Cidades

Plano contra agressões a crianças

Adriana Bernardes
postado em 18/05/2010 07:35
Uma data para romper o silêncio e a inércia diante da violência sexual contra crianças e adolescentes. Entidades governamentais e representantes da sociedade civil se unem hoje ; 18 de maio ; para discutir e alertar sobre esse crime hediondo que só em 2009 resultou em 425 denúncias na Polícia Civil do Distrito Federal. A Secretaria de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda (Sedest) faz hoje o relançamento do Plano Distrital de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, elaborado em 2005, mas que, até então, só existiu no papel.

A proposta não contempla orçamento, fundamental para o desenvolvimento dos projetos existentes. O plano será um instrumento de mobilização da sociedade civil, Justiça, Ministério Público e outros órgãos governamentais. ;O grande avanço está na criação de um fluxo de atendimento que começa com a denúncia feita por qualquer pessoa da comunidade em que a vítima mora até a responsabilização do agressor;, resume Valéria de Sousa Lima, gerente de Proteção Especial de Média Complexidade da Sedest.

Prêmio
Para premiar iniciativas de sucesso no enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República lança hoje, no Salão Negro do Ministério da Justiça, o Prêmio Neide Castanha, considerada um dos ícones da luta nesta área. Alunos da Universidade Católica de Taguatinga e o Sindicato do Comércio Atacadista do Distrito Federal (Sindiatacadista) também se mobilizaram.

Na Universidade Católica haverá apresentação do grupo de percussão do Projeto Giração ; composto por meninos e meninas de rua do DF ; e distribuição de panfletos. A intenção é alertar os estudantes sobre o problema e incentivar as denúncias. Os funcionários da Comercial Alvorada, um dos maiores atacadistas do DF, vão entregar panfletos informativos para os clientes. O Sindiatacadista faz parte do projeto Na Mão Certa, da Childhood Brasil (Instituto WCF) e incentiva ações de conscientização e combate ao abuso e à exploração sexual de meninos e meninas.

Reportagem publicada pelo Correio no último domingo revela que 60% das denúncias de exploração nem sequer viram processos criminais. O Estado também falha porque não investe nas estruturas de prevenção e apoio às famílias. Um dos exemplos do descaso está nos conselhos tutelares. A criação do protocolo de atendimento da Sedest deverá unificar as ações dos poucos projetos existentes na capital. ;Se tivemos todos os atores públicos e a sociedade civil envolvidos evitaremos a revitimização;. Quantos aos recursos para ampliar e melhorar o atendimento às vítimas, caberá a cada secretaria se programar para ter o orçamento disponível para garantir os direitos constitucionais das crianças e dos adolescentes.

DIA DE COMBATE
; O Dia Nacional de Luta Contra o Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes ; 18 de maio, foi criado pela Lei Federal n; 9.970/00. A escolha da data se deu devido à morte da menina Araceli Sanches, 8 anos, raptada, drogada, estuprada, morta e carbonizada por jovens de classe média alta de Vitória, no Espírito Santo, nesse dia em 1973. O crime, apesar de sua natureza hedionda prescreveu impune.

Artigo
Desafio civilizatório
A violência sexual contra crianças e adolescentes é uma violação de direitos, uma transgressão, uma relação de poder perversa e desestruturante da vida da vítima e que acontece numa relação de poder do mais forte, com o objetivo de satisfazer o desejo sexual deste último. A criança é (ab)usada para satisfação de alguém que a domine, envolvendo ameaças e sedução para que seja mantido o segredo da violação.

O abuso acontece nas situações de maior proximidade, pois o agressor se utiliza de uma relação de confiança e proteção que mantém com uma enteada, uma filha, um filho, uma irmã, um irmão, onde criança lhe é mais acessível. A criança vitimizada manifesta comportamentos sexuais inadequados à sua idade, ou mesmo expressa verbalmente esse fato, mas o medo da revelação da presença de um abusador próximo ou da perda de um provedor pela possível prisão, paralisa a denúncia e ainda torna a criança mentirosa.

O abusador, muitas vezes foi vítima de violência física, autoritarismo, humilhação e teve seu narcisismo ferido ou não teve apoio e proteção de parte da família ou das políticas públicas, como a escolarização adequada. O abuso provoca sofrimento, traumas, perturbações na sexualidade das vítimas e em sua saúde mental ou lesões de gravidade variada.

O enfrentamento da questão passa pela denúncia e pela revelação do abuso, seja para colegas, familiares, professores, devendo-se acionar os órgãos de atendimento à vítima e responsabilização do agressor, como os serviços de saúde, o Ligue 100 (que recebe denúncias nacionalmente), o Conselho Tutelar, o Ministério Público ou a Delegacia de Polícia, pois trata-se de um crime. A prevenção desse tipo de violência implica o diálogo aberto com criança, incentivando-a a falar sobre qualquer molestamento que venha a sofrer, estabelecendo-se regras de respeito e dignidade em todas as relações familiares e sociais como um processo civilizatório de aderência e respeito aos direitos humanos e às leis de defesa desses direitos.

; Vicente de Paula Faleiros, coordenador do Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes e professor

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