Cidades

O movimento de escoteiros, surgido na Inglaterra, completa um século de existência

postado em 20/04/2010 07:00
Em 1910, surgia o primeiro grupo de escoteiros do país, organizado no Rio de Janeiro com apenas quatro integrantes. Um século depois, o número de meninos e meninas praticantes do escotismo se multiplicou. Hoje, há milhares de adeptos espalhados por todas as unidades da federação. Por trás das atividades lúdicas como arvorismo, acampamentos e aprendizado de técnicas de sobrevivência na selva, está um modelo educacional que trabalha valores humanos com o objetivo de ajudar o desenvolvimento físico e intelectual dos jovens.

A combinação de aprendizado, diversão e aventura é capaz de conquistar praticantes fiéis, capazes de dedicar uma vida inteira à causa. É o caso do administrador Rubem Süfert, 65 anos, escoteiro desde os 10. ;Eu participei do movimento estudantil, de grupos religiosos, mas em nenhum lugar eu fiz tantos e tão bons amigos quanto nos escoteiros. Há pessoas que foram lobinhos comigo e com as quais mantenho amizade até hoje;, conta o gaúcho, que fez parte do grupo Georg Black, de Porto Alegre, que existe desde 1913 e é o mais antigo em funcionamento do país.

Rubem é também um estudioso do movimento, que comemora seu dia mundial (1) na próxima sexta-feira. ;Fundei com minha esposa e amigos o primeiro grupo misto do país. Já fui escoteiro-chefe do Brasil e sou um apaixonado por isso. E muito do que conquistei na minha vida foi utilizando os ensinamentos que aprendi nos escoteiros;, entusiasma-se. ;O mais interessante é que, como escoteiro, você aprende a aprender. Como buscar seu próprio conhecimento e aplicá-lo, e isso foi fundamental para eu ter me tornado um adulto completo;, explica.

Ingressar em um grupo pode mesmo ser uma excelente forma de fazer novos amigos. Quando Karla Kahena Rocha Nogueira, 21 anos, mudou de Sobradinho para a Cidade Ocidental (GO), percebeu que precisava encontrar novas companhias. ;Quando eu entrei, tinha 15 anos, e foi mais para me enturmar com o pessoal. Eu gostei tanto e fiz tantos amigos que continuei no grupo mesmo depois que voltei a morar em Sobradinho;, conta a jovem, que todos os sábados percorre os 70km entre as duas cidades.

Ela diz que, desde que entrou no movimento, não teve mais problemas de socialização. ;O bom dos escoteiros é que em qualquer lugar que você encontre alguém que também é do movimento, você de cara cria uma afinidade;, comemora. Agora, próxima da idade limite para permanecer como pioneira, ela já tem planos de continuar no grupo de outra forma. ;Eu estou fazendo uma espécie de estágio para trabalhar como chefe, liderando os lobinhos;, planeja.

Formação

O escotismo chegou ao país trazido por oficiais da Marinha enviados à Inglaterra para aprender sobre o funcionamento de navios que seriam comprados pelo Brasil. ;Como esses oficiais levaram suas famílias para lá, seus filhos acabaram entrando em contato com o escotismo, que tinha sido criado poucos anos antes, em 1907. ;Quando esses meninos voltaram, abriram no Rio de Janeiro o primeiro grupo;, conta Rubem.

Já em Brasília, os escoteiros surgiram antes mesmo da inauguração da cidade. ;Nas famílias de trabalhadores que vieram para as obras da capital, existiam meninos que eram do movimento em suas cidades de origem. Quando chegaram aqui, acabaram fundando três grupos;, diz Carlos Delmar Lyrio, diretor-presidente da regional do Distrito Federal da União dos Escoteiros do Brasil (UEB). De acordo com a Organização Mundial do Movimento Escoteiro, há grupos presentes oficialmente em 160 países. No Brasil, são quase 60 mil jovens, sendo 2 mil no DF e Entorno.

Carlos Delmar explica que mais do que um grupo de recreação, a proposta do movimento é complementar a formação escolar e formar o caráter dos participantes. ;Quando você ensina um garoto a fazer um nó, por exemplo, você está estimulando a persistência e o uso da lógica. Também utilizamos atividades lúdicas e divertidas para trabalhar importantes valores humanos, como o trabalho em equipe, a cooperação e o respeito ao próximo;, afirma.

Para Samantha Lopes Belliard, akelá (2) (chefe) do 19; Grupo do Distrito Federal, o Villagran Cabrita, que funciona no Colégio Militar, o escotismo é uma boa oportunidade para crianças e adolescentes terem uma formação integral, que nem sempre a escola consegue oferecer. ;Nós trabalhamos a questão da afetividade, o ecumenismo e principalmente o respeito ao próximo. Quando um jovem entra e faz o juramento de escoteiro, ele se compromete a seguir preceitos de respeito ao próximo, a Deus ; de maneira ecumênica, respeitando a crença de cada um ; e à nossa pátria;, explica. Esse trinômio é simbolizado pela continência com três dedos, típica dos escoteiros.

Foi essa formação diferenciada que motivou a advogada Valéria Siqueira, 30 anos, a levar sua filha, Maria Vitória, 9, para o movimento. ;Ela tinha uma amiguinha que já era lobinha e quis participar. Ela melhorou muito sua capacidade de convivência, passou a ir melhor na escola, tornou-se mais responsável;, aponta a moradora da Candangolândia. Já para o lobinho Luiz Eduardo Araújo de Morais, 8 anos, as atividades físicas são o mais divertido. ;A gente corre, sobe em árvore, brinca. Isso é o que eu mais gosto. O dia do juramento também foi muito legal;, lembra o garoto, que ingressou no Villagran Cabrita em setembro, também por influência de amigos.

1 - São Jorge
O Dia Mundial do Escoteiro é comemorado em 23 de abril por se tratar do Dia de São Jorge, tido como padroeiro do escotismo. ;São Jorge é o padroeiro da Cavalaria e um santo de especial devoção na Inglaterra. É, também, o padroeiro dos escoteiros em toda a parte. Portanto, todos os escoteiros devem conhecer sua história e sua lenda;, escreveu o inglês Robert Stephenson Smyth Baden-Powel, criador do escotismo.

2 - Mogli
Akelá é a denominação dada para os chefes de escoteiros. O nome faz parte da estratégia para tornar o escotismo mais atraente para as crianças pequenas, utilizando nomes de personagens da clássica história Mogli ; O menino lobo, de Rudyard Kipling. Akelá é o nome da loba líder do grupo com o qual Mogli convive. Outras funções dentro do escotismo também recebem nomes de personagens da história infantil.

; Para saber mais
Sobrevivência na floresta


Os grupos de escoteiros surgiram na Inglaterra em 1907, por iniciativa do militar Robert Stephenson Smyth Baden-Powel. A origem do movimento se deu quase por acaso. Powel havia escrito um livro para orientar os jovens que desejavam seguir a carreira militar que passou a ser usado como um compêndio nas escolas masculinas birtânicas.

Diante do sucesso, ele resolveu escrever outra obra, intitulada Escotismo para garotos, voltada para o público em geral, na qual mostrava como as técnicas de sobrevivência na floresta poderiam ajudar na formação do caráter dos jovens.

A partir daí, surgiram os primeiros grupos de escoteiros, que rapidamente se espalharam pelo resto do mundo. Atualmente, estima-se que 28 milhões de jovens e crianças participem do movimento em todo o mundo. Por sua contribuição, o fundador Baden-Powel recebeu, do rei George V, o título de barão.


Todas as idades
Conheça as fases percorridas por um escoteiro dentro do movimento


Lobinhos
Denominação dada às crianças de 7 a 10 anos, que participam de brincadeiras, e recebem noções de educação no trânsito e educação ambiental, sempre acompanhadas de perto por adultos

Escoteiros
São as crianças e jovens de 11 a 14 anos. Desenvolvem atividades um pouco mais avançadas, como arvorismo e participação em acampamentos

Seniores e guias
Formado por jovens de 15 a 18 anos, este grupo já está apto para participar de ações mais independentes e também para ajudar os lobinhos e escoteiros nas suas atividades

Pioneiros
São pessoas de 19 a 22 anos que estão em uma espécie de estágio para a carreira adulta dentro do escotismo. Nesta fase, os pioneiros elegem áreas das quais gostariam de participar e aprofundam seus conhecimentos

Chefes
Depois dos 22 anos, o escoteiro pode se tornar chefe, organizando as atividades e trabalhando na parte administrativa dos grupos

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