Cidades

Estudo mostra que maioria dos conselhos tutelares está deteriorada

Juliana Boechat
postado em 02/05/2010 08:02
Os direitos das crianças e dos adolescentes do Distrito Federal estão ameaçados com a precariedade da infraestrutura dos conselhos tutelares. Apesar de o governo local ter triplicado a quantidade de conselhos nas cidades ; de 10 para 33 unidades, em 2009 ; na prática, ainda não houve medidas palpáveis para melhorar e garantir o funcionamento adequado da porta de entrada do sistema de proteção a milhares de meninos e meninas. Um diagnóstico dos conselhos, ao qual o Correio teve acesso, mostra que falta espaço físico, mobiliário, materiais básicos de trabalho ; desde uma linha telefônica a um carro para poder levar o menor a um abrigo ou tirá-lo de uma situação de risco ; na maioria das novas unidades.

O diagnóstico elaborado em fevereiro deste ano, numa parceria entre representantes do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), do GDF e dos conselhos tutelares, mapeou a situação dos 33 conselhos. Aspectos administrativos, como a quantidade de servidores, de móveis, de automóveis, de materiais de expediente, foram detalhadamente pontuados. ;O jeito que o Estado trata os conselhos mostra como ele quer tratar as crianças e os adolescentes;, analisou a promotora Fabiana de Assis Pinheiro, da 3 ; Promotoria de Defesa Cível da Infância e Juventude.

Linhas telefônicas e aparelho de fax são ;objetos de luxo; para os conselhos de Sobradinho II, Cruzeiro, Samambaia Norte, Estrutural e Vicente Pires. O conselho de Santa Maria Sul tem três aparelhos, mas segundo o diagnóstico, todos estão com defeito. Já no Lago Norte a solução encontrada foi pedir o telefone emprestado. A prática de ;pedir emprestado; se tornou comum desde que os 23 novos conselhos foram criados pelo governo, em dezembro do ano passado (leia Memória). Para garantir o funcionamento das outras unidades, os equipamentos das unidades mais antigos são repartidos ou emprestados com os vizinhos.

O secretário executivo da Associação dos Conselheiros Tutelares do DF, Rafael Madeira, contou que o empréstimo de carro entre conselhos ocorre com frequência. Ele trabalha no conselho de Brasília Norte e lá não há veículo próprio do órgão. Para atender casos que necessitam de saídas às ruas eles ;pedem emprestado; o carro do conselho de Brasília Sul. ;Está faltando o necessário para dinamizar o trabalho. O governo criou 23 conselhos mas manteve a estrutura dos 10 antigos. A gente trabalha na raça, na boa vontade;, afirmou. Madeira disse que até pequenos materiais de expediente, como caneta e pastas plásticas, são dadas com parcimônia pela Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania, órgão responsável pela manutenção dos conselhos.

Instabilidade política
A realidade dos conselhos fez com que o governo se comprometesse a providenciar soluções para os problemas identificados. À época, o secretário de Justiça, Flávio Lemos, assinou vários compromissos, inclusive com prazos de execução. Identificar terrenos para construção da sede das entidades, oferecer cursos de capacitação para os novos servidores nomeados e comprar mobiliários em falta foram alguns dos itens acertados. Mas, com a saída do secretário, que deixou o governo após ter sido denunciado por supostamente receber propina de uma empresa que prestava serviço para a pasta, não há certeza se o pacto está de pé.

Para a promotora Fabiana Pinheiro, o compromisso feito anteriormente deve ser mantido pelo atual secretário, o defensor público Geraldo Martins Ferreira. ;A instabilidade política do DF não pode afetar os compromissos acertados com representantes do governo. Só no último mês, a Secretaria de Justiça teve três chefes. Como implementar os conselhos se não tem continuidade administrativa?;, indagou a promotora, ressaltando que irá, o quanto antes, marcar um encontro com o novo secretário para discutir sobre a precariedade dos conselhos tutelares.

Vaivém judicial

O Governo do Distrito Federal (GDF) ampliou o número de conselhos tutelares no DF em cumprimento a uma decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT) que, até hoje, não conseguiu derrubar. Em novembro de 2008, o Ministério Público entrou com uma ação civil pública na 1; Vara da Infância e da Juventude pedindo a criação de 23 conselhos para atender todas as regiões administrativas do DF. Em abril do ano passado, o juiz Renato Rodovalho acatou o pedido do MP. O GDF entrou com um agravo de instrumento para suspender os efeitos da decisão judicial. Em novembro, o presidente do TJDFT, Nívio Gonçalves, confirmou a determinação da Vara da Infância. O Executivo local viu-se obrigado, então, a elaborar um projeto de lei criando os novos conselhos. A proposta foi aprovada na Câmara Legislativa e publicada no Diário Oficial do DF no dia 24 de dezembro. Quatro dias depois, o GDF recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo a suspensão da decisão. O processo está em tramitação.


Medidas a caminho
Ciente dos problemas enfrentados pelos conselheiros de todo o DF, o subsecretário de Justiça, Ricardo Batista Sousa, garantiu que o processo licitatório dos veículos e dos materiais necessários está em fase final. Os novos conselhos tutelares funcionam há quatro meses. Mas, segundo Ricardo, os contratos foram congelados durante a crise política do GDF e, por isso, ocorreu o atraso. ;A coordenação responsável por esse assunto vinha trabalhando desde o início. As mudanças recentes não vão interferir nesse processo. A criança e o adolescente são prioridades para a Secretaria de Justiça;, disse ele. A previsão orçamentária para 2010 era de R$ 1, 5 milhão para a instalação e manutenção dos conselhos, mas só R$ 500 mil foram liberados pelo governo.

Ricardo Sousa explicou que as etapas serão vencidas com o tempo. ;Com o projeto de lei, imediatamente criamos os conselhos. Agora, temos que garantir a eficácia do serviço. Não é só o local de funcionamento, mas todo o aparato;, defendeu. A ideia da secretaria é criar Casas de Justiça em todas as cidades do DF, que abrigariam serviços à sociedade como o Conselho Tutelar. Dessa forma, os conselheiros deixarão de trabalhar em salas cedidas, muitas vezes, pelas administrações regionais. ;A Sejus vai abrir as portas. Não temos imóveis. Mas estamos fazendo um levantamento minucioso dos lugares que poderemos ocupar nas administrações;. O subsecretário acredita que até o fim deste ano a situação dos conselhos tutelares estará melhor em relação à realidade atual.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação