Cidades

Daqui a 50 anos o caos no trânsito será pior

Helena Mader
postado em 25/04/2010 08:42

Aos 50 anos, Brasília tem um trânsito tão caótico como o de outras grandes metrópoles brasileiras. Com 1,1 milhão de carros em circulação, os motoristas têm que enfrentar engarrafamentos cada vez maiores, mesmo fora dos horários de pico. Se o ritmo de crescimento anual da frota se mantivesse em torno de 7,5%, que foi a média da última década, a cidade teria 44,3 milhões de veículos em circulação daqui a 50 anos. Caso não haja mudanças eficientes para interromper esse ciclo, Brasília vai parar muito antes do seu centenário.

Para o especialista José Leles, mestre em engenharia de tráfego pela Universidade de Brasília (UnB), a projeção da frota para 2060 chama a atenção mas, se nada for feito, a tendência é mesmo de chegarmos ao caos no trânsito. "A tendência é a de o crescimento ser superior à própria progressão linear. Isso mostra a urgência de criação de políticas públicas, já que essa quantidade de veículos nem sequer caberia nas ruas. Nem mesmo se os carros andassem uns por cima dos outros seria possível termos uma frota desse tamanho", alerta o especialista.

A receita para impedir esse caos é mais do que conhecida: investir em transportes públicos para que as pessoas troquem os veículos pelos ônibus coletivos ou pelo metrô. O projeto Brasília Integrada, que já começou a ser implantado, é uma das soluções pensadas pelo GDF para desafogar o trânsito da capital federal e para melhorar os transportes públicos. Mas algumas das obras-chave para o programa, como a Linha Verde e o VLT (veículo leve sobre trilhos), estão sendo questionadas depois do início da Operação Caixa de Pandora.

Especialistas também sugerem investimentos em ciclofaixas ou ciclovias, o que seria um estímulo para o brasiliense se locomover sobre duas rodas. "Brasília tem geografia e infraestrutura favoráveis ao uso da bicicleta. A cidade é plana e esse seria um excelente meio de transporte alternativo. Infelizmente, o que vemos é que a maioria das ciclovias é usada exclusivamente para lazer e esporte, e não como forma de transporte", destaca José Leles. "Os espaços públicos não estão adaptados para as bicicletas. As pessoas não têm onde guardá-las e as empresas não costumam preparar espaço para seus funcionários tomarem um banho rápido depois da pedalada até o trabalho", acrescenta o especialista.

Descentralizar


Além de pensar em soluções para o trânsito, especialistas e representantes do governo terão que buscar um planejamento integrado com o Entorno do Distrito Federal. Os moradores das cidades goianas e mineiras limítrofes dependem de Brasília para trabalhar, cuidar da saúde e para se divertir. Se hoje já existe uma interdependência enorme entre o DF e as cidades vizinhas, a tendência é que a região metropolitana se unifique ainda mais nos próximos 50 anos.

Para o geógrafo e especialista em planejamento urbano Aldo Paviani, é impossível preparar Brasília para o centenário sem prever ações e investimentos para o Entorno. "O crescimento dessa área metropolitana da capital federal também deve ser planejado. Os hospitais da periferia, por exemplo, devem oferecer atendimento de qualidade para a população", explica o especialista.

Para Aldo Paviani, o ideal é que haja uma descentralização de empregos, para que os habitantes das cidades do Distrito Federal não dependam tanto do centro de Brasília. "É preciso descentralizar os empregos, mas mantendo a cidade polinucleada. Não é interessante emendar todos os núcleos urbanos, repetindo o que já acontece nas cidades tradicionais. Isso é ruim para o trânsito. O polinucleamento, com muito verde entre as diferentes cidades, reforçou a escala bucólica do Lucio Costa", finaliza.

Muitas das cidades nascidas nas últimas décadas ainda enfrentam problemas de falta de infraestrutura urbana. Na Estrutural, por exemplo, a urbanização só começou no ano passado, mas a população ainda reclama muito da falta de investimentos. Moradora da região, a dona de casa Maria Sônia Nascimento da Silva, 32 anos, acredita que, mesmo com todas as dificuldades financeiras, daqui a 50 anos os quatro filhos estarão numa posição melhor. "A gente tem que acreditar sempre que as coisas vão melhorar. Quero estar bem velhinha e ver meus filhos todos formados. Esse é meu sonho e tenho certeza que vou vê-lo realizado", vislumbra. Maria Sônia também torce para que o progresso chegue à rua onde mora, na Quadra 15 da cidade. "Vivo há 11 anos aqui e a rua ainda não tem pavimento. Quero imaginar essa rua daqui a 50 anos asfaltada, com várias casas bonitas e crianças brincando sem medo de violência", revela.

Assim como a Estrutural, outras cidades do Distrito Federal também surgiram a partir de invasões. Para que o planejamento urbano das próximas décadas seja efetivo, especialistas indicam para a necessidade de uma fiscalização mais rígida. "Somente com o controle da ocupação e do uso do solo vamos evitar novas invasões e grilagem de terra. A fiscalização é essencial para o planejamento urbano futuro", destaca a arquiteta e urbanista Tânia Batella, presidente da Comissão de Desenvolvimento Urbano do Instituto dos Arquitetos do Brasil.

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