Juliana Boechat
postado em 07/05/2010 08:47
Bem diferente de outras metrópoles, a capital do país ainda pode se gabar do ar puro. Mas essa característica não está completamente garantida. O Instituto Brasília Ambiental (Ibram) divulgou ontem um estudo sobre a qualidade do ar do Distrito Federal. Dos sete pontos analisados em cinco localidades, apenas dois apresentam índices de poluição considerados bons pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Em 1990, o órgão estabeleceu a concentração de 80 microgramas de partículas poluentes por metro cúbico de ar como o limite aceitável. Segundo o levantamento do Ibram, os níveis da Fercal, da Rodoviária do Plano Piloto e do centro de Taguatinga ultrapassam a marca e podem oferecer risco à saúde da população.Os moradores da Comunidade Queima Lençol, na Fercal, são os que mais sofrem com a má qualidade do ar. A concentração de poluentes na atmosfera está mais de cinco vezes acima do limite estabelecido pelo Conama ; 438,321 microgramas por metro cúbico. A estação Fercal 2, localizada entre duas fábricas de cimento e próxima à DF-150, registrou 335,385 microgramas por metro cúbico, aproximadamente quatro vezes além do ideal. A atmosfera mais limpa da região ; ainda assim tachada de regular ; foi registrada na estação isolada Fercal 1, com 176,96 microgramas por metro cúbico. Na Rodoviária do Plano Piloto, o Ibram detectou 103,757 microgramas de partículas poluidoras. Em Taguatinga, 160 microgramas por metro cúbico. Os dois locais receberam o selo de regular pelo Ibram.
Os pontos que estão abaixo do limite estabelecido pelo Conama estão no Plano Piloto, na L2 Norte e na W3 Sul. ;A principal fonte de emissão de poluentes está nos carros. De um mês para o outro, 10 mil veículos a mais circulam no DF. Com tecnologia e renovação da frota, é possível melhorar os índices;, explicou a técnica da gerência de monitoramento da qualidade ambiental do Ibram, Leilane Lara Moreira Cezar. ;Esse estudo mostra um panorama para que as pessoas e o governo tomem decisões para o futuro;, disse. Apesar do alerta, ela pondera, afirmando que a qualidade do ar no DF, de forma geral, é boa.
Fumaça
De casa, Maria José Souza Silva, 41 anos, avista as fábricas que cercam a Comunidade Queima Lençol. Além da fumaça das cimenteiras, ela sofre com a falta de asfalto. ;É poeira e fumaça de todas as cores por todos os lados. De manhã cedo, não enxergamos nada aqui;, contou. Ela tem problemas cardíacos há dois anos, diagnosticados pelo médico como sintomas dos poluentes inalados diariamente. ;Tenho dificuldade de respirar. Sinto o pó e a fuligem na garganta toda hora;, reclamou. Maria José tem vontade de sair dali. Mas, até conseguir, precisa conviver com o ambiente insalubre.
O cobrador de ônibus Antônio Carlos Pinheiro da Silva, 29 anos, trabalha com os olhos irritados todos os dias. Na Rodoviária do Plano Piloto, lida com a fumaça expelida do cano de descarga das dezenas de coletivos. ;Chego em casa cheirando a fumaça, com os olhos coçando e com muita tosse. O nariz sempre está escorrendo. Quando o clima está seco, sinto ainda mais;, disse. O pneumologista Ricardo Martins destaca os riscos da poluição para o corpo humano: ;A poluição afeta a pele, os olhos e todo o sistema respiratório. Em estados avançados, as doenças podem chegar a edema pulmonar, que é a paralisação do órgão;.
Palavra de especialista
Prevenção necessária
;O DF tem áreas urbanas concentradas e, dentro dessas áreas, o grande fator poluente é o transporte. A área industrial não está tão próxima da cidade. As queimadas, por exemplo, podem ser fáceis de controlar, mas o crescimento do transporte individual é muito mais difícil. Apesar disso, a qualidade do ar no DF ainda é considerada boa. Os poluentes têm certa facilidade de dispersão em virtude da forma como a área urbana de Brasília foi idealizada. Com o aumento do número de veículos, porém, essa vantagem será suprimida com o passar do tempo. Nos fortes períodos de seca, o problema ainda se agrava. Como não existe a umidade para assentar as partículas poluidoras, forma-se uma camada de poluição sobre as cidades. A qualidade do ar cai bastante nesses meses. Uma forma de melhorar ainda mais a qualidade do ar é estancar o crescimento da frota de veículos no DF. Temos de pensar que, hoje, os problemas não são tão grandes. Mas, no futuro, serão.;
Felipe Azevedo, químico com mestrado em engenharia. Trabalha no laboratório de qualidade do ar da Universidade de Brasília (UnB)
E eu com isso
A qualidade do ar interfere diretamente na vida da população. Com menos oxigênio disponível na atmosfera, as pessoas inalam partículas poluentes em suspensão. Daí, surgem as doenças mais simples, como alergia e irritação nos olhos. Em casos mais graves, aparecem bronquites, rinites e até pneumonias. Se não houver cuidado, essas enfermidades podem evoluir para um enfizema pulmonar, quando o órgão deixa de trabalhar. Uma forma de amenizar os problemas decorrentes da constante poluição do ar é beber muita água, praticar exercícios físicos e evitar ficar em locais com muita fumaça ; seja de veículos, fábricas ou produtos feitos de tabaco. Especialistas sugerem que as pessoas deixem mais o carro em casa e andem a pé ou de carona. Ao mesmo tempo, os governos locais devem investir em transporte público com frota renovada.