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Para urbanista, Brasília foi "atropelada pelo futuro"

postado em 20/04/2010 18:47
A capital futurista que reuniu conceitos do bem viver modernistas completa 50 anos e, na opinião do urbanista Frederico Flósculo, professor da Universidade de Brasília (UnB), ;acabou atropelada pelo futuro;. O crescimento desordenado, a falta de consciência ambiental, os engarrafamentos, o transporte público insuficiente e precário, a ocupação desordenada do solo e os preços estratosféricos das moradias fizeram da cidade projetada pelo urbanista Lucio Costa uma capital com problemas semelhantes aos das demais áreas metropolitanas brasileiras.

;O futuro atropelou Brasília. O que aconteceu com Brasília ao logo dos 25 anos de autonomia política foi a mais absoluta perda de controle do território. São 25 anos de democracia e 25 anos de bagunça territorial;, avalia o urbanista que ressalta principalmente os problemas hídricos da cidade e a falta de capacidade ambiental de se construir um sistema de saneamento capaz de dar conta de uma população crescente que já supera dos 2,6 milhões de habitantes.

;Estamos em estresse hídrico e a maior parte da população está tirando água de onde não devia. Do lençol freático. Temos hoje mais de meio milhão de pessoas espalhadas em cerca de 550 loteamentos irregulares, ilegais;, exemplifica.

Flósculo cita um estudo realizado pela Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb), a pedido dos militares, em 1979, que apontou a capacidade sanitária da região. Nessa época, os militares já haviam construído as expansões de Ceilândia, do Guará, Gama e Planaltina.

;Ele perceberam que estavam com um jogo urbano em andamento que ficava cada vez mais pesado e fizeram a seguinte pergunta: Considerando os recursos hídricos existentes, quanto a cidade poderá crescer de forma equilibrada? A Caesb fez um estudo brilhante, levantando da capacidade de cada córrego, de cada nascente e de cada rio. O estudo demonstrou que, para Brasília crescer de forma sustentável e ter água na torneira de todo mundo, a população do Distrito Federal não poderia passar de 2,4 milhões de pessoas. Esse limite dado na época foi ultrapassado há cerca de quatro anos;, explica.

Projeção feita pela Companhia de Desenvolvimento do Distrito Federal (Codeplan), com dados do IBGE, aponta para uma população próxima de 3.270.564 habitantes no Distrito Federal em 2030.

Para os urbanistas, Brasília é uma cidade projetada, mas não planejada. Inaugurada em 21 de abril de 1970, a cidade só teve seu primeiro plano de ordenamento territorial 19 anos depois, quando a cidade já tinha cerca de 800 mil habitantes. De acordo com Flósculo, esse primeiro plano foi o único que considerou a natureza delicada do Planalto Central.

;Brasília é uma terra de nascentes. Ao olhar o mapa do Brasil a gente vê as nascentes da Bacia Amazônica, da Bacia do São Francisco, e as nascentes da Bacia do Prata, todas partindo de um mesmo lugar. Trata-se de um lugar especial, com águas prístinas. Um lugar de encontro das águas. Nós, brasilienses, estamos nele. Isso fica muito bonitinho para a quiromancia, mas para o urbanismo é uma desgraça;, destaca.

;O saneamento básico usa todo esse ciclo de depuração que depende da força das águas. Do caminho das águas para o mar. Nós, por termos poucas águas, temos uma capacidade de depuração muito limitada. Brasília não é São Paulo. Se a gente pensar que pode ocupar o Planalto Central do Brasil de uma maneira alastrada como aconteceu na capital paulista e até no Rio de Janeiro, Porto Alegre, Salvador, estamos redondamente enganados. Nós não temos capacidade ecológica para segurar o saneamento;, explica.

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