postado em 09/05/2010 08:39
Profissionais da saúde em postos de comando nos hospitais públicos do Distrito Federal são unânimes em apontar que a solução para coibir desvios e desperdício de remédios e insumos será atingida a partir de três providências combinadas: a informatização do controle de estoques e de gestão nos hospitais, a implantação da dose individualizada e a descentralização de recursos. As unidades de saúde que passaram pela experiência notaram melhoria no atendimento ao público e economia de materiais e medicamentos.A dose individualizada é considerada uma revolução na rotina dos hospitais. Nesses casos, há um setor específico para calcular a necessidade de cada paciente internado nas dependências da unidade de saúde pelas 24 horas seguintes. Quando esse sistema é utilizado, não há sobras. Consome-se o que é prescrito pelo médico. Mas o funcionamento desse método depende da existência de uma equipe de farmacêuticos ou mesmo enfermeiros treinada para lidar com essa técnica. Além disso, o processo deve ser todo organizado por meio de um programa de computador. O Hospital Regional do Gama (HRG), por exemplo, utilizou durante dois anos e seis meses uma tecnologia australiana com adaptações para a necessidade local. Mas o contrato emergencial foi suspenso e a unidade aguarda novo processo de seleção.
O Hospital Regional de Samambaia é o único totalmente informatizado na rede pública. A iniciativa aumentou a segurança e também melhorou o atendimento prestado aos pacientes. Com o sistema, médicos e seguranças podem acompanhar tudo o que se passa no local, quem entrou e saiu, quais pacientes receberam visita e em que horário. O mais importante na informatização é o controle do tratamento de cada pessoa internada ou que passa pelos consultórios.
Com o sistema eletrônico em Samambaia, os prontuários dos pacientes ficam disponíveis na rede de computadores. Ali estão armazenados dados como a medicação que cada um tomou, os exames realizados e antigas internações. Além de economizar espaço físico, já que os prontuários de papel normalmente ocupam grandes salas, a informatização do prontuário garante um atendimento mais rápido e evita casos de desvios de medicamentos e produtos.
O diretor da unidade, David Maia, conta que a instalação do novo sistema permitiu uma economia grande em quase todos os setores. ;O paciente chega com o cartão do SUS, que é inserido em uma leitora. Automaticamente, todos os dados da pessoa são acessados pelo computador. No caso do uso de medicamentos, o remédio só vai sair da farmácia quando o médico inserir o pedido no receituário eletrônico;, explica David. ;Tudo fica registrado e o controle é bem rígido. A informatização é a melhor forma de garantir a segurança dos hospitais;, acrescenta.
Monitoramento
No Hospital Regional da Asa Norte (Hran), as unidades começaram a substituir montanhas de prontuários em papel por um sistema informatizado. Quando o mecanismo estiver funcionamento em sua capacidade total, será possível, por exemplo, monitorar o histórico recente e passado de todos os pacientes que dão entrada no Hospital. ;Eu conseguirei observar quem está sendo atendido em qual consultório, o que foi prescrito, se o paciente realizou exames, se foi encaminhado para o retorno, a que horas deixou o hospital;, conta o diretor do Hran, Renato Lima.
Para efeito de demonstração, o médico mostrou à reportagem que o sistema é interligado à Secretaria de Saúde e pode ser útil na consulta de insumos e medicamentos disponíveis na rede. Na última terça-feira, quando o diretor checou a quantidade de rolos de esparadrapos, descobriu que o estoque no Hran havia terminado e que restavam em toda a rede apenas 153 rolos. Dois dias depois, o mesmo problema, desta vez no Hospital de Base, foi relatado pelo Correio. ;É sensacional o efeito que a informatização terá sobre a qualidade do serviço oferecido nos hospitais. A economia sensível e a agilidade nos atendimentos serão apenas dois dos benefícios notados;, acredita o diretor do Hran.
A informatização é a melhor forma de garantir a segurança dos hospitais;
David Maia, diretor do Hospital Regional de Samambaia
Autonomia a caminho
Uma das primeiras decisões do novo governo do Distrito Federal foi pulverizar o orçamento da saúde, antes concentrado na Secretaria de Saúde, para os hospitais. Com isso, as unidades regionais vão ter autonomia para repor estoques de medicamentos e insumos. A medida era reivindicada por médicos há anos. Mas encontrava resistência política, porque esvazia de certa forma o poder da secretaria, que lidava sozinha com o orçamento bilionário. ;Desde a pequena contratação até os casos de compras mais complexas, o hospital precisava submeter as necessidades à secretaria. É uma burocracia injustificável diante da urgência de situações que não podem esperar;, diz o governador Rogério Rosso (PMDB).
Ele afirma que, a partir da semana que vem, os hospitais terão acesso às contas pelas quais vão poder movimentar os recursos da saúde. ;Cada hospital receberá uma quantia de acordo com critérios como o volume de atendimentos;, afirma Rosso. A descentralização é a principal aposta do governo para resolver parte do desabastecimento que castiga a rede pública de saúde. O governador disse que pretende atacar a falta de controle que causa prejuízos milionários ao sistema como relatado na reportagem implementando a informatização em 100% dos hospitais. Hoje, apenas um terço das unidades trabalha com o auxílio de programas de computadores. ;A meta é chegar até dezembro com controle de estoque totalmente digitalizado, além da aplicação do prontuário online;, informa.
O governo ainda promete diminuir a carência de recursos humanos nos hospitais e nos postos de saúde adiantando a contratação de profissionais aprovados em concursos. Hoje, há um deficit de todo tipo de especialidades na rede. Desde vigilantes a enfermeiros, médicos, psicólogos, técnicos.
Análise da notícia
Pouco tempo para tanto
Não é à toa que o novo governo, eleito para um mandato-tampão de oito meses, mirou na saúde. É preciso menos que genialidade para saber que a sobrevivência política em meio a uma crise de descrédito com a classe de representantes passa por uma prova real de capacidade de gestão. Os eleitores se indignam com a corrupção. Mas o que não toleram é quando sentem que a ganância de políticos tem influência no tamanho da fila que vão enfrentar para conseguir atendimento nos hospitais públicos. É plantado nas emergências lotadas, sem acesso aos medicamentos de alta complexidade ou mesmo ao básico esparadrapo, que o cidadão faz juízo de valor de seus governantes.
O novo governo tem pouco tempo para mostrar serviço, o que lhe curvou à escolha de uma prioridade. Poderia ter sido o sistema de transportes, as obras, os programas sociais. Há uma lista de carências administrativas. No entanto, Rogério Rosso resolveu apostar em uma injeção de ânimo na rede pública de saúde. Foi aplaudido de pé por um grupo de médicos quando anunciou que faria a descentralização de recursos para os hospitais, medida que promete resolver em parte a falta de abastecimento na rede, mas que, por enquanto, está em fase de transição do discurso para a prática. Os pacientes aguardam os resultados das promessas para a Saúde. (LT)