Cidades

Trabalhadores do DF ganham mais, mas salário cresce menos

A falta de qualificação pesa nesse resultado, segundo pesquisa do Dieese

postado em 18/05/2010 07:57
Como muitos outros trabalhadores, Francisco Josivam não fez curso e ainda é aspirante à função de pedreiro. Ele diz que a atividade é bastante cansativaA remuneração média dos trabalhadores formais da construção civil no Distrito Federal ; R$ 1.473,20 ; fica acima da nacional (R$ 1.189), mas cresce em um ritmo menos acelerado. Enquanto o rendimento do DF subiu 4,3% entre 2007 e 2008, no país os salários aumentaram 7,8% no mesmo período. Além disso, o piso salarial médio do DF para a construção civil tem um patamar baixo. Aqui, ele estava em R$ 489 em 2009, não alcançando o valor de um salário mínimo. No Brasil, era de R$ 580,33 na mesma época. Os dados estão na pesquisa Estudo Setorial da Construção Civil , divulgada pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). O levantamento revela que, além de discrepante da média nacional, o comportamento da renda do trabalhador da construção civil de Brasília difere daquele verificado em unidades da Federação em que a atividade vive momento semelhante de aquecimento.

Em São Paulo e no Rio de Janeiro, por exemplo, estados que igualmente têm mercados dinâmicos e concentram muitas obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), a renda média do trabalhador da construção civil era, respectivamente, de R$ 1.504,50 e R$ 1.679,30 no fim de 2008, ano da última medição da Relação Anual de Informações (Rais) do Ministério do Trabalho. Em São Paulo, ela havia crescido 6% com relação a 2007, e no Rio de Janeiro, 13,1%. Em Goiás, Minas Gerais e Bahia, estados em que os ganhos revelaram-se menores do que no DF, o ritmo de crescimento da renda se repetiu. Os salários médios dos trabalhadores estavam em R$ 1.178, R$ 1.247 e R$ 1.138 no fim de 2008, tendo crescido 10,1%, 6,4% e 10,2% comparados ao ano anterior.

Quanto ao piso salarial, o Distrito Federal oferecia, em 2009, valor mais alto do que apenas cinco unidades da Federação: Roraima (R$ 430), Rio Grande do Norte e Sergipe (R$ 465), Goiás (R$ 470) e Ceará (R$ 475).

Para Tiago Oliveira, economista do Dieese, a diferença na dinâmica da renda do trabalhador da construção no DF com relação a outros grandes centros pode ser interpretada segundo um conjunto de fatores. Os rendimentos médios inferiores ao do Rio de Janeiro e de São Paulo, por exemplo, podem estar relacionados ao fato de esses estados, ricos como o DF, terem uma iniciativa privada mais fortalecida. ;A renda média de R$ 1.473,20 no DF inclui salários do trabalhador sem qualificação e daqueles mais qualificados, como o engenheiro. Em estados como São Paulo e Rio, esse último é mais valorizado. Aqui, os grandes salários estão no setor público;, afirma Oliveira. O crescimento menos acelerado da renda pode estar vinculado à mesma questão.

Qualificação
Já o piso salarial menor verificado no Distrito Federal teria como fator determinante a existência de uma oferta bastante expressiva de mão de obra pouco qualificada. ;O que ocorre é que existem trabalhadores dispostos ou aptos a trabalhar pelo piso salarial da construção civil. E o piso está relacionado a funções menos qualificadas;, afirma o economista.

Funcionários da mesma empresa, Francisco Josivan da Silva, 31 anos, e Francisco Zacarias da Silva Filho, 45, trabalham no setor da construção civil em funções diferentes. O primeiro é meio-oficial, cargo exercido por quem aspira à função de pedreiro mas ainda não acumulou habilidades o bastante. Zacarias é oficial, ou seja pedreiro. É mais qualificado do que o colega, embora se trate de um preparo dos mais básicos no ramo, e por isso ganha um salário maior.

Nenhum dos dois fez cursos para ingressar no ramo da construção civil, e ambos aprenderam na prática. Os dois Franciscos, que preferem não revelar quanto ganham, dizem que conseguem pagar as despesas do lar com o salário, mas ressaltam que o trabalho é pesado. ;É sacrificante, tem dias em que cansa demais;, afirma Francisco Josivan da Silva. ;Eu estou satisfeito, mas de vez em quando você pensa que o dinheiro poderia ser um pouquinho melhor;, diz Francisco Zacarias.

De acordo com Júlio César Peres, primeiro vice-presidente do Sindicato da Construção Civil do DF (Sinduscon-DF), trabalhadores com o perfil de Francisco Silva e Francisco Zacarias, que aprenderam o trabalho na prática após serem contratados, são comuns no mercado brasiliense. ;Tem oferta de mão de obra, mas não com especialidade. A própria empresa tem que pegar seu profissional servente, transformá-lo em meio-oficial e depois em oficial;, declara. Segundo Peres, esse é um dos fatores responsáveis pelo crescimento tímido dos rendimentos e piso salarial baixo da construção civil local.

Outra explicação possível, também ligada à qualificação baixa, é a forma de remuneração que muitas empresas do setor adotam. ;Uma coisa é o salário, outra são as chamadas tarefas, em que a empresa, devidamente autorizada pelo sindicato, paga um extra que é maior de acordo com a produtividade;, afirma Júlio César Peres. De acordo com ele, como no DF há carência de profissionais qualificados, a produtividade é baixa.

Copa de 2014 aquecerá o setorFrancisco Zacarias é pedreiro e se diz satisfeito com o salário. Mas poderia
Além de ter registrado aquecimento e alta no número de empregos em razão do lançamento de programas do governo federal como o Minha Casa, Minha Vida e o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o setor da construção civil também deve ser o segmento da economia mais beneficiado pela Copa de 2014. A Associação Brasileira de Engenharia Industrial (Abemi) estima que serão criados 3,5 milhões de empregos no ramo em função do Mundial em todo o país.

O Estudo Setorial da Construção Civil do Dieese levantou, junto aos governos federal, estaduais e municipais do Brasil quanto cada capital onde estão previstos jogos estava planejando investir a título de preparação para receber o campeonato. As respostas, enviadas à entidade em setembro de 2009, apontavam Brasília como a sexta cidade que mais destinaria recursos com R$ 3,5 bilhões para infra-estrutura. A capital federal vinha atrás de São Paulo (R$ 33,4 bilhões), Rio de Janeiro (R$ 11 bilhões), Fortaleza (R$ 9,4 bilhões) e Porto Alegre e Recife (R$ 5 bilhões cada).

Na última semana, durante anúncio de um pacote de medidas fiscais a empresários, o governador do DF, Rogério Rosso, falou sobre a possibilidade de Brasília abrir mão de ser uma das cidades-sede e batalhar para ser anfitriã da abertura do Mundial e centro de mídia durante o evento esportivo. Não foi divulgado se os gastos com a preparação cairiam com a mudança.

Na opinião do presidente da Federação das Indústrias do Distrito Federal (Fibra), Antônio Rocha, o investimento é razoável para contemplar os ajustes que será necessário fazer na cidade até a data da Copa. Rocha concorda que a construção civil será o segmento econômico mais beneficiado diretamente, mas diz que a realização dos jogos no Brasil deve encarada como fato positivo porque beneficiará ;toda a cadeia produtiva;. (MB)


Memória
Desemprego em queda

Em 27 de abril foi divulgada a Pesquisa do Emprego e Desemprego no DF (PED-DF) relativa a março de 2010. O levantamento, realizado pelo Dieese, mostrou que, entre março de 2009 e o mesmo mês de 2010, o desemprego local recuou de 17,2% para 14,1%. Entretanto, a renda média dos moradores do DF caiu 6,5% no período, de R$ 1.936 para R$ 1.841. Os pesquisadores atribuíram o recuo nos ganhos ao crescimento expressivo do emprego na construção civil, que cresceu 23,6% em 12 meses. Na ocasião, a reportagem também ouviu o Sinduscon-DF, que se queixou da falta de qualificação da mão de obra. (MB)

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