no livro Hunting Serial Predators (algo como À caça de predadores em série). Godwin, que é PhD em psicologia forense e consultor em combate ao crime nos EUA, analisou 107 serial killers e 728 vítimas.

Diante das atrocidades que Ademar de Jesus Silva afirmou praticar, a promotora de Justiça de Execuções Penais, Maria José Miranda, quer a regressão do regime(1) para ele, perdendo o benefício do regime aberto e voltando para o fechado. Mas esse é um assunto sobre o qual nem todos concordam. Mestra em direito penal pela Universidade de Frankfurt, na Alemanha, a advogada Fernanda Tórtima diz não encontrar amparo jurídico razoável para mudar as regras da progressão (a graduação da mudança de regime, da reclusão à liberdade condicional).

A advogada também concorda com o fim da exigência do laudo criminológico. ;Não acho razoável que um exame como esse seja capaz de aferir a periculosidade de uma pessoa;. Perguntada se condenados por crimes sexuais deveriam ter tratamento diferenciado na análise de progressão de regime, ela diz não encontrar justificativa para tanta. ;Tratá-los de forma diferente seria o mesmo que presumir que não podem deixar de praticar o crime que cometeram;.

Sem controle
Promotor de Justiça e doutor em direito penal pela Universidade Católica Portuguesa, Diaulas Ribeiro destaca que o Estado brasileiro abriu mão de controlar a vida dos criminosos após cumprirem suas penas. A Reforma Penal de 1984 acabou com o sistema cumulativo de penas e medidas de segurança para criminosos perigosos e temerários. ;Isso quer dizer que, perigoso ou não, ao fim da pena cumprida, o condenado sairá da prisão sem controle, sem remédio e sem exame criminológico, queiram ou não queiram os promotores de Justiça e a opinião pública;, afirma. E atribui ao Congresso Nacional a responsabilidade por promover mudanças, se assim o entender.

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, comentou o caso durante toda a semana. Afirmou que a Justiça Criminal no país é desestruturada e precisa passar por uma profunda reforma administrativa para evitar casos como o do ex-presidiário Ademar de Jesus. Mendes defendeu ainda o monitoramento eletrônico de presos condenados por crimes sexuais, mas descartou o fim da progressão do regime e lembrou que, mesmo o exame criminológico não sendo mais obrigatório, ainda cabe ao juiz determiná-lo em caso de necessidade.

O Ministério da Justiça vai apurar como foi o processo de progressão de pena de Admar de Jesus. ;Como pode um rapaz preso por abusar de criança sair da cadeia sem acompanhamento psicossocial?;, indagou, um dia após Ademar ser preso, o ministro Luiz Paulo Barreto.

1 - Julgamento
O pedido da promotora será julgado por um magistrado e depois encaminhado para a Vara de Execuções Criminais (VEP). O caso ficará parado na VEP enquanto tramitar o processo em que Ademar de Jesus é acusado de assassinar as seis vítimas de Goiás. Assim que o caso transitar em julgado, o juiz da VEC encaminhará para a Justiça goiana o aviso (se for o caso) de que o pedreiro terá de cumprir o resto da pena pelos crimes praticados em Brasília, em 2005. Ele ficou preso de 2 de novembro daquele ano até 23 de dezembro passado. Para concluir a pena, faltam seis anos e nove meses.

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