Luiz Calcagno
postado em 07/05/2010 07:55
Em meio à crise que derrubou uma geração de políticos no Distrito Federal, o ex-governador José Roberto Arruda (sem partido), em silêncio desde quando foi preso em 11 de fevereiro, falou diante da Justiça. Mas o depoimento de Arruda, solto desde 12 de abril, em nada tem a ver com o escândalo que o tirou do comando do GDF. O teor do testemunho do político colhido na tarde de ontem foi sobre a violação do painel do Senado em 2001, durante a cassação do então senador Luís Estevão. Arruda enfrenta um processo por improbidade administrativa, e pode perder os direitos políticos por até oitos anos, além de ser obrigado a ressarcir à União a verba gasta pelo governo federal para que a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) realizasse a perícia que confirmou a violação.O ex-governador depôs por cerca de três horas e meia, 20; Vara da Sessão Judiciária do DF, no Edifício Sede II da Justiça Federal. Quase uma década após o episódio que resultou na renúncia ao mandato de senador, Arruda voltou a negar que tivesse violado o painel, e disse que, quando teve acesso à lista com o nome dos senadores e os votos, acreditava se tratar de um atestado da segurança do sigilo da votação, já que o número de votos era idêntico ao exibido no plenário da Casa. O ex-governador, na época líder do governo, lembrou que o envelope chegou ao poder dele pelo seu ex-chefe de gabinete, Domingos Lamoglia, e deveria ser entregue ao senador, já falecido, Antônio Carlos Magalhães. Lamoglia é o conselheiro do Tribunal de Contas do DF afastado por suspeita de operar em favor do esquema de corrupção revelado recentemente na Operação Caixa de Pandora.
Confronto
A declaração de Arruda foi confrontada com o depoimento da ex-diretora de Informática do Senado Regina Célia Peres. Ela afirma que entregou o material a pedido de Arruda e em nome de Antônio Carlos Magalhães. Mas o ex-governador negou a versão. De acordo com Arruda, ele teria visto a lista e repassado para ACM, no gabinete da presidência, diante de outros senadores. Depois disso, teria esquecido o fato, convencido de que se tratava de ;medidas tomadas na intenção da segurança do sistema;. Questionado pela procuradora da República Eliane Pires Rocha sobre qual era a preocupação do senador Antônio Carlos Magalhães quanto à segurança do sistema do painel, Arruda disse que estava relacionada a uma ;eventual manipulação do resultado;.
Essa foi a terceira versão que Arruda apresentou sobre a história. Na primeira, apresentada em 2001, negou a violação. Dias depois, admitiu. Ele argumentou que teria evitado o acesso ao documento, segundo consta na ata de audiência, ;para ser solidário às declarações do Senador Antônio Carlos Magalhães de que não havia ocorrido qualquer ato ilícito;. A Justiça prevê finalizar o processo da violação em agosto. E até o fim do ano deve sair um veredito, mas ainda caberá recurso no Tribunal Regional Federal (TRF).
Os últimos dias, Arruda passou em Itajubá, em Minas Gerais, onde visitava a mãe. Ele retornou para o DF com o objetivo de depor. Segundo o juiz federal Alexandre Vidigal de Oliveira, que julga o caso, a Justiça tenta ouvir Arruda desde 2006. Ele já foi chamado para depor oito vezes, seis delas somente em 2009. ;Nós chegamos a intimar o advogado de Arruda, mas não ele. ;Antônio Carlos Magalhães não chegou a ser ouvido. Também ouvimos funcionários do Senado e terceirizados. Do ponto de vista processual, avançamos. Só falta mais uma testemunha, que foi arrolada ao caso pela ex-diretora da Prodasen, que enviou a lista para Arruda, Regina Célia Peres;, disse Oliveira.
Do ponto de vista processual, avançamos. Só falta mais uma testemunha;
Alexandre Vidigal, juiz federal
Memória
Contradição e lágrimas
Em fevereiro de 2001, José Roberto Arruda ocupava a liderança do governo no Senado Federal, um dos cargos de maior destaque da rotina política. Na época, Luís Estevão era acusado de envolvimento no desvio de R$ 169 milhões da construção do TRT de São Paulo. A denúncia motivou a abertura de processo de cassação contra Estevão. E a votação no plenário tornou-se o ápice do julgamento político do senador. Nessa fase, surge um novo escândalo, desta vez protagonizado por Arruda. A votação que definiria o futuro de Luís Estevão era fechada. Mas o então líder do governo teve acesso à lista secreta. Um dia depois da sessão em plenário, foi entregue a Arruda por meio da então diretora do Serviço de Informática do Senado, Regina Célia. Ela afirma que violou o painel a pedido de Arruda, que usou o nome do presidente do Senado, o então senador Antônio Carlos Magalhães, para conseguir o favor. Diante da revelação da fraude, Arruda negou da tribuna com veemência que tivesse tido acesso à lista. Voltou dias depois para se desmentir, momento em que até chorou. Em 27 de maio de 2001, Arruda renunciou para evitar uma provável cassação de seu mandato.